Capítulo Nono

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As horas tiquetaqueavam devagar e o sangue escorria ainda mais lentamente, fazendo as feridas arquearem suas essências e perdê-las cada vez mais rápido. O almoço estava silencioso e apenas os talheres batiam na porcelana branca dos pratos. Mary ainda não havia voltado e, milagrosamente, nada esfriou desde que ela saíra. Dio dirigia, em vezes, seu olhar para Jonathan, como quem espia uma presa, e sequer imaginava no que ele podia estar pensando. O felino ausentava-se, mas era como se estivesse ali, bem na sua frente, mostrando-lhe cada ferimento e acusando-o com os olhos. Dio nunca se sentiu tão incomodado. Por descuido ou intenção de livrar-se dos pensamentos com o gato, bateu com força a faca na beirada do prato, tendo um par de olhos a julgá-lo por perturbar o silêncio.

— O que há? — Jonathan sentia-se impaciente, mas não podia se deixar deslizar tão facilmente. Ergueu mais o rosto e fitou Dio como se já antecipasse o que aconteceria.

— Andei recordando de coisas que me incomodam — bufou, enquanto concentrava-se internamente em continuar a persuadir Jojo, empurrando-o para onde faria sua emboscada. — Se importa?

— De maneira alguma — o Joestar disse brandamente, pensando em como as pobres almas deveriam ter o direito de ao menos um momento decente antes de não mais existirem.

Não era mais de grande surpresa para Jojo que o Brando quisesse expressar-se mais livremente. Entendia seus jogos, conhecia suas cartas e sabia trapacear tão bem como ele fazia. Causava-lhe engulho o tempo frio, mas não tanto quanto os olhos carmim do loiro, reverberando o tilintar de lâminas afiadas em suas íris. Fingiu prestar atenção no avitimamento enganoso do Brando, mas não pôde evitar focar-se em uma parte específica.

— O pai estava como George quando saí, tossia muito. Imagino que seja a maldita tuberculose da qual os estudantes nariz-em-pé de medicina dizem ter descoberto — caberia-lhe muito bem uma coroa de espinhos, daqueles mesmos que originam-se meticulosamente de sua falsa aparência rósea, do esbranquiçado como sua pele e o leite que escorre da fatalidade decapitada de uma rosa indefesa. Maldito seja. — A idade é um fator inalterável, não achas uma parvoíce essas ideias, Jojo?

Por um instante, quis levantar-se e terminar logo com aquilo. O relógio ainda remexia as quatro horas e o almoço não queria ser digerido. O Joestar engoliu seco e respondeu, amaciando o ego do Brando.

— Terei de finalmente concordar. Além do mais, a vulnerabilidade vem com os anos e pode ser inevitável que atinjam nossos velhos pais — com uma falsa dó na voz e uma cólera incontrolável no vazio atrás de sua janela, Jonathan atingiu a barreira que cuidava dos segredos de Dio. — Resta-nos apenas rogar para que sejamos bons descendentes, fazer jus aos nossos sobrenomes e honrar o que nos foi deixado. Não acha?

— Hm — não houve resposta, mas um murmúrio ciente da possível ameaça ecoou dos labios secos. Haviam finalmente terminando o jantar quando o relógio bateu quatro e dez.

— Mary já deveria ter voltado — Jonathan atravessou o assunto, já preocuoando que seu retorno pudesse ser tarde demais. Ou cedo demais.

— Demoras, sim — o brando levantou-se, circundando a mesa pelo maior caminho até chegar a Jojo. Deslizava o alvo das mãos nas cadeiras, deixando a marcas dos espinhos arranharem a madeira dali. O Joestar não se moveu, embora quisesse aproveitar o pescoço vulnerável que a rosa mostrava-lhe por cima de seus espinhos.

— Quem sabe não encontrou Joey no caminho e-

— Mandaste-a até a feira, por que encontrariam-se? — levemente desconfiado, Jonathan questionou antes que Dio pudesse terminar.

— Talvez eu a tenha dispensado — redarguiu, enrolando nos dedos os cabelos macios de Jojo. — Não acha que estamos bem? Garanto que após levarem George não comeremos nada mais que uma pequena poção desse almoço — Dio piscou, lentamente, e esperou para o momento certo de envolver Jonathan em sua nebulosa traiçoeira. — Veja, mal tocaste na sua comida.

Um Gato Pulando A JanelaOnde histórias criam vida. Descubra agora