[06] antisolar point

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Há uma impossibilidade quase absoluta em reconhecer sentimentos humanos de maneira autêntica ao que são capazes de proporcionar àqueles que os sentem, isto porque os tremores enérgicos dos seres celestiais só possibilitam identificar a diferença entre as emoções, mas não a forma como estas são de fato sentidas. Esse ponto se tornou apenas um entre diversos outros que Belial foi incapaz de compreender ao começar a viver na Terra de maneira tão devassa; não saber como os humanos vivenciam os sentimentos, nem o significado deles de maneira apropriada, acabou por se tornar prejudicial a um ser tão cruel.

Por conta disso, Jungkook começou a fazer o que seria, provavelmente, sua única atividade digna de orgulho aos Anjos Celestiais, mesmo que fosse em função de aprimorar algo repudiado pelos viventes dos Sete Céus — manipulação. Se Belial não soubesse ao menos o significado dos sentimentos, como poderia usá-los para manipular os humanos impiedosamente? Foi a partir disso que o diabo começou a estudar.

Tudo o que ele precisava era de um dicionário, poucos segundos para realizar uma leitura simples e, então, observar como a teoria se aplicava aos homens. Simples, porém o suficiente para aperfeiçoar suas interações na Terra.

E enquanto Belial caminhava com dureza para a parte externa do orfanato e sentia o estômago formigar dentro da barriga, as palavras impressas começaram a passar em sua mente como se ele as estivesse lendo simultaneamente à sua aproximação.

Medo s.m. (sXIII) 1) /psic/ estado afetivo suscitado pela consciência do perigo ou que, ao contrário, suscita essa consciência; 2) temor, ansiedade irracional ou fundamentada; receio; 3) apreensão em relação a (algo desagradável).

Ainda era um mistério para tal criatura a maneira como todas essas respostas poderiam ser manifestadas pelo corpo humano e, em contrapartida, Park Jimin gostaria de entender um pouco menos essa relação.

O garoto não lia dicionários e certamente não saberia explicar com tanta riqueza literária o conceito dos sentimentos, especialmente um feito o medo, mas as palavras não pareciam realmente importar ao jovem, em momentos onde o sentimento parecia ser unicamente vivenciado — muito acima de explicado.

Se alguém perguntasse ao diabo o significado do medo, ele saberia dizer com prontidão toda a trajetória histórica da termologia desde o séc. XIII; se perguntasse ao órfão, ele pensaria na sua trajetória de vida.

Porque era isso o que Jimin reconhecia como sendo o mais puro medo: sua própria e nefasta existência.

O medo já é tão desesperadamente característico para o garoto que ele podia senti-lo antes mesmo de levar uma bronca da mãe Bongcha ao se esquecer de fazer alguma atividade com as crianças. Ele podia senti-lo todas as noites antes de dormir, mesmo sem saber se acabaria sonhando com flores e arco-íris, ou com o vermelho viscoso cobrindo o seu corpo pequeno. Podia senti-lo agora, mesmo sabendo que o farfalhar das árvores poderia ser apenas fruto de algum animal por perto.

Jimin parou de andar com o coração acelerado, antes fruto da aproximação inexplicável de Jungkook e de seus lábios finos indo de encontro aos seus, agora, pela sensação de que alguma coisa estava errada.

Entre o período de tempo entre levar as crianças para dentro, dar banho em todas e preparar mais sobremesa para o jantar, o sol já havia baixado no horizonte e o céu começava a tomar uma coloração escurecida; um azul arroxeado preparatório às pessoas que devem retornar dos trabalhos ou das aulas em breve, anunciando o final de mais um dia. Ali, no Orfanato da Mãe Bongcha, era apenas mais um sinal de que nada havia mudado — as crianças ainda estavam ali, as fichas ainda intocadas na sala de administração, os telefones ainda silenciosos sem qualquer vestígio de uma possível adoção.

PROTECTED • jjk + pjmOnde histórias criam vida. Descubra agora