A Ruptura

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Carol despertou às 7 da manhã, como de costume. Esfregou os olhos verdes e pequenos com as palmas das mãos, deu um suspiro e levantou-se para tomar o café da manhã. Das refeições do dia, esta era a mais completa. Não porque ela se importasse com as instruções de nutricionistas e magos das dietas. Mas porque era a mais fácil: cereal com leite, pão de forma com queijo e suco.

Levou o copo de suco até os seus lábios também pequenos e o sugou em pequenos goles. Sintonizou o rádio em sua estação predileta, no volume mais alto que uma manhã de trabalho pudesse suportar, colocou a louça na máquina de lavar e foi tomar o seu banho, tudo conforme a sua rotina de trabalho nos últimos dez anos.

Mas as coincidências pararam ali. Este dia seria único em sua vida. Sentia-se diferente, renovada. Uma áurea de inspiração e coragem tomou conta de seu espírito, preparando-a para o próximo passo em sua vida.

Chegou na agência e foi direto para a mesa de Arthur. Raquel estava lá.

- Carol, que bom que você chegou! Raquel já estava aqui me mostrando ideias bem interessantes para mostrarmos à Sassy. Você trouxe alguma coisa?

- Trouxe sim, Arthur, a minha demissão – ela colocou o papel em sua mesa. - Por favor entenda que não é nada pessoal, mas devido às recentes mudanças percebi que o meu perfil não se encaixa no estilo MacNamara. Prefiro que vocês comecem do zero com alguém comprometido.

Arthur e Raquel, que tinha sempre uma postura enfastiada, ficaram perplexos.

- Espere aí, você não pode fazer isso comigo, com a agência – ele apelou para o lado emocional. – Temos um trabalho a entregar, onde está o seu profissionalismo?

- A agência contou com o meu profissionalismo nos últimos dez anos, até ontem. Hoje, com a minha demissão não devo nada à agência, Arthur. Repito, não me leve a mal, não é nada pessoal. Tivemos as nossas desavenças, mas respeito o seu trabalho. "Só acho que você não tem competência para o cargo que ocupa agora"- pensou e continuou:

– Fico honrada por ter participado da história da empresa, porém a decisão está tomada. Com isso, entendo que não há mais nada a fazer por aqui, certo? – deu um sorriso já de despedida estendendo a mão para o chefe.

- Se você está pensando que eu vou implorar para você ficar, está enganada – Arthur tinha um tom sério na voz, além de estar bastante decepcionado. – Estava contando com você para botarmos para quebrar, nocautear todos os nossos concorrentes e ganharmos o cinturão da vitória! – disse tentando dar algum estímulo referenciando o boxe, do qual era fã.

- Aí é que está Arthur. Eu não quero nocautear ninguém e muito menos ganhar cinturão, mesmo porque eu odeio boxe! Cada um tem o seu espaço na medida em que trabalha com integridade e paixão, sem roubar ideia dos outros, sem atropelar.

- Nossa, você mudou – lamentou o chefe.

- Mudei? Não sei... só sei que estou me sentindo fabulosa e num momento de felicidade extrema – lembrou de Arusi e seu conceito sobre felicidade.

Depois daquela conversa, não restava mais nada aos presentes na sala além de se despedirem.

- Você já sabe o que vai fazer? Vai para algum concorrente? – Perguntou Arthur.

- Sim, vou te nocautear! – ela provocou e depois consertou. – Brincadeira, vou para a Namíbia.

Art encarou-a com espanto:

- Preferia que você fosse para um concorrente. Mas sendo assim, te desejo boa sorte – continuou sem entusiasmo.

- Boa sorte – desejou Raquel com um tchauzinho sem graça.

Assim, Carol deu início a uma nova etapa na vida. Sem certeza de nada, mas com um instinto de que tudo ficaria bem e isso bastava para que seguisse um novo caminho. Embora muito impulsiva tinha a capacidade de ser bastante racional sobre as decisões relacionadas à sua carreira. Isso lhe proporcionou uma trajetória estável e bem-sucedida.

Mas depois daquela visita em um país tão visceral, conhecendo pessoas tão diferentes de seu universo, percebeu que o mundo era infinitamente maior do que a sua pífia racionalidade profissional. A viagem a tornou mais despretensiosa, menos egocêntrica e proporcionou uma visão global das coisas.

Angalia com suas história interessantes, Numa com sua segurança inabalável, Meke com sua austeridade que aos poucos se transformou em doçura, além de Arusi que demonstrou um conhecimento sobre a vida que não se aprende em livros, eram exemplos de pessoas muito diferentes do ambiente que costumava frequentar.

Começou a se perguntar qual a razão de tamanha agressividade em suas atitudes se à noite poderia ter um cobertor de estrelas ao seu redor e num entardecer poderia apreciar uma linda família de elefantes preocupada com o seu caçula, como se fosse a sua própria família preocupada com ela?

New York era o seu lar, indiscutível. Mas ela poderia trazer um pouco do que aprendeu na Namíbia para o seu ambiente e por que não levar também um pouco de New York para a Namíbia?

Pretendia propor a abertura da empresa de cosméticos para Meke com a eficiência de gestão que aprendeu nos últimos anos de trabalho na agência, com a tecnologia de levar as maravilhas de seus produtos ao conhecimento das pessoas ao redor do mundo, com a oportunidade democrática de trabalho às pessoas que buscam emprego naquela metrópole e, por que não dizer, na própria Namíbia?

Carol precisava explicar pessoalmente os seus planos para os irmãos Meke e Arusi. Comprou a sua passagem para o próximo voo disponível.


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