Já passava da meia noite. Pelos corredores, passos calmos estalavam no piso de madeira. Caelis seguiu até seu quarto, enquanto segurava uma pequena cabaça. Escancarando a porta, a rainha alba fitou seu luxuoso conforto, se odiando cada vez mais.
Ela sorriu, destampando a cabaça e despejando líquido inflamável pelo quarto, encharcando o carpete, a cama, a penteadeira, os livros e suas roupas.
Depois, ela apanhou um fósforo do interior de seu traje, riscando-o. Uma pequena chama acendeu no mesmo instante que uma figura surgiu na porta, interrompendo-a. A chama se apagou.
— A governanta me avisou bem a tempo. Eu a resgatei. Luna está acordando, creio que o momento chegou — disse uma voz grave.
— Ótimo! Quero que segure isto. — Ela entregou os fósforos para o seu misterioso companheiro. — Em dez minutos, quero que incendeie este cômodo!
*****
A rainha foi até a câmara subterrânea do castelo, encontrando Luna desacordada. Ao recobrar a consciência, a garota Hyacinthum se levantou num sobressalto, segurou o pescoço da rainha contra a parede e rosnou como um animal.
— Eu posso confiar em você? — indagou a garota.
— Não. Mas, talvez você não tenha outra opção — respondeu rainha Caelis, sua voz não indicava um pingo de nervosismo.
— Você quer me matar? — questionou Luna.
— Você só está viva porque eu a salvei de quase ser encontrada pelo meu marido, naquele terraço — revelou a rainha. — Eu preciso que você viva, Luna.
Luna soltou o pescoço da rainha, que precisou de alguns segundos para recuperar o fôlego.
— O que há na cidade Celestial? — Indagou Luna. — O que é A Máquina?!
— Parece que você sabe um pouco mais do que eu esperava — disse a rainha.
— Eu ainda não sei nada e estou farta disso! Quero respostas! — berrou Luna.
— E você as terá.
Caelis revirou uma gaveta da escrivaninha. Três Passes Dourados foram revelados. Depois, a rainha estendeu um na direção de Luna. Receosa, a garota aceitou.
— Use isso para ver com os seus próprios olhos o que a cidade Celestial esconde do resto do mundo — sugeriu Caelis, convicta.
— Não estou segura lá fora, o rei ordenou que me matassem! — lembrou a garota.
— Não se preocupe. Eu providenciarei uma distração — contou a rainha. — Antes de ir, preciso te entregar seu segundo presente.
A rainha pegou a caixa sobre a escrivaninha, dando-a para a jovem Hyacinthum.
— Você ainda está com a chave? — indagou a rainha.
Luna sacudiu os bolsos, provocando ruídos metálicos.
— Certo. Abra somente quando estiver na cidade Celestial. Você saberá o momento certo. — A rainha espiou por uma abertura na parede. — Você tem pouco tempo. Agora, vá!
Luna saiu da câmara por uma passagem segura, que a levou para o jardim. Ocultando-se nos arbustos, ela avistou fumaça erguer-se de uma torre. A direção indicava o quarto da rainha. Guardas corriam, gritando "fogo".
*****
Na câmara, Caelis assistia tudo com um olhar sereno. Uma figura humana surgiu ao lado dela, carregando uma estranha arma na cintura.
— Atear fogo no quarto da realeza pareceu apelação — murmurou a mesma voz de antes.
— Nada mais aqui importa! — disse a rainha.
A figura masculina espiou o lado de fora, os olhos seguindo Luna que já estava longe.
— Ela está agindo conforme nosso plano. — O homem parecia aborrecido.
— Ela é a luz que salvará este mundo dos atos cruéis do rei Solis — sussurrou a monarca.
— Me pergunto o que sobrará de Luna, quando tudo isso acabar?
— Está arrependido? — questionou a rainha.
— Como você disse, Luna é a luz agora. Mas depois, ela será apenas escuridão — respondeu o outro. — O que vamos fazer a ela é mais cruel que a morte.
A rainha segurou entre os dedos um pesado objeto feito de cobre. Ela disse:
— Você sempre soube o preço que pagaríamos, meu amigo. Meus pecados são seus pecados.
— E se ela não se tornar o que queremos? E se depois de tudo isso, ela revelar a verdade ao mundo? — disse o homem misterioso.
— Será escolha dela! Nesse momento precisamos apenas garantir que ela chegue até lá.
— Então o que devo fazer, agora? — questionou a voz enigmática.
— Roube a Capsula real. Deixe tudo preparado para amanhã!
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Fruto Podre
FantastikColhendo os frutos de ser a Salvadora do Rei, Luna precisará adaptar-se ao estilo de vida de uma raça diferente da sua. Agraciada com riquezas, festas e regalias, a garota percebe rupturas na cidade que a acolheu como heroína. Aqui e ali, aconteci...