Theresienstadt

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1943-42

Os dias e os meses iam passando , e Theresienstadt ficava cada vez mais cheia e amontoada. Trens lotados de pessoas chegavam a toda hora. Isso significava menos comida para todos, e as pessoas começavam a ficar doentes e fracas. Os mais jovens e os mais idosos eram
os que mais corriam riscos.

Um dia, depois de um ano no gueto, Hana recebeu uma mensagem urgente do irmão:
Encontre-me na Casa dos Meninos às seis horas desta tarde. Tenho uma surpresa maravilhosa para você.

George não conseguia esperar para dar as boas-novas a Hana.

– Vovó está aqui! Ela chegou ontem à noite!

As crianças ficaram mais do que felizes em ver a avó. Também ficaram preocupadas. A avó de George e Hana era uma mulher culta e refinada, que vivia confortavelmente na capital, Praga. Foi essa avó generosa que havia presenteado os netos com os triciclos. Quando a
visitavam na cidade grande, ela sempre lhes dava bananas e laranjas. Mas, nos últimos anos, ela havia estado muito doente. Como ela sobreviveria àquele lugar horrível? Logo perceberam que não conseguiria.

As crianças encontraram-na num sótão hiperlotado, dormindo diretamente em cima de palha, uma das muitas pessoas idosas e doentes. Eram meados de julho, e o sótão estava um forno.

Ficaram horrorizados com o que viram: a avó, elegante e carinhosa, estava com uma aparência terrível. Seu lindo cabelo branco, antigamente tão penteado e arrumado, estava todo embaraçado. Suas roupas estavam rasgadas e gastas.

– Eu trouxe um desenho para você! – exclamou Hana, achando que isso faria sua avó sorrir.

Mas esta quase não conseguia virar a cabeça. Então Hana pegou seu desenho e dobrou como um leque. – Descanse – disse, enquanto abanava a avó. Hana sentiu-se orgulhosa de poder fazer alguma coisa para ajudá-la.

Hana logo soube que os idosos em Theresienstadt eram os que recebiam as menores porções de comida. A comida que sua avó recebia nunca era suficiente para matar a fome e estava sempre cheia de bichos. E não havia remédios. As crianças a visitavam sempre que podiam e tentavam animá-la com presentes que haviam feito e com canções que haviam aprendido.

– Esse pesadelo irá acabar logo – dizia George.

– Mamãe e Papai estão contando que permaneçamos fortes – dizia Hana.

Todavia, em três meses sua avó estava morta. Além de George e Hana, poucas pessoas perceberam. A morte estava em todos os lugares. Tantas pessoas morriam todos os dias que o cemitério já estava lotado. Apoiando-se um no outro, Hana e George se lembraram dos tempos felizes com a avó e choraram juntos.

Conforme as pessoas iam sendo despejadas em Terezin, outras milhares eram levadas embora. Eram esmagadas em vagões de carga e enviadas para um destino desconhecido no leste. Rumores sobre essas viagens se espalharam dentro dos muros do campo. Alguns tentaram
se convencer, e convencer os outros, de que uma vida melhor esperava pelas pessoas que iam embora no trem. Mas, conforme o tempo passava, chegavam histórias de campos de extermínio e assassinatos brutais em massa, que se espalhavam rapidamente. Quando ouvia as pessoas falando dessas coisas, Hana tapava os ouvidos.

As semanas passavam, e a temida lista das pessoas a embarcar era colocada em cada prédio.

As pessoas que tivessem o nome nessa lista deveriam se apresentar num auditório próximo aos trilhos em dois dias. Listas. Em todos os lugares havia listas. Os nazistas eram sistemáticos em relação aos registros
e queriam que todos os prisioneiros soubessem disso. Por intermédio da contagem frequente dos prisioneiros, mostravam quem estava no comando. Todos ali sabiam que ser contado e ser
percebido poderia significar ser levado a outro lugar e ser novamente separado da família e dos amigos.

Uma manhã, enquanto Hana fazia suas tarefas, todos foram ordenados a parar o que estivessem fazendo e reunir-se num amplo campo do lado de fora da cidade. Todos: jovens e idosos. Marcharam para fora escoltados por soldados nazistas que carregavam metralhadoras.

Foram ordenados a ficar ali sem comida e sem água, pressentindo que algo terrível estava para acontecer. Hana e as outras garotas nem ousavam cochichar entre si.

Hana não conseguia aceitar que seria separada de George. Ou das garotas do Kinderheim L410, que haviam se tornado como irmãs. Já não era suficiente que seus pais haviam sido separados dela? Ella ficou ao seu lado, tentando animá-la com sorrisos e piscadelas. Mas, depois de quatro horas esperando, Hana já não conseguia conter o desespero. Ela começou a chorar.

Ella tirou um pequeno pedaço de pão que estava escondido dentro do casaco.

– Coma isto, Hana – silenciosamente implorou. – Vai se sentir melhor.

Mas as lágrimas de Hana não paravam. Então, a amiga virou-se e olhou para ela.

– Ouça atentamente o que vou dizer – sussurrou. – Você está infeliz e com medo. É assim que os nazistas querem nos ver.

A Mala De Hana - Parte 2Onde histórias criam vida. Descubra agora