Não Precisa ser Assim

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O melhor remédio para amenizar o sofrimento emocional era ocupar a cabeça com algo produtivo. Como o trabalho, por exemplo. E com tanta coisa para fazer, isso não era algo muito difícil. Essa solução até que foi boa para Rubão se sentir um pouco melhor, mas não ajudou Enrico.

Quanto mais os dias passavam, mais o lutador ficava entristecido. Não parava de sentir o impacto pela besteira que fez com Rubão. A coisa que mais queria era poder se explicar com seu parceiro, falar com ele. Mas o loiro não facilitava. Pois além dele não responder às ligações e as mensagens de Damasceno, ele ainda o bloqueou no aplicativo de mensagens.

O mecânico realmente estava com raiva, e não estava brincando quando disse que nunca mais queria vê-lo.

Foram várias as vezes que Enrico tentou entrar em contato, e nada dava certo. Esse gelo do mecânico o fazia se sentir cada vez pior. E logicamente, afetava seus treinos. No exato momento em que necessitava ter uma concentração cada vez maior, sua cabeça ficava longe, mergulhada nos pensamentos negativos.

Seu rendimento no treinamento ficava visivelmente abaixo do esperado. O que já era notado por seu treinador, pelos seus colegas, e até pelo próprio. Enrico sabia que não podia continuar assim, pois se já estava ruim daquele jeito, poderia ficar pior às vésperas da grande luta. Ele não podia deixar isso acontecer.

Em contrapartida, também não aguentava mais aquele clima entre ele e Rubão. O desprezo daquele por quem nutre o mais forte dos afetos durava dias, e doía muito. Logo em um dos melhores momentos de sua vida, o lutador queria viver todas aquelas coisas junto do homem que ele mais gostava.

O sentimento que nutria por Fonseca ficava maior. Quanto mais o tempo passava, mais aumentava sua vontade de estar perto dele, compartilhando todos os momentos. Contudo, pelos motivos que só ele sabia, isso não poderia acontecer como queria. Deixando-o mais triste. Foi por causa desse empecilho que acabou agindo errado com o loiro, estragando tudo.

Por isso, Enrico enfim tomou a decisão de fazer o que já deveria ter feito dias atrás: ir pessoalmente falar com Rubão. Só não fez isso antes por conta de sua rotina, praticamente não teve folga. Porém, não dava mais para esperar. Durante uma certa manhã, antes de partir para mais treinos, saiu de casa e seguiu caminho para o endereço de Rubão.

Enquanto passava pelas ruas, seu nervosismo aumentava. Não sabia muito bem o que dizer à ele, mas tinha certeza que iria falar. Enquanto isso, Rubão estava em sua rotina de sempre, trabalhando em sua oficina, cuidando com todo o foco dos veículos que precisam de consertos e reparos.

Naquele dia em questão, desde que começou o expediente, o mecânico centrou todas as atenções em um único carro: um Pálio 2008 preto que tinha um vazamento de olho justamente no motor. Após uma verificação, constatou que, para o conserto, ele precisava tirar o motor. Justamente a coisa mais desafiadora que ele poderia fazer.

A retirada dessa parte do carro era a tarefa mais ingrata para qualquer mecânico. Pois além do mesmo ser muito pesado — mais de duzentos quilos — e ser difícil de ser deslocada, o momento de recolocar exigia uma precisão extremamente milimétrica. O motor precisava retornar a sua exata posição. Um tantinho fora do lugar resultaria em algo realmente desastroso.

Embora essa parte de seu trabalho fosse a que menos gostava, Rubão não reclamava e nem achava ruim. Pelo contrário, sentia estar substituindo um momento difícil por outro. Um momento no qual ele conseguia lidar. Sua concentração poderia fazer com que diminuísse sua raiva, por estar magoado com Enrico.

Seu único desejo no momento era esse. Não queria mais olhar para a cara dele, tampouco lembrar que ele existia. Esperava que o tempo fizesse o seu trabalho de enterrar tudo aquilo que magoava. E quem sabe assim, pudesse deixar para trás a paixão que sentia, e que só machucava. Nem que ele tivesse que forçar, isso tudo iria passar.

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