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Christopher

Após o meu primeiro dia longo de trabalho, eu queria mesmo sentar e poder conversar com alguém que não me olhasse com pena. E quem melhor para isso do que a zeladora que eu acabei de conhecer?

Dulce não presenciou minha história, não criou vínculo comigo a ponto de me fazer ser digno de sua pena. Ela sim podia me olhar como se eu fosse normal e saudável. Porque, apesar dos meus esforços em fazer terapia e me medicar, meus irmãos ainda me tratavam como se eu fosse quebrar a qualquer momento e isso me incomodava muito.

Preparei o café, como prometido e aguardei no laboratório. Maitê entrou com a face cansada e já bocejando, pronta para ir embora.

— Vai ficar? — apontou para a garrafa e as xícaras em minha mesa.

— Eu chamei a Dulce pra tomar um café comigo.

— Blane? Ela não vem. — deu um meio sorriso. — Sabe quantas vezes eu vi o Albert chamar ela pra sair? Várias. E sabe quantas vezes ela aceitou? Nenhuma. Até o Alfonso já tentou e não convenceu.

— O Alfonso? — arqueei a sobrancelha.

— Sim.

— Eu só a chamei pra um café, não é um encontro.

— E você não pensou em flertar com ela? — me olhou desconfiada.

— Você não ia embora? — fiquei impaciente.

— Toma o café antes que esfrie. — deu uma piscadela. — Eu guardo seu jantar na geladeira. Boa sorte. — saiu pela porta.

Os minutos passavam e parecia mesmo que ela não apareceria. Tomei pelo menos três xícaras de café enquanto aguardava. Quando me dei por vencido, a porta do laboratório se abriu e ela apareceu.

— Achei que não viria mais. — eu disse.

— Eu não vinha. Comecei a adiantar um pouco da limpeza de amanhã. Pensei que você tivesse desistido mais cedo, mas vi a luz do laboratório acesa e deduzi que ainda estivesse aqui.

— E aí você desistiu de me dar um bolo? — brinquei.

— Te achei muito persistente. — sorriu de lado.

— Por favor, se sente. — puxei a cadeira para ela e ela sentou. — Você vai adorar o café que eu faço. — falei enquanto enchia sua xícara.

— O cheiro está ótimo. — levou a xícara até o nariz. — Vejamos... — ela deu um gole e após uma expressão analisadora, abriu um sorriso satisfatório. — Muito bom.

— Obrigado. — sorri para ela. — E então, Dulce, de onde você é mesmo?

— França. — respondeu rápida.

— E o que te trouxe até essa cidade?

— Eu não costumo morar em um lugar por muito tempo. Gosto de viajar, conhecer novos lugares, testar coisas novas.

— Uma nômade? Interessante. Mas o que fazia antes de entrar pra essa vida? — Dulce suspirou de forma pesada e desviou o olhar repetidas vezes antes de se ajeitar na cadeira e começar a falar.

— Eu vivia com a minha família, não fazia nada demais.

— E eles aceitaram que você vivesse assim? — franzi a testa. — É que você é jovem, não parece ter tanta experiência de mundo.

— Você se surpreenderia. — riu. — A minha família... como posso dizer? Os mortos não podem se incomodar com essas coisas, não é? — deu de ombros.

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