Capítulo DEZ - Estadia

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Levei um susto ao acordar, um susto imenso, pois eu sabia que a presença de Reid e Pauline não tinha sido um sonho e eu acordei muito tarde para vigiá-los, eles poderiam muito bem ter me roubado e fugido com meu carro depois de fazer uma ligação direta.

Por instinto, peguei a pistola e fui para a janela, tirei o grosso cobertor que a cobria e observei o céu. O sol estava brilhando forte, talvez fossem nove ou dez horas.

Ouvi risadas ao longe e percebi que Reid e a filha estavam na horta, trabalhando. Exatamente como no dia anterior. Pauline ria de alguma coisa que seu pai tinha dito, então olhou para a minha direção e acenou com inocência quando me viu, ela nem mesmo sabia o que eu pensei em fazer com os dois ao imaginar a possibilidade de ter sido roubada, e mesmo assim me tratava como se fizéssemos parte da mesma família.

Desci para a cozinha, olhando por tudo, tentando notar se alguma coisa havia sumido ou estava fora do lugar. Mas tudo o que eu vi de estranho era o café da manhã esperando por mim com um bilhete de Reid:

“Isso é para amolecer o seu coração na hora de tomar sua decisão.”

Ao lado do bilhete havia uma travessa de madeira com pedaços generosos de broa de milho. Eu nem sabia como ele tinha feito para assá-la, mas o sabor estava ótimo. Era a comida mais saborosa que eu provava em semanas. E apesar de ficar tentada a comer mais, resolvi fingir que a atitude de Reid falhou e eu continuava tão intocável quanto uma muralha.

Fui ajudá-los na horta e imediatamente Pauline me perguntou sobre o que achei do café da manhã.

– Bom – respondi com descaso e mudei de assunto. – A que horas vocês começaram a trabalhar?

Reid parou de cobrir a pequena estufa de lona, onde eu planejava plantar algumas verduras e vegetais. Ele parecia bem cansado e um pouco mais bronzeado do que no dia anterior. Sua testa brilhava com suor.

– Depois que tomamos café, acho que eram umas sete horas.

Olhei para os meus pés um pouco envergonhada, não queria me aproveitar dos seus serviços. Mesmo que dormir demais tenha parecido uma tática minha para fugir do trabalho, não era.

– Eu perdi a hora...

– Você estava cansada – interrompeu-me, tentando me oferecer justificativas. – Eu consigo entender, afinal, você vivia aqui sozinha e fazia todo o trabalho por conta própria.

O modo como ele usou algumas palavras-chave no passado não me passou despercebida. Poderia soar um pouco pretensioso, mas o modo como Reid se expressava não demonstrava presunção alguma. Ele parecia saber exatamente como falar uma coisa sem parecer errada.

Fiquei um pouco curiosa à seu respeito.

– O que você fazia antes do fim do mundo?

Eu o surpreendi aparentemente. Não era do meu feitio lhe fazer perguntas pessoais demais, embora ele fizesse algumas vez ou outra.

– Advogado – respondeu, pensativo. – Eu era advogado.

Isso explicava como ele conseguia ser persuasivo se quisesse. Ou como usava as palavras à seu favor.

– Pensei que era algo como chef de cozinha – pensei alto, pareceu uma provocação por causa da broa que ele preparou.

Reid sorriu. Ele sabia que eu o estava elogiando, mas sem querer demonstrar tanto como gostei do que ele fez.

É claro. Eu gostava de qualquer um que simplesmente cozinhasse para mim.

Foi o que aconteceu com Camden, lembrei à mim mesma, e ele se mostrou um estúpido depois. Com isso, decidi que era hora de acabar com o momento de intimidade e voltar ao trabalho, no meu caso, começar o trabalho.

Em Algum Lugar Lá ForaOnde histórias criam vida. Descubra agora