Daniel se concentrou no seu trabalho o máximo que pôde. Os colegas estavam visivelmente preocupados. Todos o acharam mais magro, o rosto cansado e abatido. O gerente chegou a lhe oferecer uma semana de licença. Ele agradeceu e recusou. Se ficasse em casa, com um casamento em risco e o fantasma da amante lhe rondando, em breve seria internado em um hospital psiquiátrico. Apesar de tudo, o dia não foi ruim. Daniel conseguiu desempenhar bem suas funções, fazendo de conta que tudo na sua vida andava muito bem. Quando eram sete horas da noite decidiu ir para casa. Jessica já devia estar chegando e quanto antes tivessem a conversa, melhor. Ele desceu até o estacionamento olhando para os lados, temendo que a qualquer momento Madalena pudesse surgir detrás de algum carro. Porém, nada aconteceu e Daniel se sentiu um tolo. Ainda assim, deu a partida no carro e saiu com rapidez de lá. Tudo era possível acontecer.
Ele estava ansioso por chegar em casa. Subitamente um cansaço poderoso tomou conta do seu corpo. Para piorar a situação, Daniel se deparou com um enorme congestionamento. O trânsito estava todo parado e aquilo o enfureceu. Era melhor ligar para Jessica e avisar que poderia demorar um pouco mais para chegar em casa.
Ela custou a atender. E quando o fez, não parecia estar bem humorada.
− Oi, Daniel.
−Jessica, estou preso no congestionamento. Acho que vou demorar.
Um silêncio se seguiu.
− É isto mesmo? Ou você está com sua amante?
− Ei, pare com isto, Jessica! É a mais pura verdade. Assim que chegarmos em casa, nós iremos conversar e esclarecer tudo.
− Está bem.
Ela desligou o telefone abruptamente. Daniel ficou angustiado. Se arrependimento matasse...
O carro avançou alguma coisa. Daniel colocou um CD para tentar distrair a cabeça. Uma chuva fraquinha começou a cair e aquilo só aumentou sua depressão. E então ele olhou casualmente para o lado.
Madalena passava calmamente na calçada. A garoa molhava seus cabelos e ela parecia nem sentir. Continuou caminhando como se nada estivesse acontecendo. De repente, a mulher olhou para o lado. Os olhos dela e de Daniel se encontraram por alguns segundos. Em seguida, ela virou a cabeça para frente como se nada tivesse acontecido e retomou seus passos.
Daniel ficou apavorado. O coração pareceu entalar na garganta e ele abriu a porta do carro intempestivamente. Sem pensar em mais nada, Daniel saiu correndo entre os carros parados, tentando encontrar Madalena. Mas ela havia sumido.
− Madalena! Volte aqui, sua filha da puta!
Ele tinha uma vaga noção de que estava perdendo a cabeça. Alguns carros começaram a buzinar, mas mesmo assim Daniel não parou. Havia perdido totalmente Madalena de vista e aquilo o deixou irritado e angustiado. Não percebeu que estava em um cruzamento. As luzes de um ônibus o cegaram momentaneamente. No momento seguinte olhou para o lado ao escutar um berro e uma buzina estridente. Não teve tempo de fazer nada. Seu corpo foi projetado para o ar e o mundo virou de cabeça para baixo em questão de segundos. Daniel sentiu uma dor muito forte e apagou totalmente.