Capítulo X

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  Chegamos no quintal e vi um monte de instrumentos e ferramentas para cortar, enfim, fazer várias coisas com madeira.
  Ele me mostrou uma de suas prateleiras com várias pecinhas do mesmo material, todas muito detalhadas.
 
  - É incrível, tão bem feito... o senhor trabalha muito bem.

  Eram várias coisinhas em madeira. Animaizinhos, árvores, flores...

  - Muito obrigado, é muito bom ouvir isso. - Respondeu.

  - Gostei de todas, mas esse cavalinho em especial me encantou.

  - Obrigado, se uma criança quase adolescente diz isso, é porquê não mente.

  - Fica tranquilo, eu não minto.

  Ele me mostrou mais algumas coisas que ele faz de madeira como bancos, cadeiras de balanços, mesas, camas e até vasos.

  - Venha comigo, Mary. Ainda tem o andar de cima lá dentro de casa para te mostrar.

  Peguei em sua mão e ele me levou então até seu quarto no andar de cima. O quarto que era seu e de sua esposa.
  Na cômoda logo ao lado da cama, havia uma gargantilha com pequenas pedrinhas de ouro, ainda de sua esposa.

  - Até hoje guardo absolutamente todas as jóias de minha esposa aqui, não tive coragem de doar. Mas doei suas roupas, com muito custo. - Disse ele abrindo as gavetas da pequena cômoda ao lado da cama, com várias jóias dentro. Em seguida, caminhou com seus passos curtos e lentos até o guarda roupas, da onde tirou uma pequena caixinha toda empoeirada.
  Ao assoprar, ergueu uma das tábuas de madeira do chão e tirou de lá uma chave. A chave da caixa. Ao destrancar, disse:

  - Isto é sem dúvidas a coisa mais valiosa que tenho de minha esposa. - Falou, tirando um lindo colar com a Estrela de Davi da caixa, me mostrando.

  - É muito bonito... muito bonito mesmo, John... mas o que significa?

  - É o colar de casamento meu com minha esposa. Ela usou isso durante nossa vida inteira juntos. Tirou-o de seu pescoço vagarosamente e o deixou em minhas mãos, em seguida fechou meus dedos. Tudo isso em seus últimos momentos de vida.

  - Meu Deus... que bela história. É tão lindo saber que você o guarda tão bem depois de quase vinte anos...

  - Sim, e para sempre o guardarei.

  Ele então guardou a caixinha e descemos as escadas.

  - Ah, ia quase me esquecendo... - Disse ele, tirando da gaveta de uma penteadeira na sala, uma gaita.

  - Que incrível, você toca!!!

  - Essa camarada aqui esteve comigo nos momentos mais tristes e felizes de minha vida. Sempre quando a começo tocar, ela me traz boas lembranças. Dependendo da música que toco, lembro de momentos tristes. Mas na maioria das vezes eu adoro tocar para me manter feliz e animado. Quer que eu toque?

  - John, eu juro que ia adorar te ouvir tocando, mas eu preciso mesmo ir... o sol já está quase se pondo. Minha tia deve ter chegado em casa faz tempo...

  - Tudo bem, Mary. Eu entendo. Você tem suas obrigações. Estará de volta amanhã?

  - Mas é claro! Ainda quero te ouvir tocando.

  John sorriu e disse:

  - Espere! Só mais um minuto... - Falou guardando a gaita e indo em direção ao quintal. - Toma, pegue. É seu. - Disse ele, estendendo-me a mão me entregando seu cavalinho de madeira.

  - É muita gentileza sua, John... mas... mas não posso aceitar. É o seu ganha pão... você precisa de dinheiro e é isso que te fornece.

  - É sim, mas eu lhe imploro... por favor, Mary, pegue! Estou te dando de coração. Nesse pouco tempo que nos conhecemos eu sei que você é minha fiel amiga. Você merece muito mais, mas isso é praticamente tudo que lhe tenho a oferecer.

  Peguei o cavalinho e o abracei. Despedi dele e fui direto pra casa.
  Ao abrir a porta, tia Constance fala sentada no sofá:

  - Aonde pensa que vai?

  - Que susto! Juro que não te vi aí...

  - Que coisa, não? Por que será? Você está muito sonsa ultimamente, Mary...

  - Do que você está falando agora?

  - Do que estou falando? Eu vou te dizer do que estou falando. Estou falando da PORCARIA DA LOUÇA QUE VOCÊ NÃO LAVOU!

  Na hora lembrei que tinha me esquecido da louça.

  - POR ONDE ANDOU? POR QUE NÃO LAVOU A DROGA DA LOUÇA??? ME RESPONDE! - Gritou, me batendo no rosto.

  - Ai!!!! Eu não sei! Eu apenas esqueci...

  - ONDE ESTEVE, MARY WOOD? DIGA-ME!

  - EU SAÍ!!! SAÍ DESSE LUGAR POR PELO MENOS UMA TARDE... ESTAVA COM MEUS AMIGOS!

  O que mais temia no momento era ela, de alguma forma, descobrir minha amizade com o John e fazer algum mal à ele, já que um idoso de 70 anos não ia ter como se defender.

  - EU NÃO LHE DEI PERMISSÃO! - Continuou ela.

  - AH É??? E DESDE QUANDO EU PRECISO DE SUA PERMISSÃO??? EU FAÇO O QUE EU QUISER PORQUE VOCÊ FAZ O QUE QUER!!! SÓ QUE AO CONTRÁRIO DE VOCÊ, EU NÃO FAÇO MAL À NINGUÉM!!!

  - CALA A BOCA! - Disse ela me dando um soco no olho. Se eu não tivesse me apoiado na mesa logo atrás de mim, eu teria caído. - VAI LAVAR A LOUÇA, AGORA!!! - Falou, indo pro quarto.

  Chorando, fui lavar a louça e logo depois, fui ao quarto, dormir. Ao chegar, imediatamente tirei da gaveta um lenço e guardei o cavalinho de madeira do John lá, em seguida o coloquei bem guardado dentro do guarda roupas.

  Eu ainda não tinha jantado, estava só com o café da tarde, e graças ao John. Do meu quarto, escutei ela mexendo nas panelas fazendo a janta, mas eu não queria sair de lá por nada. Preferia dormir com fome ao olhar pro rosto dela de novo. Fiz oração e a última coisa que pensei antes de cair no sono foi imaginar como seria o dia seguinte, com o John. "Será que ele vai perceber que apanhei?"

  Pensei comigo mesma, sem saber que amanheceria com um olho roxo.

Continua...

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