Cheguei com ele no hospital. A secretária, ao me ver abrir a porta rapidamente com John quase se arrastando segurando em mim de tão fraco, foi imediatamente chamar o médico. Aparentemente, era emergência.
Entrei com ele no quarto e o médico me disse para que por favor, me retirasse dali. Sentei então muito ansiosa na sala de espera, sabendo que meu melhor amigo estava sozinho lá dentro com outra pessoa que não era eu. É óbvio que sei que o médico não iria fazer mal à ele; era mais por ciúmes mesmo que eu estava daquele jeito. O que mais temia nessa fase de minha vida era alguma coisa ruim acontecer ao John.Alguns 20 minutos depois, o médico abriu a porta do quarto em que estava, olhou pra mim e veio em minha direção. Imediatamente fiquei em pé, não preparada para ouvir notícia ruim.
- Está tudo bem com ele, fique tranquila. Ele teve apenas uma desidratação. John me disse que você é a única que pode me responder coisas sobre ele e quero lhe perguntar: ele é um idoso sossegado ou mais, digamos... espoleta??
- Hahaha... não sei se ele gostaria que eu lhe dissesse a verdade porque pode, sei lá, limitar ele de fazer as coisas que gosta. Mas sim, ele é bem eufórico. Levanta 6h da manhã para fazer estilingues e outros instrumentos de madeira de vários tamanhos, volta pra casa, faz mais ainda, limpa a casa, lava a louça três vezes ao dia... sei que isso é normal, mas para um idoso como ele, é muita coisa. Sem contar que faz quase 20 anos que ele faz isso sozinho.
- Sabia! A desidratação que ele teve não foi das mais leves. Você, Srta. Mary, como grande amiga dele, deve lhe alertar para parar de fazer todas essas coisas. Não importa o tanto que ele for teimar...
- Mas espera... ele ama fazer essas coisas. Se eu lhe mandar parar, é capaz dele ficar até mais doente...
Isso calou a boca do médico por alguns segundos, até que respirou fundo e concluiu:
- Então faz assim: não precisa proibir ele de fazer isso, mas você acha que pode ajudá-lo a fazer essas coisas? Sei que tem apenas 13 anos, mas...
- Imagina! Ajudo sim.
- Ótimo. Me acompanhe, ele já está liberado para visitas. - Disse, me levando para o quarto.
Ele abriu a porta e vi meu amiguinho deitadinho numa cama tomando soro com uma magueirinha no nariz, aparentemente estava dormindo.
- Vamos falar baixo. Vou sentar ao lado dele para lhe fazer companhia. Espero o tempo que for pra ele acordar. - Sussurrei ao médico.
- Faça o que achar melhor. Com licença, preciso atender os outros pacientes. - Falou ele, se retirando.
Sentei vagarosamente ao lado de John para não acorda-lo.
- ... M... Mary? Oooh, Mary... é você! Você está aqui... - Disse com sua voz ainda fraca e rouca, com seus olhos quase fechados, sorrindo para mim.
- Sim, John. Eu estou aqui! Vai ficar tudo bem, ja já iremos pra casa. Durma mais um pouco. - Respondi baixinho, passando a mão em seus cabelinhos brancos.
- Oh não... não quero dormir agora...
- Você quem sabe...
Ele fixou em meu olhar com seus olhos claros e lacrimejando.
- Eu tenho um sonho, Mary.
- Me desculpe, não lhe ouvi direito. - Disse, aproximando meu ouvido de sua boca.
- Tenho um sonho...
- Que ótimo! Me desculpe não ter lhe perguntado isso antes. É que você já está velh... ãmm... éeee... sabe...
- "Velho", não é? Haha, pode falar. - Disse, sorrindo.
- Não era bem isso... é que... na verdade eu pensava que você já tinha realizado todos os seus sonhos.
- Sim, sim! Realizei vários e vários sonhos. Mas desde criança eu tinha um sonho. Tinha um sonho de poder construir uma casa linda para servir de abrigo para crianças e jovens que não têm família. Agora, depois da Guerra Civil, esse sonho aumentou.
- Que maravilhoso! Isso é magnífico, John, realmente! Mas, por que você "tinha" um sonho? Não o tem mais???
- É que... - murchou seus pulmões e olhava para cima, para o teto do quarto, onde estava deitado. - primeiramente, não tenho as mínimas condições financeiras para construir uma casa em boas condições para abrigar essas crianças. Em segundo, já estou próximo da morte. Realizar isso é então impossí...- Não fale uma coisa dessas! Você ainda vai durar muito, eu sei que vai! Só precisa de uma ajuda nas tarefas de casa. E eu estou aqui pra te ajudar.
- Ah, Mary... - Disse, sorrindo. - Você sem dúvidas foi a pessoa mais especial que conheci há mais de 20 anos...
- Você também, John.
- ... mas não dá, simplesmente não dá. Onde irei arrumar dinheiro para fazer isso? O que ganho mal dá pra comprar minha comida e instrumentos para minhas pequenas construções de madeira.
Eu não conseguia pensar em nenhuma resposta e consolo para situação dele, então apenas disse:
- John, tudo vai ficar bem. Vai dar certo.
Ao anoitecer, precisei voltar pra casa de tia Constance. Me despedi do John e o avisei que estaria lá no dia seguinte. No caminho, comecei a chorar. Eu não estava bem. Por que as coisas tinham que ser assim? John deveria realizar seu sonho. Meus pais não deveriam ter morrido. Eu não deveria estar morando com aquele monstro que era tia Constance.
Cheguei, fiz minhas obrigações sem ter muito diálogo com minha tia e fui dormir. Chorei, chorei e chorei. Sentei no chão encostada na parede em posição fetal. Eu só chorava, eu realmente não estava bem.
Fui vagarosamente ao quarto de minha tia, peguei seu revólver e voltei para o meu, me sentei no chão e fiquei segurando-o, olhando para ele.Armei ele e o apontei para meu queixo. Chorava, fechava forte meus olhos e tentava várias vezes puxar o gatilho, mas não conseguia. Do nada, até hoje não sei explicar, me veio à cabeça vários pensamentos.
Pensei que se fizesse isso, amanhã John ia receber alta e eu não estaria lá para vê-lo. Pensei que ele não teria mais alguém que podeira ajudá-lo e lhe fazer companhia, e sim daria um trabalho à mais pra ele, que era comprar e levar flores ao meu túmulo. Pensei o quão chateados ficariam meus pais ao saberem o que eu estava prestes à fazer.Depois então de tanto soar e chorar, larguei a arma e fechei os olhos. Caí no sono sem perceber. Só me lembro que tive um sonho. Um sonho que motivaria minha vida. Um sonho que me mudaria para sempre, que me fazeria ficar bem psicologicamente depois de três longos anos.
No sonho, meus pais chegaram em mim. Meu pai me estendeu a mão e disse:Enxugue essas lágrimas, e saia um pouco aqui para fora
Vamos ter uma conversa
Haverá tempos em que a saudade vai machucar
Mas filha, você está levando bem. É uma guerreira, sentimos sua falta também.Se lembra de quando te colocávamos para dormir ao nosso lado
E lhe dávamos beijos de boa noite?
Daqui de cima não é diferente.
Estamos com você mas você não sente.Quando tiver saudade, olhe aqui pro céu
O qual admirávamos diariamente
Agora, é aqui que moramos
E mesmo distante, andamos com você.Continua...
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Diário de uma Justiceira
Short Story***TROQUEI DE CELULAR E NAO CONSEGUI LOGAR NESTA CONTA NELE, FAVOR SEGUIREM @monimo0n__ CONTINUAREI A HISTORIA LA*** Em 1873, no Oeste Selvagem dos Estados Unidos da América, Mary Wood tinha apenas 10 anos quando seus pais, Peter Wood e Jane Brow...