oito.

10.2K 1.1K 1.3K
                                    


Estou congelando.

Não é algo metafórico. É puramente físico. Estou deitada numa pista de gelo congelando em silêncio. A letargia domina meu corpo, fazendo o livro suspenso acima da minha cabeça despencar aberto sobre o meu rosto. Meus braços batem no gelo com força. Não sinto a dor do impacto nos meus ossos. Meu corpo está entrando em processo de hibernação.

― Olivia?

A voz de Seth parece estar vindo da superfície. Está longe como se eu estivesse submergida no mar da Antártida. Sinto seus dedos ao redor do meu pulso. É a coisa mais quente que experimento em minutos e faz com que meus olhos se abram.

Seth me puxa para cima, jogando A Garota No Trem para longe do meu rosto. É quase uma ofensa vê-lo deslizar no gelo. É o livro mais novo que achei no meio daquela pilha que Carson deixou. E não sou a garota da literatura, o que é um milagre eu estar lendo algo que a escola não esteja obrigando. O que significa que achei o livro interessante. Mas não tenho forças para protestar. Sinto meu corpo tremer por completo quando ele faz com que eu me sente.

― Você não pode dormir. ― Seth aperta meu pulso e levanta a minha mão. Ergo as sobrancelhas. ― Seus batimentos estão muito lentos. E seus lábios estão arroxeados. E as pontas dos seus dedos estão cinzas. Vamos jogar hóquei agora.

― O que? ― Eu acho que minha mente está me enganando, então começo a rir. ― Você pirou?

Seth me ignora, esticando a mão para o bolso frontal de sua calça. Um segundo depois há um pequeno frasco em sua mão. Parece um cantil de prata que ele aproxima dos meus lábios. Seguro o pulso dele.

― Beba isso.

― Você vai me drogar?

― Merda, Olivia. Estou tentando evitar que você tenha uma hipotermia. É só Cointreau. ― Estreito os olhos, apertando os lábios. ― Licor, Olivia. Licor francês, porra. Pare de ser tão difícil!

As notas aromatizadas de açúcar a laranja dançam no meu olfato. Afrouxo meus dedos no pulso de Seth e entreabro os lábios. Ele encaixa a borda do cantil e despeja todo o licor na minha boca. Tem gosto de sol e verão. Fecho os olhos por um momento e posso me imaginar na California, estudando em Stanford, tomando um suco tropical no meu dormitório enquanto leio sobre a termodinâmica.

― Obrigada. ― Suspiro.

― Uau, será esse o efeito do Cointreau nas garotas mau educadas?

― Ah, cala a boca.

O licor de laranja é como um combustível, aquecendo todas as extremidades do meu corpo. Seth guarda o cantil em silêncio. Não quero parecer intrometida, mas estou me coçando internamente para saber por que ele fica se embebedando por aí. Só isso justifica alguém carregar álcool, mesmo que fraco, escondido no bolso do jeans. No entanto, decido não perguntar. É tarde demais quando ele captura o meu olhar curioso.

― Vamos jogar. ― Ele insiste. ― Não pode ficar parada congelando. Tem que produzir calor. Energia cinética.

― Transformando-se em energia elétrica.

― É, tanto faz.

Seth está coberto de razão. Preciso me lembrar de nunca dizer isso em voz alta. Mas com a confusão de estar presa com ele na gaiola de gelo do time de hóquei, me esqueci completamente das principais regras de funcionamento de um organismo no frio: mantenha o seu corpo em movimento e, consequentemente, você irá gerar calor.

Regras Mais Selvagens |1|  ✓Onde histórias criam vida. Descubra agora