CAPÍTULO IX

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GUS:

Tentei me lembrar das inúmeras vezes que Will me explicou o que eu deveria fazer no caso de eu me perder, é claro que eu não prestei atenção, ele explicava de forma tão delicada e apaixonada que eu não ouvia nada que saia da boca dele, eu olhava os cílios dele tremendo com o piscar do olhos, as maçãs do rosto subindo quando ele sorria, as orelhas levemente abertas, a cor do cabelo dele no sol e na sombra, a forma como os dedos dele mostrava as trilhas no mapa. mas nunca no que ele dizia.

Engoli a onda de tristeza que ameaçou me tomar quando eu pensava nele, e continuei minha lenta subida.

Estou enxarcado, lento com o peso extra da roupa molhada, e sei que não vou conseguir ir muito mais longe com a forma que minhas pernas estão tremendo.

O sol causa um brilho que meus olhos se demoram a acostumar, nascendo no horizonte, e um som ritmado parece ecoar próximo de mim.

Tentei me concentrar em entender o som, parecem patas na neve. Não, eu tenho certeza que são patas, rápidas muito muito perto.

Meu coração deu um salto ao mesmo tempo que eu avistei o primeiro deles correndo alguns metros a frente.

São lobos.

Uma onda quente de esperança brotou em mim.

Ouvi algumas batidas de patas na neve perto de mim e me virei, era um lobo preto, ele deu uma leve inclinada na cabeça indicando que eu deveria descer.

Eu assenti, eu era um estorvo perdido e molhado e sabia disso.

E Will iria precisar de mim quando eles o achassem.

- Estarei na clínica.

Disse quase sem voz e o lobo correu para cima.

Desci o mais rápido que meus pés permitiam.

As emoções se emaranhavam em mim, a esperança se tornando cada vez mais desespero.

Já fazia tempo demais que Will estava preso lá.

Deixei tudo pronto na clínica para o caso de qualquer emergência, é óbvio que não poderíamos levar Will até um hospital humano.

Me sentei na porta de entrada e fixei os olhos na montanha, implorando pra não ser tarde demais, nós vivemos tão pouco. Tivemos tão pouco.

As horas passavam devagar, eu podia ouvir o meu relógio de pulso funcionar lentamente, ainda sentado na frente da clínica, com as roupas pesadas.

Minhas esperanças começaram a se perder enquanto o sol abaixava, trazendo a noite.

Me recusava a pensar no que isso poderia significar, mas a ideia se alojava cada vez mais na minha mente.

Quando uma caminhonete surgiu na rua, o barulho dela era o único som que eu conseguia ouvir, porque ela também era o único carro andando depois de tamanha tempestade.
Eu paralisei, sem respirar.

Alguém estacionou com cuidado na minha frente, mas desceu com pressa e eu despertei me levantando.

Corri até a carroceria e ele estava ali.

Enrolado em vários cobertores, com o rosto pálido e suado.

Ele estava vivo.
vivo.

Nunca antes me dei conta da importância dessa palavra.

Eu respirei como se estivesse prendendo meus pulmões a dias.

Ele abriu os olhos francamente, me revonhecendo deu um sorriso frouxo, eu me joguei do lado dele, sem nem saber como.

A montanhaOnde histórias criam vida. Descubra agora