𝙲𝙰𝙿𝙸𝚃𝚄𝙻𝙾 𝙸𝙸𝙸 - 𝙻𝚄𝙲𝙸𝙻𝙻𝙴

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PAPAI GRITA com  mamãe no andar de baixo, sem nem ao menos se importar com o quanto essa  briga tola me afetaria, é noite e tudo o que almejo é poder dormir em  paz, sem ouvir a discussão deles, sem precisar ouvir a insistência de  meu pai em fris...

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PAPAI GRITA com mamãe no andar de baixo, sem nem ao menos se importar com o quanto essa briga tola me afetaria, é noite e tudo o que almejo é poder dormir em paz, sem ouvir a discussão deles, sem precisar ouvir a insistência de meu pai em frisar, cada vez mais alto, o quão inútil mamãe é. Coloco o travesseiro sobre meu rosto e grito, não alto o suficiente para que eles possam ouvir, está mais para um grito sufocado que ficou ainda mais baixo com a ajuda do travesseiro que está a tapar minha boca.

Eu sei o motivo das discussões que assolam minha família, sei que a culpa não é de minha mãe e sim minha... única e exclusivamente minha! Não deveria ter "saído do armário" assim, de repente, deveria ter melhor preparado o território ou esperado ser maior de idade, esperado até que fosse capaz de adentrar em uma universidade e ir para bem longe da Vizinhança Azul... deveria simplesmente ter esperado.

Convivi por tanto tempo com a mentira perfeita que contava a eles, não me custaria nada conviver com ela um pouco mais, não se isso fosse capaz de salvar o casamento de meus pais. Eles deveriam importar mais do que minha vontade egoísta de ser livre... certo?

As lágrimas molham meu rosto e são sugadas pelo tecido de meu travesseiro, cogito a ideia de ligar para Amy, ela me entenderia, ela sempre me entende e, muito provavelmente, isso se deva ao fato de que minha melhor amiga me conhece melhor do que eu mesma. Suprimo minha vontade de discar seu número, ela tem seus próprios problemas para lidar, não devo ser egoísta a ponto de almejar que ela me ajude a lidar com os meus; sei que ela jamais me negaria ajuda, contudo, não seria justo para com ela a fazer tomar minhas dores quando as dela são visivelmente maiores do que as minhas.

O homem, que mal reconheço, grita algo sobre não ter a obrigação de aguentar uma filha macho fêmea que jamais seria capaz de lhe dar os netos que tanto almejou. Ele berra à plenos pulmões sobre o quão errado isso é, que a igreja pediria meu sangue porque, afinal de contas, o homossexualismo é repudiado por Deus, que Deus odeia os homossexuais e que ele não poderia conviver com o ódio de seu Criador por ter posto uma escória no mundo.

São palavras duras de se ouvir, são palavras que cortam, que machucam mais do que tapas, murros, facadas ou balas de um revólver qualquer. A verdadeira arma da humanidade encontra-se em sua língua, pois esta é capaz de ferir mais do que qualquer outra coisa inventada pelos seres humanos.

Engulo o choro, tento me concentrar apenas nas boas coisas, tento deixar os gritos, protestos e palavras rudes em segundo plano..., mas apenas tento mesmo, falho miseravelmente, falho porque sou humana, falho porque sou incapaz de não me importar com a opinião de meus pais sobre mim. Sobretudo com a opinião de papai, nós sempre fomos extremamente unidos, sempre tivemos uma relação saudável, eu esperava a rejeição por parte de mamãe, todavia o destino resolveu me surpreender ao fazer com que a pessoa mais próxima a mim me rejeitasse.

Choro novamente, as lágrimas saem sem nem ao menos me pedir permissão, odeio me sentir fraca, odeio me sentir impotente e odeio ainda mais quando as pessoas que deveriam me aceitar como sou, sem julgamentos e de braços abertos são causadoras disso. Se meu próprio pai não me aceita como sou, não aceita meu verdadeiro eu, quem mais aceitará?

Apanho o celular e digito o número de Amélia, ela sempre soube desse meu segredo, ela e Lucas e eles sempre me apoiaram. Sei que não posso contar com seu irmão mais velho, afinal, ele tem muito mais demônios do que eu e ainda está aprendendo a lidar com eles; tudo o que me resta é a garota de cabelos platinados. Mas não passa disso: apenas um discar de números, pois meu cérebro me impede de concretizar a ligação, ele, meu cérebro no caso, se nega a incomodá-la.

Retiro o travesseiro de meu rosto, apenas para constatar o óbvio, as lágrimas o molharam por completo. Levo meu braço direito até minha boca e o mordo com força, o mordo até que comece a sangrar e só então, quando sinto o gosto metálico em minha boca, eu o solto; apenas para morder outra parte sua. Sei que não deveria fazer isso; sei que prometi à Amy que jamais me machucaria novamente. Eu sei, tá legal? Eu sei. Mas isso é muito mais forte do que eu. Muito mais! E mordidas são bem menos perigosas do que cortes com lâminas... são bem menos perigosas.

Cortes com lâminas... talvez eu devesse tentar, talvez isso aliviaria mais a dor de minha alma; talvez... não! Eu não posso, não posso, não posso, não posso e não vou. Não posso. Eu prometi à Amy, prometi a ela e não se quebra promessas... não se quebra promessas.

E então mamãe entra no quarto, ela me olha assustada, seus grandes olhos castanhos me examinam com atenção e ela se aproxima cautelosamente de mim; em passos cuidadosos, tal como se qualquer movimento em falso ou minimamente brusco fosse capaz de me fazer colapsar de vez. Ela se senta ao meu lado e puxa meu braço para longe de minha boca com cuidado, com muito cuidado.

— Shi, tá tudo bem querida, tudo bem. — Seus braços me envolvem em um abraço aconchegante e uma de suas mãos passa a afagar meus cabelos

Eu sei que ela mentiu, sei que não está tudo bem, sei que ela só quer me proteger, mas será que ela sabe que eu posso ouvir tudo? Será que ela sabe que eu sei que ela está a mentir? Será? E é por isso que meu corpo congela, me impossibilitando de corresponder ao abraço, é por isso que meu estômago embrulha e que as lágrimas voltam a sair. É por isso e só por isso.

Quero fugir, ir para bem longe dessa merda de vizinhança, ir para bem longe da hipocrisia de papai e das mentiras de mamãe. Eu me sinto sufocada, tal como se este lugar estivesse a sugar todo meu ar, toda minha energia vital.

Simplesmente não posso mais, não quero mais. Não quero!

Não quero.

— Não quero. — Murmuro baixinho e empurro mamãe, me levanto apressada e corro para o banheiro, me trancando nele

"Amy, me ajuda." — Mando para minha melhor amiga, sendo um milagre eu ter digitado certo, afinal, minhas mãos estão suadas e extremamente trêmulas

"Estou a caminho." — A mensagem vem instantes depois e eu me permito sorrir

" — A mensagem vem instantes depois e eu me permito sorrir

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HEY MEU POVO QUE COME PÃO COM OVO!

Qual é a boa?

Eu sei, eu sei, já havia postado uma história com este título e os mesmos personagens e sim, se trata do mesmo enredo, porém amadurecido.

Me contem o que acharam do capitulo, por obséquio.

Silêncio - Não deixe que vejamOnde histórias criam vida. Descubra agora