Quando disse à minha única amiga no pátio do meu colégio que talvez eu queria descobrir um jeito de dobrar o tecido do espaço-tempo, ela me chamou de louca. Falou para eu parar de falar nessas besteiras e focar em um emprego de verdade, pois estávamos no último ano de escola. Talvez ela estivesse certa.
Dez anos depois, percebi que minha juventude havia passado. Então deixei de lado essa ideia e foquei em meu doutorado de física, mas nunca consegui um emprego de verdade. Trabalho há sete anos como entregadora de lanches.
— Nunca vi uma mulher trabalhar como motoboy. — dizia minha mãe nas ceias de família.
Sinceramente, eu também não. Não era o melhor emprego do mundo, mas era muito mais agradável do que ser garçonete, em que o uniforme é uma minissaia. E o salário é suficiente para pagar a metade do aluguel da casinha que divido com meu irmão, e antigamente, sobrava um pouco para gastar em meus estudos de viagem no tempo.
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Quando cheguei em casa, já eram quase meia-noite. Meu irmão estava estirado no sofá, dormindo, enquanto a TV estava ligada. Então, eu a desliguei e joguei minha mochila em uma poltrona que acomodava uma pessoa.- Por que desligou a TV? - esbravejou meu irmão- Eu estava acordado ainda.
Revirei os olhos e disse:
- Rafael, você estava roncando!
- Não estava, não.
Empurrei suas pernas de cima do sofá e me sentei no lugar. Peguei as correspondências que estavam em cima da mesa de centro e vi uma por uma, na esperança de receber uma reposta das empresas onde eu havia feito entrevistas de emprego como secretária. Nada. Meu irmão se levantou e sentou-se ao meu lado.
— Você ainda consegue sair dessa, Raquel. - disse ele, enquanto esfregava a mão em minhas costas como forma de consolo - Só acho que você devia pensar grande.
— Pensar grande, como? — digo, colocando meu cabelo atrás da orelha.
— Me lembro da época em que você foi atrás de patrocinadores para seus estudos de viagem no tempo. — disse ele - Você sonhava e não desistia.
— Eu era maluca. — disse eu jogando as cartas na mesa e recostando no sofá — Qual era a chance?
— Não sei. Pergunta para a Raquel Schwartz do passado. — disse ele.
Sorri para ele enquanto nosso husky siberiano se aproximava para que eu pudesse acariciá-lo.
— Oi, Toby! - digo para o cachorro — Oi, garotão!
Admito que tenho saudade dessa época, em que eu persistia em que acreditava.Quando fui ao meu quarto, vi que a porta do porão estava aberta, e quando fui fechá-la, vi a mesa com os estudos que investira tanto do meu tempo e dinheiro. Uma pena, se eu não fosse louca. Pensei, fechando rapidamente a porta. Subi as escadas com o olhar fixo naquele cômodo, como se eu fosse chamada de volta para lá. Como se tudo aquilo fizesse sentido para qualquer um que seja. Nem pense nisso. Me virei para meu cachorro e o chamei para subir comigo, e ele correspondeu.
• • •
Sonhei que eu havia viajado no tempo, e que o paradoxo temporal havia matado meu irmão. Acordei, e levantei rapidamente de meu travesseiro, e me sentei na lateral da cama enquanto passava as mãos nos cabelos. Após alguns segundos, olhei para os lados, senti uma leve tontura devido à sensação de ter vivido aquele momento. Balancei a cabeça. Tomei um copo de água que estava ao lado de minha cama e deitei-me de novo. Após uns vinte e cinco minutos pensando no que sonhei, adormeci.

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dobra espacial
Ciencia FicciónQuando uma garota descobre como viajar entre dimensões temporais, através de uma máquina que pode dobrar o espaço-tempo, todo cuidado é pouco.