14 - Segredos II

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Ela não era uma mulher pequena, sabe? Mas é incrível como o seu corpo coube perfeitamente dentro da lata de lixo daquele beco. Parece que ela nasceu para aquilo, como se fossem feitos um para o outro. Devo ser honesto e dizer que não foi assim tão fácil colocá-la lá dentro. Suei a camisa, literalmente. Alguns ossos do seu corpo tiveram que ser... fragmentados, por assim dizer. Mas a visão final ficou boa. Braços e pernas saltados para cima, sua coluna curvada. Dentro daquela lata, a mulher parecia a letra "U". Demorei para pôr a tampa em cima, queria vê-la ali a noite toda. Mas logo a coleta de lixo passaria pelo local, e não seria bom que eu estivesse por perto.

Cheguei pela madrugada no meu apê. Bati meus bolsos a procura da chave quando ouvi a porta da dona Fátima se abrir. Ela pôs a cabeça para fora de seu apartamento para ver quem chegava àquela hora. A velha devia dormir numa cadeira atrás da porta; não era possível que fosse tão rápida!

"Voltando do trabalho?" ela perguntou com um ar orgulhoso. Eu acenei com a cabeça e ela disse: "Muito bem. Gostaria que meu rapaz fosse como você. Aquele vagabundo não quer nada com a vida. Bom descanso, meu jovem". Então pôs a cabeça para dentro e bateu a porta.

Mais tarde, descobri que a moça fora encontrada dentro da lata de lixo. Ela não era ninguém muito importante, mesmo assim o caso deu o que falar. Claro que a culpa caiu em cima dos marginais que viviam no prédio abandonado. Dias depois o lugar foi interditado, e os habitantes de lá, expulsos.

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