17- Luísa

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        - Tchau, Carlos! - Balancei o braço no ar com a mão aberta para o alto.

        - Se cuide, ruivinha. - Ele me deu sorriso simpático e partiu com o carro.

        Eu devia parar de pensar nesse campeonato de dança... Nem dançar eu sei! Comecei a rir histericamente, sem conseguir parar. Imaginei-me dançando, fazendo passos do Michael Jackson. Deslizando os calcanhares no chão e abaixando um chapéu preto. Prefiro chapéu colorido, ficaria mais interessante! Porém, como a desatenta que sou, não notei que ainda estava caminhando para entrar em casa. Bati uma das muletas na beirada do degrau que eu tinha subido e cambaleei, sem firmeza. Soltei a muleta na tentativa de me equilibrar e entrei em desespero, quando encostei meu pé machucado sobre o chão e caí de uma vez. Dei de cara no chão, para variar.

        - Mãe! - Gritei.

        A gravidade não gosta de mim mesmo. Senti uma coisa quente descer pelo meu nariz e toquei para ver o que era.

        - Mãe! Mãe! Mãe! - Gritei repetidas vezes quando percebi que tinha quebrado o nariz. Por que esse tipo de coisa só acontece comigo? Poxa, eu sou tão legal... Minha mãe apareceu na porta de olhos arregalados.

        - Meu Deus, Luísa! Está parecendo filme de ação que o cara leva uma surra e é jogado ferido no meio do nada! - Ela correu para me ajudar a ficar de pé.

        - Só que eu tô na porta da minha casa, né? - Comecei a rir.

        - Essa queda afetou seus neorônios. Nunca vi uma pessoa com o nariz quebrado sorrir. Só em filme mesmo. - Ela me sentou no sofá e correu para pegar uma maleta com coisas de emergência...

         - Falando em filme, a diretora do inferno disse que eu tenho que participar de um campeonato de dança para continuar estudando lá. - Cutuquei o nariz com o dedo indicador.

         Mamãe chegou a tempo de tirar meus dedos dali e me olhar repreensivamente.

         - Se você ficar mexendo, vai doer mais. - Ela advertiu, abrindo a maleta branca com uma cruz vermelha. Olha, eu nunca tinha notado essa cruz... Quando será que botaram aí?

          - Nem está doendo. - Dei de ombros, de olho na cruz da maleta de primeiros-socorros. Ou seria um +? Hum...

          - Do que você estava falando antes? - Ela perguntou, passando o algodão, limpando o sangue que sujava meu rosto.

          - Como? - Perguntei, perdida, mais atenta no algodão pingando álcool que ela ia passar no meu nariz quebrado.

          - Você estava falando algo sobre um campeonato de dança. Você decidiu participar? Nem imagino você numa pista de dança, Luísa... - Minha mãe, uma pessoa tão séria, começou a rir, gargalhadas altas.

         - Eu não escolhi, acontece que se eu não participar como dançarina principal e a escola não ganhar, a diretora demônio me expulsa do colégio... - Falei, revirando os olhos e fazendo careta por conta do ardor. Fechei-os, o cheiro do álcool estava fazendo meus olhos lacrimejarem.

        - Como assim, "te expulsar"?! O que você fez?! - Ela perguntou, cessando os risos.

        - Mãe, eu não fiz nadinha... É só porque eu esqueci de vestir o uniforme de novo e porque eu usei pantufas na escola... Não foi nada demais! Eu nem aprontei nada ainda! - Minha mãe fez uma cara muito feia, me encolhi. - Nem vou fazer, vou ficar quietinha. - Sacudi a cabeça freneticamente, contendo um riso.

         Luísa, seja seria pelo menos uma vez na vida! (Diz a carciênça) Foi mal, não dá! (Disse eu para mim mesma) Não resisti e desatei a rir, quando minha mãe terminou de colocar o curativo e os rolinhos de algodão dentro do meu nariz. Quase os espirrei para longe.

        - Mas, do que é que você está rindo? - Ela perguntou, sem entender, passando a mão pelos cabelos e pelo corpo. - Tem alguma coisa em mim? Algum bicho estranho?! - Ela falou com medo.

         - Não, mas a Mercedes tá em um péssimo lugar! - Continuei rindo sem parar.

         - Mercedes?! Luísa, quem é Mercedes?! - Mamãe se agitou, olhando ao redor.

         Acho que eu esqueci de contar que gosto de aranhas, tarântulas especificamente. As acho tão bonitas! Apontei para o meu bichinho firmado na parede com suas perninhas tão frágeis em relação as minhas. Mercedes aí dá era tão pequena e já ia morrer, coitadinha.

        Mamãe correu para fora da sala, indo chamar alguém. Teimosa como eu sou, me arrastei pela casa de bunda no chão até chegar no meu quarto, bem a tempo de ouvir cair uma mensagem.

         Thiago: Oi. Você está bem?

         Meu Deus! Ele mandou mensagem! Ele mandou mensagem mesmo! O que eu digo? "Oi, estou bem e você?", "Ah, sim, claro, tudo ótimo e por aí?", ou " Estou muito bem, sim obrigada, inclusive agora." O que eu faço?! Jesus-Maria-José! Vou falar merda, eu sei que vou!

         Lulu: Ah, sim. E você?

         Comecei a roer as unhas, sem conseguir piscar ou desviar meus olhos do aparelho.

          Thiago: Estou bem. Eu queria falar com você sobre algo importante.

          Algo importante?! Tipo o quê?! Me empertiguei, desliguei e liguei a tela do celular inúmeras vezes, nervosa, ansiosa, me perguntando se eu devia ou não perguntar o que era. Ahhhhh curiosidade me mata! Os três pontinhos se mexeram na barra do aplicativo e eu mastiguei meu dedo em expectativa.

          Thiago: Sobre o nosso trabalho em dupla, ainda não fizemos. Pode ser na sua casa, já que você não pode andar? Não tem problema para mim.

          Luísa: Ah, sim! Claro, pode ser! É só que... Eu meio que quebrei meu nariz hoje...

           Enviei. Depois de quinze segundos analisando o que eu havia escrito, me arrependi. Como assim "eu meio que quebrei o meu nariz"?! Eu não tô normal, carciênça, me ajuda!

          Thiago: Hahaha, como assim? Isso é verdade?!

          Thiago: Só você mesma, Lulu!

          E novamente, aquela sensação estranha que me queimava por dentro, como um fogo nas entranhas, um enjôo, uma tontura... Me senti ficar vermelha, mesmo sem vê-lo perto de mim. Que sensação estranha... O que é isso que eu estou sentindo? E porque eu só sinto com ele? Longe, ou perto... É sempre com ele! O que eu faço com esse sentimento todo que eu nem sei explicar?!

            Luísa: É, eu sou terrível kkkkkk

            Thiago: Você é ótima! Posso ir às três?

            Luísa: Pode sim, vou esperar você!

            Fiquei tão feliz que deixei o celular cair da minha mão em cima da cama, abracei um travesseiro olhando o teto. Estava no ares pela frase "Você é ótima!" Rolei na cama abraçada com o travesseiro e acabei caindo no chão de costas.

            - Mãe! - Gemi por dentro, bem baixinho. Hoje não é meu dia, o universo me odeia! E a gravidade! O que eu fiz pra vocês?! Poxa... Mais um roxo!

     

      

LULU?Onde histórias criam vida. Descubra agora