Ele só foi para casa no outro dia à tarde, com o braço imobilizado. A esposa conduziu o carro até a casa, muda. Daniel não sabia se ela estava furiosa, apavorada ou as duas coisas juntas. Apesar de toda a tensão, ele estava morrendo de fome.
Ainda calada, ela preparou um sanduíche de atum para o marido e levou até a sala onde Daniel a aguardava tenso. Sabia que não poderia mais esconder o que estava acontecendo, ainda mais depois do que se passara na noite passada. Ser atropelado por uma moto enquanto perseguia uma pessoa que simplesmente não existia podia ser caso de internação.
Jessica depositou o sanduíche na mesinha em frente ao marido e se sentou ao lado dele no sofá.
− Muito bem, pode abrir a boca e contar toda a merda que você fez.
As crianças não estavam em casa. Desde o ocorrido foram para a casa da irmã de Jessica e só voltariam à noite. Daniel deu uma leve mordida no sanduíche, agora sem muita vontade de comê-lo.
− Bem, eu…
− Quem é a vadia, Daniel? Quem á puta que fez você me mentir que havia ido visitar sua mãe? Não sabia que mentira tem perna curta?
− Eu amo você, Jessica. Me perdoa – ele pegou as mãos dela do jeito que pôde. – Eu fiz uma enorme burrada e estou pagando pelos meus pecados.
Jessica se soltou dele.
− Pare de se fazer de vítima e me conte quem é ela.
− Madalena – disse ele de uma vez só. – O nome dela é Madalena. Ou melhor, era.
− Como assim? Era?
− Ela morreu.
− Morreu?
− Espere, vou contar tudo. Eu a conheci pelo Facebook e, confesso, fiquei muito interessado. Naquele fim de semana que você viajou para sua irmã, eu fui encontrá-la. Juro, meu amor, eu só queria sexo. E mais nada.
Ela vibrou um tapa no peito do marido que mal pôde se defender. Daniel seguiu em frente. Não podia parar agora.
− Cheguei na sexta à noite e saí de lá no domingo pela manhã. Deixei um bilhete para ela dizendo que eu era casado e que tudo se encerrava por ali. Mas acho que Madalena se apaixonou... Me ligou algumas vezes, eu nunca atendi. Sério, meu anjo, tudo acabou naquele final de semana.
− Como você pode me mentir desta forma, Daniel? – perguntou Jessica com lágrimas nos olhos. – Naquele dia você correu atrás de alguém no shopping. Não era amigo nenhum de infância. Era ela. Ontem várias testemunhas disseram que você estava correndo desesperado atrás de alguém e por isto não viu a moto. E agora vem me dizer que ela morreu?
− É o fantasma dela que está me perseguindo – declarou Daniel seriamente, mas ainda assim se sentindo um babaca.
Jessica se jogou de encontro ao encosto do sofá e colocou as mãos no rosto. Ainda com a face coberta, ela murmurou:
− Meu Deus, você está precisando de um tratamento psiquiátrico.
− Um mês depois do nosso encontro, eu recebi uma ligação. Era uma tal de Francine. Disse que era a melhor amiga de Madalena e que ela havia morrido em um acidente de trânsito.
− A amiga informou isto? E você acreditou?
− E não era para acreditar?
Jessica desferiu outro tapa nele, desta vez com mais força.
− Claro que não. Por Deus, Daniel, como você pode ser tão burro? É claro que esta tal de Madalena não morreu.
− Ligo para o celular e ela não atende. O Facebook foi desativado.
− E o que isto prova? Meu Deus, ela está rondando você!
Daniel pegou o celular e procurou a foto que Junior havia lhe enviado há dias.
− Veja.
− O que é isto? O que Junior tem a ver com esta sua história podre?
− Está vendo esta mulher de lilás? À direita?
Ela pegou o celular. Analisou a imagem e devolveu o aparelho lentamente para o marido.
− É ela?
− Sim. Quando recebi a foto cheguei a me sentir mal. Perguntei ao Junior quem era e ele garantiu que não havia mulher nenhuma por perto quando a foto foi tirada.
Um arrepio percorreu o corpo de Jessica. Não era possível.
− A sua vadia está rondando a escola do nosso filho?
− Amor, ela morreu. É o fantasma dela.
− Procure o telefone da amiga dela! – ordenou Jessica bem furiosa. – Deve estar ainda registrado no seu celular.
− O que você vai fazer?
− Simples. Vou tirar a história a limpo. Coisa que você deveria ter feito.
− Madalena morreu, eu tenho certeza.
− Você viu o corpo?