Pílulas Verdes

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  Olá, olá, cerejinhas! Enfim chegamos ao último capítulo.
Inicialmente o nome seria "Pílulas Azuis" mas minha mãe disse que as pessoas pensariam em viagra. Então fui buscar informações até minha tia, a pessoa mais informada que conheço. Infelizmente ela também não soube me dizer a cor desses medicamentos (possivelmente brancos) rimos muito e ela mandou eu ir dormir porque eram duas fucking horas da manhã.
Aproveitem ⏳


   Estamos em uma roda de conversa. Todos sentados em um círculo no meio da grama verde, sob o sol que pinta de amarelo meu semblante incolor. Delinquentes, ladrões, drogados, alcoólatras, suicidas, esquizofrênicos, psicopatas. Dos mais leves aos mais sinistros, todo maluco vem parar aqui.

  "Aqui" eu não sei onde é. Meus pais me deixam de manhã e veem me pegar no entardecer. O dia passa rápido demais e a noite é arrastada pelo tic-taquear do relógio.

  Eu poderia agir de forma normal, dizer que não vejo mais Alastor e que as terapias estão ajudando. Mas isso seria mentira.

  Alastor continua comigo, não importa onde ou com quem eu esteja. Ele também não parece mais o mesmo, não fala, não ouve e não interage com nada. É como um corpo com a consciência desligada, fazendo funções no automático.

  Tenho medo de ficar sozinha e ele voltar a falar. Tentei avisar aos outros sobre Alastor, mas todos as vezes as pessoas me ignoram e enfiam um monte desses comprimidos esverdeados na minha boca.

De tanto gritar e ninguém me escutar, parei de falar. E como eu não falo e não tenho reação a mais nada, as pessoas que cuidam de mim não possuem mais certeza se estou liberta da minha loucura.

  Definiram-me esquizofrênica. Não pode ser curada, mas controlada. O pastor ainda insiste no sobrenatural e a tia Eliza na mediunidade.

  Sinto falta de cantar, saudades das piadas do meu pai e vontade de contar ao mundo o que vejo as enfermeiras fazendo com outros pacientes. Talvez um dia eu sinta vontade de recomeçar, mesmo com a sombra de Alastor me perseguindo pelos cantos.

  Rodas de conversas. Artesanato. Canto e dança. Escrita criativa. São algumas ativadas propostas para incentivar a interação e exposição do nosso interior. Eu me sinto sem cor, completamente vazia de sentimentos, tão diferente da garota cheia de paixão que fui um dia.

Alastor me esvaziou e eu não sinto vontade de voltar ao que já fui um dia. Não agora.

  Os finais de semana são os piores. Eu tenho que ficar trancada no quarto, encarando as paredes lilases e ignorando as tantas outras coisas que vejo com o canto dos olhos. Barulhos estranhos, sussurros que me chamam para escuridão.

  Tenho tantos arrependimentos e tanto medo de enfrentar meus problemas, que me prendo as poucas lembranças boas e imagino muitos futuros alegres. Esqueço-me do presente e me apego a euforia provocada pelas pílulas verdinhas que me dão todo noite e toda manhã.

  Desisto da minha vida e me tranco na minha mente caótica, cheia de devaneios em um mundo solitário, porque se Alastor me ensinou alguma coisa, é que nunca devemos confiar naquilo que imaginamos, por isso estou sempre sozinha.

  A solidão é tentadora quando se está sempre sendo observada, mas sabia que precisava acordar.

"Eu moro em um palácio de sonhos
Mas minhas paredes estão rachadas
Meus súditos indo embora
E as pinturas todas manchadas

Preciso escapar desse castelo de ilusões
Meus vestidos foram comidos por traças
A coroa de papel está molhada              Desisto dessa vida, quero acabar com essas desgraças

O príncipe quebrou meu coração
Minha família sugou toda minha energias
Os amigos roubaram meus sonhos
E agora estou sozinha entre essas paredes de fantasia

Preciso desistir desse castelo vazio
Desse título que me é motivo de piada
Desistir dessas pessoas de açúcar
Fugir dessa utopia montada"

  Escrevi para, caso algum dia eu acorde com vontade de ser alguém normal; caso um dia eu possa mandar Alastor e toda essa merda embora; caso um dia eu encontre motivos para voltar a viver.

  Não tenho certeza de nada no momento. Nem mesmo se Alastor realmente existe, se ele é uma ilusão, um pesadelo ou uma maldição mandada pelo meu irmão.

  Mas ainda acredito que não sou louca, porque toda vez que meu garoto dos olhos negros e sorriso brilhante se deita comigo, eu ainda posso sentir o cheiro de seu café adocicado e de suas balas mentoladas.



É isso. Acabou!
Estou tão feliz por poder terminar. Eu estive pensando no que escreveria aqui.
  Acho que primeiro irei falar a respeito do final. Eu já sabia que terminaria assim, mas não posso evitar em pensar que decepcionei àqueles que esperavam por algo feliz. A verdade é que Valentina e Alastor jamais poderiam ficar juntos.
  Existe uma grande mágoa dentro de mim por não poder escrever um final com a versão do Alastor, principalmente porque sou uma romântica incorrigível. Acontece quê, se eu o escrevesse estaria adimitindo a verdadeira natureza de Alastor, e isso é algo que desde o começo busco deixar a critério do leitor, Alastor existe ou Marlon e Valentina não passam de duas pessoas com distúrbios mentais?
  O nome Amência vem do sinônimo de loucura, alguém cujo as faculdades mentais não estão em pleno funcionamento. Alastor, por outro lado, é um daemon da mitologia grega, filho de Nix, a deusa da noite, considerado por ser um vingador daqueles que derramam sangue familiar. Sintam-se livres para interpretarem.
  Se uma coisa posso garantir, é que Valetina não ficará para sempre nessa vida. A resposta ela mesma diz no início do capítulo 8:
"O grande problema dos filmes é que eles acabam no final feliz, a vida não, o único final que temos é a morte. Minha história não terminou quando consegui um namorado e amigos; não terminou quando me mudei; não terminou quando eliminei Alastor; e não vai terminar quando eu encerrar o último parágrafo."

  Agora, sobre a escrita.
  Em Amência tento trazer alguma coisa do pouco conhecimento que possuo sobre escrita, psicologia e ocultismo. Talvez nem todos os temas tenham sido abordados com precisão, mas saibam que cada palavra foi escrita com muito amor e eu fiz o possível para disponibilizar boas analogias, parágrafos impactantes e, principalmente, informações verídicas. Espero que tenham aprendido algo, da mesma forma que aprendi bastante com vocês, leitores ativos e fantasmas.
  Muito obrigada a todos aqueles que comentaram, me motivaram e argumentaram a respeito. Obrigada por terem visto algo em Amência, na Valetina e na minha escrita.
  Beijinhos caramelados e continuem acompanhando ⌛

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