Anjo

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Olá, olá cerejinhas! Capítulo novo.
Há algo me incomodando...
Gostaria de deixar claro que essa história não tem o intuito de ofender, criticar e/ou debochar de quem sofre com transtornos depressivos ou problemas familiares.
Valentina apenas começa sua história reconhecendo que era um tipo de pessoa que sentia muita piedade de si mesma, que afastava as pessoas porque se achava melhor e que usava seus problemas em casa como desculpa para ser tratada de forma diferente.
Espero não ofender ninguém.
Aproveitem ⏳

Alastor surgiu como um pilar no meio do meu palácio de medo e solidão. Foi ele quem me motivou a continuar cantando e a escrever minhas próprias canções. Esse garoto ganhou força, me livrou das tentativas de suicídio e me inspirou quando precisei.

† Segundo Flashback - Anjo †

Alastor tinha a pele quente. Ou talvez fosse apenas eu que me sentisse quente quando estava ao lado dele, protegida de qualquer mal que pudessem me fazer.

Já haviam se passado cinco meses desde que Alastor apareceu pela primeira vez, desde então passei a imaginá-lo como um amigo.

Não tinha amigos nessa época da minha vida, estava muito ocupada me sentindo rejeitada, afastando as pessoas que tentavam se aproximar.
Ninguém quer sentar perto de alguém que vive se afogando em sua autopiedade. Sempre lamentando o quão ruim é a vida, culpando todos a volta por não se importarem.

Eu queria que todos se importassem, sendo que eu nunca me importei com ninguém.

Quando eu começava a me sentir mal com a rejeição das pessoas meu psicológico criava uma forma de defesa, meu ego. Ele se enchia como um balão, cheio de ressentimento e inseguranças.

De repente eu me sentia melhor que todos, julgando aqueles que não se importavam como seres humanos horríveis, que não viam o quanto eu estava sofrendo.

Quais eram meus problemas? Meu pai que trabalhava de mais? Minha mãe que se importava mais com futilidades do que comigo? Minha vida social arruinada por um comportamento de afastamento que eu mesma causei?

Eu era apenas uma pré-adolescente revoltada com a sociedade, sociedade que não via o quão incrível e diferente eu era.

Todos se acham diferentes nessa idade, dizendo que não seguem regras e que pensam por si mesmo. Tudo bobagem.

No fundo tudo o que eu queria era atenção, dos meus pais e dos meus colegas. Queria que ficassem vinte e quatro horas me glorificando, dizendo o quão forte eu era por aguentar essa vida tããão difícil.

Alastor foi o grande responsável por fortalecer meu ego e me afundar.

Coitadinha de mim, oh Deus por que tão cruel?

Deixei que mais uma música do Coldplay preenchesse minha cabeça e me levasse para um novo mundo, um mundo onde eu não me sentisse culpada por brigar com meus pais e onde meus vizinhos parassem de tocar o maldito funk em plena quinta-feira.

Odiava brigar com meus pais, porque me sentia culpada e então Alastor aparecia me convencendo do contrário, e mais uma vez eu não via que a grande errada da situação era eu mesma.

Fechei meus olhos o mais forte que pude, apertando os travesseiro em meus braços e deixando meu corpo de afundar entre meus lençóis felpudos.

Dois segundos depois e eu já estava no meu jardim encantado. Um local onde eu era a soberana e ninguém nunca poderia me fazer mal.

Ao longe vi Alastor surgir, com seu
sorriso brincalhão e um lírio na mão. Quando chegou perto o suficiente para me tocar ele tomou minha mão para si e colocou a delicada flor atrás da minha orelha.

- O que aconteceu? - perguntou assim que vislumbrou meu sorriso fraco e olhos vermelhos.

- Meu pais - disse e ele já sabia o que fazer.

Me guiou para o pequeno lago que imaginei perto dali, me envolveu em seus braços e disse as palavras mágicas:

- Vai ficar tudo bem.

Isso era tudo que precisava ouvir.

Mas ninguém nunca dizia. As pessoas simplesmente não faziam ideia do que eu estava passando.

- O que seus pais fizeram dessa vez? - porque era sempre eles que faziam algo errado.

Olhei para o lago por um tempo, deixando que a batida da nova música que se iniciava me envolvesse, enquanto tentava ignorar o som das músicas vulgares do vizinho fora de minha fantasia.

- Mamãe disse que eu mudei, que ando desrespeitando ela e respondendo mal ao meu pai.

- Você está?

- Mas é claro que não, eu apenas estou tratando eles como eles me tratam. Não é como se eles se importassem - ai está minha fabulosa defesa.

Eu realmente acreditava que meu pai não merecia meu respeito porque ele já chegava tarde do trabalho e nunca fazia questão de passar um tempo comigo. Mas então, quando ele estava de folga, eu, fazendo pirraça, fugia de casa e nem o olhava na cara. As coisas tinha que ser sempre do meu jeito.

E achava que minha mãe merecia ser tratada com indiferença porque estava sempre se preocupando com tudo, menos comigo. Mas quando ela me chamava para conversar e ficar ao lado dela eu me afastava e questionava a criação que ela estava me dando, se ela queria que eu acabasse como meu irmão.

Demorei para descobrir que meus pais não eram o vilões e que eu nunca fui a mocinha.

- Não se preocupe Tina, um dia você vai ser muito famosa e todos vão parar para ouvir sua voz - Alastor era o único que sabia do meu sonho de ser cantora, nunca tive coragem de compartilhá-lo com ninguém, porque sempre me pareceu algo impossível.
- Quando esse dia chegar o mundo vai parar para te ver cantar, para ouvir essa voz de anjo que só você tem, e ninguém nunca mais vai te julgar ou te criticar.

Eu tinha esses pensamentos também, achava que se fosse muito rica e famosa meus pais iriam se orgulhar de mim e eu teria muitos amigos. Todos aqueles que me rejeitaram e me subestimaram veriam com seus próprios olhos que estavam enganados, então ele viriam correndo para se desculpar e implorar minha amizade.

Belos pensamentos, eu do passado.

O que Alastor não me dizia é que nem todas as pessoas podem ser compradas e que não importa qual fosse meu status social eu não era melhor do que ninguém.

- Você que é um anjo - disse encarando seus olhos. -, obrigada por sempre saber o que dizer.

- Eu sempre vou está aqui para você.

E isso era tudo que eu queria ouvir, o suficiente para me fazer ser ainda mais rebelde com meus pais e afastar ainda mais pessoas de mim, o suficiente para acreditar que era alguém diferente, um floquinho de neve único e especial. Mas como diria um certo livro: Isso é narcisismo puro e simples.*

Eu sempre me sentia como uma estrelinha apagada, mas Alastor vinha e me lembrava de que um dia eu poderia ser um cometa. Que a doce florzinha poderia crescer e fazer todos pagarem por suas crueldades, perfurando seus corações e egos com espinhos.

Me sentia como a garota injustiçada, ignorada e subestimada. Todos os dias pensava em formas de me destacar, de provar o meu valor e de poder brilhar.

Eu não era boa, não era a certa. Infelizmente eu também demorei muito para notar que Alastor poderia ser tudo, menos um anjo.


E foi isso! Espero que tenham gostado.
Obrigada por lerem, sintam-se livres para deixarem suas críticas e opiniões.

*A frase "Isso é narcisismo puro e simples." foi tirada do livro A Sutil Arte de Ligar o Foda-se, do Mark Manson.

Beijinhos caramelados ⌛

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