5 - Amigos

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É duro ter que admitir isso, mas um homem precisa de amigos. Principalmente em tempos como aqueles que vivi. Durante muito tempo, fui amigo de uma ratazana. Sempre que eu era levado pelos guardas para as celas sombrias, eu a via correr por ali. Às vezes, parava e olhava para mim. Era algo estranho, como se tivesse consciência do que estava acontecendo. Eu a nomeei de Sara. Sara era um bom nome.

Mas como todos nessa vida, um dia Sara desapareceu. Talvez estivesse morta. Talvez tivesse cansado daquele lugar. Ela tinha essa vantagem, e eu a invejava. Podia fazer o que bem entendesse. Ir a qualquer lugar, sem regras a seguir.

Depois de Sara, eu tive um segundo amigo. Yan. Não era uma ratazana, era algo bem mais sujo que isso. Um ser humano. Ele dormia na cela ao lado da minha. Durante as noites, enquanto eu tentava dormir, ele esmurrava a parede, inconformado por estar ali. Pedi para ele parar de fazer aquilo.

Noutro dia perguntei qual era o seu problema. O porquê dele estar ali.

"Eliminei a concorrência". Foi tudo o que disse o garoto. Tinha ombros largos, espessas sobrancelhas e lábios inchados naturalmente. Ele tinha aspectos de um gigante, mas era todo atrofiado, se tornando mais baixo que eu. Depois de algum tempo, entendi sobre o que ele falava.

O professor em sua sala no colégio dizia a todos que ninguém ali era amigo de ninguém. O mundo era um lugar ruim, e o cara que dizia ser o seu amigo, esperava tomar a sua vaga na universidade, no mercado de trabalho, ou em qualquer outra merda que fosse. Aquilo entrou na cabeça do garoto de certa forma que uma semana depois levou a arma de seu pai para a escola. Conseguiu atirar em pelo menos três colegas antes da arma travar e o segurança da escola detê-lo. Quando foi perguntado o que ele fazia com isso, ele respondeu que estava eliminando a concorrência.

Minha amizade com o Yan também não durou por muito tempo. Ele me deixou, de certa forma. Era noite, ele fez muito barulho por algum tempo e eu perguntei o que estava havendo até que tudo ficou em silêncio. Houve algum rebuliço lá fora e vi guardas passando apressadamente para a cela ao lado. Perguntei novamente o que acontecia. Não me responderam diretamente. Mas logo percebi do que se tratava. O idiota amarrou o seu lençol no alto da barra de ferro de sua cela, logo em seguida em seu pescoço, e por fim se enforcou.

Eu costumava pensar que a vida é que nem um jogo. Se você tem muitas derrotas, existem três opções:

A) Você melhora ainda mais.

B) Você trapaceia.

C) Você desiste.

A última opção lhe pareceu mais cômoda. 

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