Como eu vim parar aqui?

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- Como eu vim parar aqui?

        Ela indaga baixo para si mesma, recebendo como resposta apenas o barulho da banda e das pessoas em sua volta. Algumas estavam suadas, bêbadas e outras até drogadas, apesar de haver policiais em todos os lados. Em Consterian, na pequena cidade, há uma tradição: no réveillon a cidade toda se reúne para a festa. A praça está cheia, ela se aproxima do palco onde a banda desconhecida se encontra. Belíssimos é a palavra boba a qual ela encontra para descrever os morenos que cantam ali. São cinco belíssimos homens, mas não tão bons cantores assim. Há uma bebida em sua mão, mas ela não sabe bem como aquela bebida chegou até ela. Rapidamente, ergue o copo de plástico para sentir o cheiro e percebe que a bebida contém álcool.  Logo, em seu campo de visão, pode visualizar um homem entregando bebidas para as pessoas, deduziu que seu copo tivesse essa origem. Toma um pequeno gole, o álcool desce queimando em sua garganta e trazendo um alívio em seu coração, como se todas as suas dores fossem queimadas juntamente com a bebida. Sente o alívio percorrer o seu corpo; por isso fecha os olhos por alguns segundos e solta um pequeno gemido baixo. Ao voltar a abrir os olhos, se depara com um homem musculoso, em sua frente, está apenas com uma bermuda fina - provavelmente perdeu a camisa-, possui algumas tatuagens no braço direito, completamente fechado.  Os olhos já cansados de Eve não conseguem discernir quais são os desenhos. Ele é de estatura média, olhos tão pretos como o carvão, bem marcados, diria que um tanto quanto sombrios e fios de cabelo tão escuros e molhados que mais parecem a noite na mais profunda e misteriosa solidão.  Everest solta a respiração levemente, o homem tem um sorriso nos lábios rosados e logo abre a boca.

       - A bela dama desacompanhada não me acompanha nessa dança?

       O espanto é notório nos olhos da loira.  Ela respira fundo, procura em sua mente as melhores palavras, parecem lhe faltar; ela apenas balança a cabeça negativamente e em silêncio se retira daquele local.  Ir embora é sua melhor opção. Enquanto caminha para longe por instinto, ela olha para trás, e em seu campo de visão o homem que a importunou está atrás dela. Ela, então, acelera os passos, mas o homem faz o mesmo e logo ele está novamente na sua frente. Ele, insistentemente, volta a falar.

        - Ei, calma! Não queria te assustar.  Apenas vi que você é nova na cidade e adoraria te conhecer.

        Finalmente, Eve deixa as palavras saírem de sua boca, um tanto quanto boçal.

      - Se eu quisesse conhecer alguém, aqui seria o último lugar no qual eu iria procurar.

      A feição do homem muda, sua fronte fica enrugada e o sorriso some de seus lábios. Então, fala:

      - Certo, Miss Simpatia, me desculpe pelo incômodo.

      Ele finalmente sai da frente da loira voltando para a festa. Everest ficou paralisada  por alguns segundos apenas observando o homem ir embora. Ele tinha uma tatuagem nas costas, também. Ela revira os olhos, levemente, repassando a situação em sua mente. 

      Já, de volta, na casa de sua vó, os pensamentos estão agitados em sua cabeça, pois tem que escrever uma história e publicá-la. Sua vida depende disso, mas escrever sobre o quê? Como escrever? As palavras compostas por tantas e tantas letras lhe faltam. Sozinha, no quarto pequeno, ela apenas senta-se na cama, frustrada com sua inutilidade, no momento. 

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