Capítulo 3

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Reafirmei minha convicção de homem solteiro numa conversa com o pessoal do serviço. Era o último dia de trabalho do Helião porque ele tinha conseguido um emprego melhor, num frigorífico que fornecia pro mercado. A gente baixou as portas as oito em ponto, coisa rara, e ficou sentado na calçada. Os mais velhos bebiam cerveja. O Beto tinha ido pra lá encontrar com a gente e nós dois, os únicos menores de idade, tivemos que nos contentar com energéticos.

O filho do dono do mercado, o Denis, estava lá também. Ele trabalhava no administrativo da nossa filial e estava no último ano da faculdade. Não nego que invejava a vida feita do cara, ele era um dos herdeiros da rede de supermercado que mais crescia na região.

Do outro lado da rua, uma moça com um vestido de festa e um penteado elaborado saiu apressada do salão de cabeleireiro. Era a Isabela Ferraz, filha de uma política qualquer. Ela estava morando fora do Brasil e tinha vindo passar uns dias com a família, escutei alguém comentar. Linda, não nego, ela cumprimentou o Denis de longe, entrou numa SUV e foi embora. Um silêncio de uns três segundos foi quebrado pelo suspiro dele:

— Eu ainda vou casar com essa mina.

— Mas você tá muito bêbado mesmo. — Um dos caras arremessou um lacre da latinha de cerveja nele e risadas e pescotapas ocuparam os minutos seguintes.

Mas o Denis insistiu:

— Vocês não sabem de nada. O que tá escrito é nosso.

Minha inveja quase se tornou dó. Todos os caras que eu conhecia estavam encanados em alguém, parecia uma doença a que só eu era imune.

— Um brinde a filosofia de boteco... — brinquei.

E o Denis, que era de boa demais pra ficar bravo com o comentário, bateu com a latinha dele na minha, concordando.

— Pelo menos ele paga pau pra uma mina que tá no alcance dele — o Beto me zoou. — E você que acha que tem chance com a professora Laninha?

— E você que acha que tem chance com a Camila? — retruquei.

— Mas ainda isso? — Helião deu risada.

Eu até ía mandar um "E você que não tem coragem de chegar na Lorena?" só pra ver a reação dele, mas fui interrompido pelo comentário de um dos caras mais velhos.

— Vou dar um conselho que eu queria ter recebido quando tinha a idade de vocês: Vocês são muito jovens pra se prender. Aproveitem a juventude. Não namorem não, não casem cedo. Vão viver primeiro.

O cara era casado e tinha três filhos, vale ressaltar.

Dei uma risadinha, totalmente de acordo, e ele continuou a falar:

— Melhor coisa pra desencanar, Betinho, — meu amigo olhou meio irritado pro cara chamando ele assim — vai beijar, vai comer alguém pra esquecer essa menina aí. Rapidinho resolve.

O Beto fingiu concordar, balançando a cabeça, e mudamos de assunto pra falar sobre o preço do carro da Isabela.

No mês seguinte, a gente conheceu a Val.

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Outras vozes de Viradela - by MiguelOnde histórias criam vida. Descubra agora