IX

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"Mas da árvore do conhecimento do bem e do mal, dela não comerás; porque no dia em que dela comeres, certamente morrerás (Gênesis 2:17)"

_ Ahahahahah!! Cara, você tinha que poder se ver!!! Impagável! - diz Diogo rindo com a barriga, uma risada feita com vontade e que faz minha cara ficar vermelha. Ri ainda enquanto me desamarra.

_ Qual a graça?! - digo irritado - Não estava com raiva pelo que eu fiz?!

Diogo voltou gargalhando, meio minuto depois de bater a porta e me deixar ali amarrado chamando por ele.

_ Mas foi você quem disse que desejava um relacionamento aberto, logo após o acidente, não se lembra?

A irritação cede lugar a surpresa. A palavra "acidente" parece avivar algo dormente em minha memória. Um flash de uma sensação molhada, áspera e quente em contato com meu corpo. O cheiro de asfalto...

_ Acidente? - digo, colocando minha mão direita instintivamente na cabeça, um excesso de informação para ser absorvida.

_ Sim, acidente. Exatamente aí, isso, aí; onde você pois a mão agora. É o lugar onde houve o trauma. A Dr.ª Rute previu que você ficaria confuso e parcialmente desmemoriado por um tempo, a memória deveria ir voltando aos poucos, não era pra ninguém ficar tocando no assunto. Achei que você houvesse desperto essas memórias.

_ Acidente... - digo murmurado, me sentindo levemente zonzo com a informação.

A ideia não me é estranha. Mas algumas coisas não parecem se encaixar. Eu ainda me lembro de muita coisa do meu passado. Eu com certeza não sou o tipo de pessoa que aceitaria um relacionamento aberto. E se for tudo mentira?!

_ Diogo. Tem certeza de tudo isso que está me falando? Eu não me lembro muito bem desse tal acidente, ou de ter proposto um relacionamento... aberto (só de falar essa palavra já me sinto meio constrangido, com certeza eu não propus isso! )... aliás...

Me sinto confuso, assustado, mas principalmente eufórico, o sangue me vem a cabeça, me dando uma sensação de calor, não encontro palavras pra dizer o que sinto, acaba saindo algo há muito guardado:

_ ... eu nem me lembro de termos proposto algum tipo de relacionamento um ao outro. Não me lembro da gente se conhecendo...

Diogo faz para mim uma cara magoada. Qualquer vislumbre de sorriso desaparece, porém continuo:

_ Eu me sinto aflito, pois sempre sinto que não o conheço. Eu não sei no que acreditar.

_ Eu entendo. O acidente. O trauma. Todo o resto... Foi demais pra você, foi muito. Não pense que eu não percebo isso. Seus devaneios, pesadelos, seu jeito aflito. Sei que não tem sido fácil, porém eu achava que você me queria aqui por perto com você. Há coisas que só você pode fazer por si mesmo, e eu o que posso e ficar aqui com você.

_ Ah, Diogo...

_ Você deve se perguntar se está satisfeito comigo aqui. Se está feliz ou se quer que eu me vá. Eu posso sumir da sua vida pra sempre, se for o que você quer... A escolha é sua.

Uma reação direta àquela frase parece estremecer o meu corpo, me comovendo ao mesmo tempo que me desperta medo. Um medo grande e irracional. Me vejo pular em seus braços e começar a apertá-lo, a apalpá-lo.

_ Não! - digo, beijando seu pescoço - Meu amor, me desculpa. Eu não quero, eu... sou tão idiota, mas eu estava com tanto medo...

_ Shiiii - chia ele, baixinho, beijando minha boca e me fazendo silenciar. - Está tudo bem, ok?

O Diabo sobre a CarneOnde histórias criam vida. Descubra agora