Capítulo DEZOITO - Frio

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Eu tinha que dar algum crédito à Kohl Vincent, mesmo em seus dezesseis anos ele era tão cuidadoso quanto qualquer outra pessoa vivendo numa era pós-apocalíptica, provavelmente ele tinha passado por tantos problemas e tragédias em sua vida quanto eu. Ele era cuidadoso ao extremo, quando eu tentava me aproximar por suas costas, mesmo o menor ruído ele era capaz de ouvir, ou pressentia minha presença como um perigo à espreita, já que tudo o que eu planejava era apenas acabar com sua vida antes que ele acabasse com a minha e a de Cam.

Mas, é claro, eu sabia que as coisas não seriam fáceis, ainda assim eu procurava qualquer brecha para me aproximar sem parecer suspeita demais.

Dois dias haviam se passado e a melhora de Camden simplesmente não existia, na verdade ele estava piorando e eu tinha medo que a qualquer momento Kohl Vincent invadisse o quarto e atirasse nele e em mim.

Eu pensava em todas as coisas que poderia fazer para ajudar Cam, mas além de alimentá-lo e lhe fazer companhia não haviam muitas outras alternativas. Às vezes eu conversava com Camden, contudo, em determinadas horas ele perdia a consciência. E esses não eram os piores momentos, os piores eram aqueles onde ele parecia perder a sanidade, ele não sabia quem eu era ou me confundia com sua irmã, Jane. Várias vezes ele chorou, me pediu perdão, mas eu sabia que não era realmente para mim. Camden estava fraco, física e emocionalmente, e eu tinha que ser forte nesses aspectos por nós dois para sobreviver a Kohl Vincent, para nos livrar dele.

Ao entardecer do segundo dia eu esperava por Kohl Vincent, entretanto ele não apareceu. Eu não sabia o que ele planejava, pois todos os seus pensamentos e ações, mesmo tendo a intenção de ser cruéis eram sempre muito misteriosos e eu nunca conseguia ler suas expressões além da maldade que ele sempre deixava implícita em seus olhos.

A noite veio e a manhã do terceiro dia se iniciou com uma tempestade terrivelmente forte de neve. A temperatura caiu muito e nenhum de nós saiu de casa.

Estar confinada na presença daquele rapaz era terrivelmente perturbador, meu corpo ficava tenso o tempo todo e eu não conseguia parar de olhar para todos os cantos da casa e ouvir qualquer ruído, eu tinha certeza que conseguiria ouvir até um grão de poeira caindo no chão se me esforçasse um pouco mais, porque eu queria ouvir quando Kohl Vincent chegasse, quando ele tentasse se aproximar. Eu queria ouví-lo, eu queria vê-lo; mas essa percepção era terrível, contudo era a única coisa que me trazia um pouco de segurança agora que eu já não tinha mais minha arma, isso me lembrava que eu tinha que dar um jeito de recuperá-la antes que Kohl Vincent surtasse de vez e acabasse com tudo.

Era óbvio que ele era o tipo de pessoa que preferia ficar sozinho, por algum motivo estar na presença de outras pessoas o deixava talvez assustado.

Por um lado, eu quase sentia pena dele, tentando imaginar as tragédias que o transformaram naquele garoto sem coração, que apenas queria ser temido por outros seres humanos, mas então minha compaixão por ele passava de um minuto para outro quando eu pensava nas coisas ruins que aconteceram comigo em meu caminho ou com Camden e nenhum de nós sucumbiu à maldade. Ao menos não intencionalmente, é claro, eu não podia dizer que não tínhamos feito coisas ruins para outras pessoas no passado, ou até mesmo para nós, mas as coisas que Kohl Vincent fazia nem se comparavam.

Ainda me lembrava do saco de ossos que eu havia encontrado com os restos de Michael e Clementine. Não toquei mais no assunto com Camden, pois eu sabia que seu estado só pioraria, eu também não tinha certeza de que ele acreditava que Kohl Vincent havia se alimentado dos animais, apesar de tudo, Camden queria acreditar que ele era um garoto inocente em seus dezesseis anos. Acho que de algum modo Cam tentava salvá-lo do mesmo modo que ele pensava que havia me salvado, do mesmo modo que ele queria ter tentado salvar Jane e tantas outras pessoas, mas eu pensava que não havia nada que pudesse mudar a personalidade de Kohl Vincent.

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