— Foi mais que um encontro de corpos, Lu. Foi um encontro de almas. Sinto que nos conectamos para sempre. — Contei com um sorriso enorme no rosto e ela apoiou nos cotovelos para me olhar de cima da maca.
— Você é uma romântica incurável mesmo! — Disse sorrindo também. — Vai, conta mais! Quero detalhes.
— Ele foi tão gentil! Tão doce! Eu nunca imaginei que um homem pudesse ser assim de verdade. Porque nos meus livros eu costumo escrever verdadeiros príncipes encantados, mas sempre soube que era apenas imaginação. Ou pelo menos achei que fosse.
— Vocês são muito fofos juntos! — Suspirou encantada.
— Eu acho que... — Comecei a falar e de repente senti um enjôo revirar meu estômago. Cobri minha boca com a mão e Luana sentou rapidamente na maca esticando o braço para pegar o recipiente. — Não precisa. Já passou.
— Certeza? — Questionou e eu respirei fundo tentando controlar a minha ânsia. Levantei para ir no banheiro, mas a vontade veio voraz.
Peguei o recipiente de suas mãos e vomitei. Luana tentou me amparar, mas não conseguiu.
— Meu Deus, Juliana! Você vomitou sangue! — Ela gritou e eu senti meu corpo fraco.
Caí sem forças na poltrona e respirei vagarosamente. Notei Luana pular da maca e se enroscar nos fios de oxigênio.
— Vou chamar o Bernardo...
— Não. Espera!
— Não tem o que esperar. Você sabe que isso não é bom sinal. — Minha amiga falou preocupada e eu segurei as mãos dela.
— Eu estou bem. Nos últimos exames não deram grandes alterações. Isso não deve ser nada demais. Talvez alguma nova lesão...
— Lesão que deve ser tratada. Você mais do que ninguém sabe disso. Você estudou o câncer antes de viver ele. — Ela rebateu indignada e eu suspirei sentindo as minhas lágrimas molharem meu rosto.
— Exatamente por saber das coisas que eu tenho medo. Vou deixar meu celular com você. Peça o Leo para ligar para os meus pais?
— Ele? Mas... Não era melhor você ligar?
— Eu não sei se terei tempo. — Respondi com a voz embargada e ela arregalou os olhos.
— Não. Não faz isso comigo. Por favor! — Pediu me abraçando. — Não me deixe também.
Ela se afastou aos prantos e virou imediatamente para trás apertando o botão do código azul.
Rapidamente enfermeiros vieram para o quarto. Minha ânsia aumentou e o sangue deslizou dos meus lábios como se estivesse fugindo de mim.
Vi Bernardo entrar no quarto em disparada. Ele me olhou alarmado, pegou na minha mão e segurou firme.
Era o elo que me mantinha consciente.
Ouvi os gritos apavorados de Luana e rapidamente me levaram para a sala de exames. Após passar pela ressonância magnética e tomografia computadorizada Bernardo reapareceu e colocou os exames contra o quadro de luz. Vi claramente meus órgãos com várias manchas.
Senti meus olhos marejados. Rapidamente doutor Otávio e doutora Letícia entraram no quarto também. Todos começaram a conversar em cochichos enquanto olhavam para os resultados. Meu coração diminuiu no peito ao notar Bernardo cada vez mais alterado.
— Não pode ser. — Ele murmurou com lágrimas nos olhos e os dois outros médicos se entreolharam. — Não pode ser! — Gritou me assustando.
— Vamos conversar lá fora! — Doutora Letícia sugeriu nervosa.
— Não. Conversem aqui! Eu quero saber o que eu tenho.
Bernardo me olhou arrasado e não precisou dizer uma palavra sequer. Eu sabia que era grave.
— Infelizmente, Juliana... — Doutor Otávio começou a dizer e eu sentei na maca.
— Acabou? — Perguntei e os três me olharam alarmados. — Meu tempo acabou, é isso?
— Não, claro que não. — Bernardo se apressou em dizer vindo até mim, porém os outros dois médicos apenas me lançaram olhares piedosos.
— Não mente para mim, por favor! — Implorei e ele segurou as minhas mãos e me olhou nos olhos. Senti toda sua dor emanar para mim.
— Bernardo, posso falar com você um instante em particular? — Doutora Letícia pediu e Bernardo sequer se moveu do lugar.
Ela se aproximou e tocou no braço dele parecendo o tirar de um torpor. Os dois então saíram deixando um silêncio enlouquecedor para trás.
Pisquei nervosa e doutor Otávio me olhou serenamente.
— Juliana, lembra quando você chegou aqui? Lembra de tudo que te dissemos? — Ele perguntou e eu assenti chorando copiosamente. — E do que lembra?
— De... ter sido diagnosticada com um câncer em estágio avançado. — Murmurei e ele concordou com a cabeça e cruzou os braços.
— Tudo o que fizemos, todas as escolhas de tratamentos, tudo foi a fim de lhe proporcionar um maior bem estar.
— Estou ciente disso. — Falei secando minhas lágrimas e ele se aproximou mais e estendeu a mão para mim. Peguei na mão dele e pela primeira vez ele me olhou como se eu não fosse uma paciente. Senti verdade em seu olhar.
— Você é muito forte por ter chegado até aqui. Muitos em seu lugar não aguentaria as cirurgias, os tratamentos pesados e frequentes.
— É... o... fim? — Perguntei aflita e ele apertou a minha mão.
— Não se você acreditar em milagres. Vamos continuar atacando esse maldito câncer com força total. Não nos daremos por vencido jamais. Está conosco nessa batalha?
— Si-sim. — Gaguejei arrasada.
— Você é mais forte do que imagina. — Ele disse soltando a minha mão e minhas lágrimas caíram como uma cachoeira interminável. — Lembre-se disso.
— Eu vou lembrar. — Prometi tão baixo que provavelmente ele sequer ouviu o que eu disse.
Bernardo entrou novamente pela porta. Os olhos estavam vermelhos e inchados. A respiração dele estava irregular, visivelmente fora de si.
Apertei meus lábios quando ele me abraçou apertado. Doutor Otávio olhou interrogativo para nós.
— Vai ficar tudo bem! Vamos incidir um feixe de raios laser direcionado através de um endoscópio. Não vai precisar de cirurgia. Podemos aliviar o sangramento. Podemos também incluir o ramucirumabe à quimioterapia. Vamos... — Começou a falar descontroladamente e eu me afastei dele. Coloquei minha mão em seu peito sentindo seus batimentos desritmados igual os meus. — Ele respirou pela boca e me olhou nos olhos.
— Não vai me deixar morrer, não é?
— Nunca. — Respondeu e eu o abracei novamente.
Fechei meus olhos me entregando de vez ao choro. Provavelmente doutor Otávio e doutora Letícia estivessem incrédulos com a cena que viam. E com certeza tudo deve ter piorado quando Bernardo se afastou um pouco de mim e me deu um selinho. Colamos nossas testas de olhos fechados. Era como se tivesse apenas nós dois ali.
— Eu não vou deixar você ir embora, minha menina. — Prometeu com a voz embargada. — Não vou deixar.
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As Últimas Flores De Setembro
RomanceJuliana foi apenas uma espectadora da própria vida. Sempre tentando dar orgulho aos pais e menosprezando os próprios desejos. Entretanto, a descoberta de uma grave doença a fará repensar toda a sua vida. Bernardo é um médico conhecido por deixar méd...