Capítulo 11

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- Como assim Gabi? – eu disse assim que recuperei a capacidade de dizer algo.

- Vai ser melhor, Eduardo. – e quando olhei nos seus olhos, quase marejados, vi dentro deles um pouco da Gabi que havia se perdido.

- Por que, Gabi? – agora, meus olhos estavam marejados.

- Eu sei que não é o que a gente sonhou, Eduardo. Nós dois estamos machucados. E se formos mexer agora, vai sangrar e prefiro que não sangre. Não é pra sempre. Só quero um tempo. – disse, me desmontando com a intensidade de suas palavras.

- Gabi, a gente pode acertar. – o desespero na minha voz era nítido. - Continuar de onde parou. Me diz no que te machuquei, a gente acerta.

- Só um tempo, Dú. – ela me olhou como se não tivesse tão decidida como parecia no minuto anterior.

- Não Gabi. Pensa melhor. Dorme, descansa. Amanhã é sábado e a gente conversa.

Ela me olhou séria, afirmando positivamente com a cabeça. Eu e minha mania de deixar para depois as coisas que eu deveria resolver na hora. Sorri, um pouco mais aliviado. Estava tarde, e eu estava cansado. Resolver "amanhã" era sempre a minha primeira opção.

- Quer que eu peça uma pizza?

- Já jantei. Vou deitar. – ela respondeu, num misto de antiga e nova Gabi.

Minha noite foi longa. O sono não vinha. Pensei e pensei em tudo que havia me acontecido nos últimos meses, e achei tudo muito doido. Uma prova do quanto a vida pode ser imprevisível. Se contassem ao Eduardo de anos atrás tudo que me aconteceria, seria difícil acreditar. Mas ali estava eu, vivendo minha vida.

Aquele dia, no meu trabalho, conheci o Antônio. O cara que estava vindo de outra unidade para assumir a promoção que deveria ser minha. Achei justo. Depois não. Sempre dei o sangue na empresa, me esforcei ao máximo, e, se nas últimas semanas fui um funcionário diferente do que sempre fui, era porque as coisas saíram do controle. Desde que havia voltado ao trabalho, fiz de tudo para recuperar o tempo perdido. Hora extra. Trabalho pra casa. Reunião em fim de semana. Mas, tudo bem. "Outras oportunidades surgirão", foi o que meu chefe disse.

Ali, minha mente começou a pensar justamente nisso: será que não dei além do necessário para o trabalho e menos do que eu deveria para minha família? Será que estou usando meu trabalho para justificar minha ausência, minha falta de habilidade em me comprometer de verdade? Este trabalho estava me servindo ou eu estava servindo a ele?

Novamente, percebi que havia caído no mesmo erro. Aquela era a minha Gabi, desesperada por mais de mim, e eu lhe virando as costas, como por muitas vezes, quando ela mais precisou. Sem família, sem amigos. Dependendo unicamente de mim. Não financeiramente, mas de tudo aquilo que o dinheiro não é capaz de comparar. Deixei a Gabi, no pior e mais maravilhoso momento da vida dela, que por ironia do destino, aconteciam ao mesmo tempo.

Lembrei da minha promessa, feita na primeira da sequência de noites longas: eu iria me casar com a Gabi.

Iria me casar, e iriamos viajar. Nossas férias nunca batiam, e nossas viagens sempre foram curtas, aproveitando feriados e fins de semana. Assim que nos estabilizássemos, iriamos viajar. Pediria férias, demissão, sei lá. Mas eu priorizaria minha família. Investiria mais deles que em mim, ou no meu trabalho. Iria otimizar o meu tempo. Seria a Gabi, o Lucas e eu.

Comecei a fazer planos e planos. Acordei com um chorinho do Lucas, o lugar ao meu lado da cama estava vazio. A Gabi havia ido.

Primeiro liguei, desesperadamente. Ela não atendeu. Acudi o Lucas, e quando ele dormiu novamente, cheguei a conclusão que precisava de um daqueles banhos que lavam a alma. Abri o chuveiro, e senti as gotas ferventes caírem sobre minha pele, o vapor como um gás venenoso enchia meus olhos, e esta era a deixa que precisava para chorar. Quando terminei, comecei a pensar no que iria fazer.

A ideia inicial era ir até lá imediatamente e implorar que ela voltasse. Mas pensei melhor. Tomei uma água. Respirei fundo... e decidi iniciar o cumprimento da minha promessa.

Limpei o dinheiro que tinha na conta, fui até uma joalheria no centro da cidade. Estacionei o carro, peguei o Lucas no colo. Entrei tendo certeza de que estava fazendo a coisa certa.

- Bom dia. – disse sem jeito, ajeitando a mantinha do Lucas. – É... – por um segundo não tive a certeza de momentos antes e gaguejei. – Estou procurando uma aliança, um anel...

- Olá! – disse a atendente, sorridente demais para aquela hora da manhã. – Sente-se fique a vontade!

Sentei-me, ainda ajeitando a mantinha do Lucas.

- Que bebê lindo! Novinho né?

Pronto, me ganhou. Pode chamar de coruja. Foi só falar isso que descarreguei sobre ela todas as palavras que precisava desabafar mas não tinha com quem.

- Meu filho! – eu disse sorrindo. – é pra trazer a mãe dele de volta que estou aqui.

E sim, passei a vergonha de contar toda a minha história com a Gabi naquela joalheria, para as três ou quatro atendentes que pararam o que estavam fazendo e apoiaram-se nas paredes e estantes de vidro para me ouvir, entre suspiros e olhos brilhantes. Elas me acharam um fofo.

- Que história linda! Vamos te ajudar!

E em poucos minutos, sai de lá bem mais pobre, com um anel fino, e delicado como a Gabi, com muita fé de que ele seria suficiente para criar a ligação eterna que faltava entre nós. Cheguei em casa pensando nas palavras certas que diria para a Gabi. E só então me toquei de que não sabia onde ela estava. Voltei a ligar em seu celular, e nada. Caixa postal. A tarde chegou, depois a noite, com uma chuva intensa e abafada. Passei a noite acordado, e então, pela manhã, tive a ideia de ligar no único lugar em que ela poderia estar: a casa de dona Ivone. O telefone chamou até que caísse na caixa postal. Desliguei, desenganado, quando que havia chegado uma mensagem em meu celular.

"Dú, para de ligar, por favor."

Respondi com mãos trêmulas, escrevendo rápido e muito errado, torcendo para que o corretor do celular desse conta de arrumar tudo:

"Gabi, onde vc está? Preciso muito falar com você. Por favor, só um minuto."

A resposta veio instantaneamente:

"Eduardo, você sabe onde eu estou. Por favor, só preciso ficar sozinha, pensar um pouco."

Uma insegurança ensurdecedora gritava ao meu ouvido que eu a havia perdido. Situações desesperadas pedem atitudes desesperadas:

"Eu não posso, Gabi! Eu não consigo passar um dia te ver, sem ouvir a sua voz. Eu te amo, Gabi!"

Sim, eu mandei isso pra ela. Sentindo meu rosto queimar de vergonha em admitir que ela era tudo pra mim. No mesmo instante, pensei em apagar, mas o Lucas resmungou, lhe dei atenção, e quando voltei ao celular, ela já havia visualizado. E que se dane, era a verdade.

"Vou te ligar." – Li antes do celular começar a tocar.

Atendi, não só com as mãos e a voz trêmulas, mas com o corpo todo, como se aquela fosse a primeira vez que nos falávamos.

"- Dú!... Dú, desculpa." Ela fez uma pausa, enquanto a ouvia chorar. – Dú, eu não posso viver assim. Não era assim que eu pensava que seria. Nós dois. Eu não posso me contentar com isso.

"-Gabi, calma. Me escuta." – disse sentindo minha voz embargar, e fica estranhamente ridícula, como fica quando estou prestes a chorar. "Gabi, desculpa. Eu sei que eu errei, e você precisava mais de mim do que pude te oferecer. Desculpa, Gabi, mil desculpas, mas pelo amor de Deus, volta!"

- "Não dá, Eduardo. Desculpa." – ela disse, mais recomposta que eu. "Eu vou aí. Não por agora, mas eu vou. Nós temos um filho juntos... Só calma, tá?"

Respondi "Uhum" entre as muitas lágrimas que eu chorava ali. Com meu filho nos braços, o filho que achei que seria o vínculo eterno entre eu e a Gabi. Fui para o banho quente assim que ela desligou. Por hora, torci que apenas aquele banho me bastasse. Mas nem havia entrado, e o Lucas começou a chorar.


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