A Menina que colecionava Penas (Completo)

A troca de Asas (parte II)

Só faltam duas, ele tem tantas!

Me aproximei do rapaz de asas e as arranquei.

Meu passaporte para o paraíso. Poderíamos voar juntos para longe e ficaria
tudo bem.

Retirei o meu pote de penas deixei-o desfazer no chão enquanto elas
flutuavam sobre a brisa anunciando a minha liberdade.

Afinal o que poderia ser melhor do que ser um anjo?

Não tenho tempo a perder! Eles já se aproximam.

– Eu desejo ser um anjo! – disse com todo meu coração.

Nesse momento sorri para a felicidade, mas quando olhei para o Grandel ele parecia ter deceção em formas de lágrimas.

– Grandel? – perguntei completamente confusa.

Ele não deveria estar feliz por mim?
Me apetecia chorar, mas os anjos não choram.
E num piscar de olhos, tudo se desfez como um grande puzzle num mínimo
toque desastroso.

Afinal, o que é a vida senão um puzzle feito das nossas escolhas?

*

A uma segunda coisa que todos estão sujeitos a fazer, é magoar a quem
amamos mesmo quando acreditamos estar fazendo o certo, principalmente
a nós mesmos.

Espera! Todos não! Exceto os anjos.
Agora sou um e posso dizer que as coisas são bem diferentes do que
imaginei. Ser anjo é não errar, não sentir, não amar! É não existir tal como
o rapaz de asas me confidenciou.
Então qual é a surpresa?

– Dorme, dorme pequeno passarinho!
Ainda é cedo para o grande voo!
Deves ficar no ninho até estar pronto para esse Mundo louco…

– Mãe? – perguntei assim que deparei com a sua figura a minha frente.

– É tão lindo!

– Pai? – perguntei novamente quando a sua imagem juntou-se ao dela.

– Será um menino muito feliz!

– Avó? Estão todos aqui! Vieram buscar-me? – os encarei.

Me ignoraram. Talvez estivessem zangados.

– Sinto muito por tudo! Prometo que dessa vez será diferente. Sou só eu
sem gigante sem rosto. – disse à todos , mas ninguém parecia me ouvir.

Olhei a minha volta, era meu quarto. Mas sem o amarelo que lembrava a
minha mãe aos girassóis. Ela dizia que eram especiais, porque sempre
sorriam para um novo dia! Porém, agora era um imenso azul aliado a um
branco e cheirava a bebé!

A Emelly não existia mais!
Me dei conta o quanto os nossos desejos podem ser traiçoeiros. Se
disfarçam com os nossos anseios, aproveitando do nosso desespero para no
final revelar-se uma deceção, como agora.

Porém, ainda falta a parte do existir. Pois, os anjos não mentem! E hoje posso dizer que um só existe, quando é dado a alguém as primeiras
sementes do amor. Porque de todas as coisas que podem existir, ele é o
único que pode afastar o mal do Mundo.

Me aproximei do berço para olhar o meu Humano. Ele tinha as mãos
pequenas e apertadas para agarrar a vida e não deixá-la escapar entre os
dedos; a pele branca de uma folha de papel, ansiando as primeiras linhas
de uma história desconhecida; o cabelo negro da noite aguardando suas
vitórias e quando abriu os olhos, estes me foram tão familiares como de um
rapaz que me acolheu um dia em suas asas.

Espera!

– Grandel és tu?