Nove mesto

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Inverno de 1941-1942

Agora, eram apenas as duas crianças sem os pais. George colocou o braço nos ombros de sua irmã de dez anos e prometeu cuidar dela. Boshka, a empregada, tentou distraí-los com doces e conversas ternas. Não funcionou. As crianças estavam tristes, e todos, muito
assustados.

Horas depois de o pai ter sido levado, bateram novamente na porta. O coração de Hana disparou. George engoliu em seco. Quem viriam pegar agora? Mas, quando abriram a porta, viram Tio Ludvik, o querido Tio Ludvik.

– Acabei de saber – disse ele, abraçando Hana com um braço e George com o outro.

– Vocês dois vêm comigo. Vocês devem ficar com sua família, com as pessoas que os amam.

Tio Ludvik era cristão e tinha se casado com a irmã de Papai. Não sendo judeu, não era alvo dos nazistas. Mas ele era corajoso em ficar com George e Hana. A Gestapo já havia avisado que as pessoas que ajudassem judeus seriam punidas severamente.

Tio Ludvik disse às crianças que pegassem suas coisas mais preciosas. Hana pegou sua boneca do tamanho de uma criança de verdade chamada Nana, que estava com ela desde que tinha cinco anos. George pegou todas as fotografias da família. Cada um deles encheu uma mala.

Hana escolheu uma mala marrom, grande, que já havia usado em viagens com a família. Ela adorava o forro de bolinhas. Quando terminaram de arrumar as malas, apagaram a luz e fecharam a porta sem olhar para trás.

Naquela noite, a tia e o tio de Hana colocaram-na numa grande cama, coberta com uma colcha de penas.

– Vamos cuidar de vocês até seus pais voltarem, Hana – prometeram. – E estaremos no andar de baixo, se você acordar no meio da noite.

Mesmo tendo passado muito tempo depois que as luzes foram apagadas, Hana continuava acordada, piscando naquela escuridão estranha. Era uma cama estranha. E o mundo – agora um
lugar perigoso – parecia ter virado de cabeça para baixo. “O que virá a seguir?”, pensou Hana, com medo. Finalmente, conseguiu fechar os olhos e dormir.

Hana acordou de manhã com latidos desesperados embaixo da janela. Seu coração acelerou.
Será que estava certa? Então, reconheceu o som. Era Sylvia, a leal cadela borzoi. Sozinha, tinha encontrado o caminho até Hana e George. “Pelo menos, alguns amigos”, pensou Hana, “pelo
menos, alguns amigos continuam leais.” Era um pequeno conforto.

A casa de Tia Hedda e Tio Ludvik era pequena, mas confortável, com um lindo jardinzinho nos fundos. Era bem perto da escola. Todos os dias, Hana e George viam as crianças passando com suas mochilas, rindo e brincando, a caminho da escola.

– Eu quero ir também! – Hana batia o pé no chão, frustrada e magoada.

Mas não havia nada que pudessem fazer.
Nos meses que se seguiram, Tio Ludvik e Tia Hedda fizeram o possível para que as crianças ficassem ocupadas. George cortava madeira por horas. Hana lia e jogava. Seus primos, Vera e Jiri, gostavam muito dela. Às vezes, até iam juntos para a igreja.

Todos os dias na hora do almoço, Hana e George iam para casa, comer a comida de Boshka, que adorava mimar as crianças. Ela os abraçava, beijava e lembrava que havia prometido aos pais deles que ia cuidar muito bem da alimentação dos dois, para que ficassem saudáveis

A cada duas ou três semanas, chegava uma carta de Papai, que estava na prisão da Gestapo em Iglau. George lia apenas a parte feliz da carta para a irmã. Ele achava que a irmã era jovem demais para saber toda a verdade sobre as condições terríveis das prisões e sobre como Papai estava desesperado para sair. Hana, porém, não era jovem demais para ser deportada pelos nazistas.

A Mala De Hana - Parte 2Onde histórias criam vida. Descubra agora