Capítulo 8

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No dia seguinte, Lorenzo acordou cedo. Seu pescoço estava doendo, assim como sua coluna, e sua tosse não estava totalmente curada. Ele não era acostumado à falta de conforto, mas, dadas as circunstâncias, não podia reclamar. A estadia no albergue estava sendo melhor do que imaginava.

Sem falar com ninguém, ele caminhou até o ponto de ônibus e seguiu até o centro. De lá, tomou um ônibus para o bairro industrial e caminhou até um velho galpão abandonado. Um homem o esperava no portão fechado com correntes e cadeados. Usando óculos e luvas, Lorenzo entregou ao homem um maço de dinheiro. Ele conferiu discretamente e indicou uma porta lateral. Seguiu na frente e Lorenzo o acompanhou.

O galpão era uma velha gráfica paralisada. Falido, o dono aceitou fazer um trabalho de última hora para um jovem de sotaque estrangeiro, e cobrou caro por isso. "Um desses sonhadores", pensava o homem enquanto colocava o maquinário para funcionar. No dia em que o pedido foi encomendado, o jovem levou também uma bateria, já que a eletricidade estava racionada. "Já, já vão dar um jeito nele. É sempre assim".

— Quanto tempo até o trabalho ficar pronto? — perguntou Lorenzo, forçando ainda mais seu sotaque estrangeiro. Ele sabia que isso causava simpatia em certas pessoas.

— Amanhã cedo, acredito. Você garante que assume todos os riscos? Esse texto aqui, acho que tem gente que não vai gostar. Quem vai vir buscar?

— Um ou dois amigos. Deixe as caixas preparadas.

O negócio foi acertado e Lorenzo foi embora. Quando retornou ao albergue, Dona o chamou em um canto. Estava eufórica, mas procurava disfarçar.

— Até que enfim você apareceu! Estou doida para te dar essa notícia. É muito inesperada.

— Tá, mas cuidado com meu braço. O que aconteceu?

— Recebemos uma doação. Gigante! Muito dinheiro. Um tal de Clayton. Você já ouviu falar?

— Eu não! Mas pra quê doação?

— Para a nossa campanha. E ganhamos panfletos. Panfletos, você ouviu? Há quanto tempo você não ouve falar em panfleto? Isso vai bombar no nosso ato na ponte.

— Que ponte?

— Para de fingir que não ouviu nada, Lorenzo. Dia 30, agora, nós convocamos um ato pacífico na ponte. Vamos lançar oficialmente nossa campanha e mostrar o tamanho do apoio que conseguimos. Isso vai chocar o pessoal. Escolhemos a ponte por causa da visibilidade. Eles não são doidos de nos atacar na ponte, na frente de todo mundo, se a gente estiver só caminhando. Vai ser um grande dia!

— Não sei não. E como estão em campanha se o nome do representante ainda nem foi escolhido? Vocês precisam chegar num acordo.

— Então... aí é que entra um negócio chato. Essa pessoa, que ninguém sabe quem é, mandou excluir um dos pré-candidatos. Quem ficou foi o cara dos supermercados. Ele é mais conhecido, mais simpático, mais chamativo. Enfim, ou a gente acatava a sugestão, ou ficava sem o dinheiro. Foi tenso, mas todo mundo acabou cedendo. A gente queria resolver isso no diálogo, mas o dinheiro acabou decidindo por nós.

— Diálogo... — Lorenzo sorriu olhando suas unhas perfeitamente quadradas. — Essa gente inventa casa coisa...

Quando Alison saiu do banho, Lorenzo estava esperando-o perto do banheiro. O acompanhou sob os olhares de algumas pessoas.

— Eu poderia ter cuidado do chuveiro, se você quisesse.

— Obrigado — disse Alison, se sentando para pôr os sapatos. — Hoje está calor e eu vim mais cedo. Não quero abusar da sua engenharia.

O rei está morto (DEGUSTAÇÃO)Onde histórias criam vida. Descubra agora