Capítulo Vinte e Dois

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Música de Fundo Recomendada: Stay - Rihanna feat. Mikky Ekko.


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Mare Barrow


Dois ajudantes trazem o café da manhã, algumas roupas e me preparam um banho. Me forço a comer o máximo que posso dos pãezinhos, bolos, torradas e suco. Sei que me esforçarei mais ainda a manter tudo no estômago mais tarde, mas será pior se eu desmaiar ou demonstrar que preciso de qualquer auxílio médico nas próximas horas. Eles me manterão no castelo e eu perderei muito tempo. Tomo um banho e visto um vestido simples, preto, com um casaco cinza por cima. Encaro a bolsa que escondi embaixo da cama e decido que preciso destruí-la. Atiço as chamas da lareira e observo-a queimar junto com a capa. 

É hora de sair e encarar minhas escolhas. Vou até a sala do trono e percebo a agitação. Para alguns, parece não haver nada de anormal acontecendo, mas minha experiência nesta mesma corte não me deixa ser enganada. Cal está sentado no trono, tentando demonstrar calma, mas sei que é uma máscara. Conheço-o bem demais. Quando me vê, ele se levanta e eu me preparo. A reação certa fará toda diferença. 

- Bom dia, Mare - ele me cumprimenta, respeitoso. Tudo parte de sua atuação para com a corte.

- Cal - abaixo a cabeça, devolvendo o cumprimento. Ele se aproxima mais. Faço uma expressão confusa.

- O que houve? - pergunto suavemente.

- Eu sei que o que estou prestes a lhe contar pode parecer chocante, mas preciso que mantenha a calma, você entendeu? - ele sorri, tentando fazer parecer que algo em nossa conversa o divertiu. - Controle suas expressões. Pode fazer isso aqui?

- Claro - sorrio em resposta, entrando em seu jogo.

- Maven desapareceu.

- O que? - Pisco, incrédula, e sem seguida passo os olhos ao redor, tentando esconder. Sorrio de leve e deixo minha cabeça pender para um lado, disfarçando.

- Foram buscá-lo para a cerimônia hoje de manhã, mas seu corpo desapareceu durante a noite - ele olha ao redor, caminhando comigo. - Nenhum dos guardas viu nada.

- Mas por que ninguém me acordou ou me disse nada?

- Não tinha motivo - seguimos pelo salão. - Verifiquei com seus guardas e você não saiu de seu quarto, portanto não tinha motivos para saber de nada. Você nem sabia onde ele estava sendo mantido. Procuramos em todos os lugares, mas não o encontramos.

- Mas o que estamos fazendo aqui então? - indago, discreta.

- Vamos seguir com a cerimônia. Utilizaremos o corpo de outro falecido na batalha - meu olhar de questionamento não passa despercebido. - O povo precisa de paz, Mare. Precisa saber que está seguro. Não podemos deixá-los saber que o corpo do rei tirano desapareceu. Quebraria nossa imagem justamente quando precisamos mostrar uma fronte unida. Só assim Norta prosperará.

Olho para o chão e assinto. Isso é o suficiente para Cal. Ele me guia para meu lugar na cerimônia e toma seu lugar no trono. Tudo será televisionado, é claro. Para que todos possam ver a queda do rei Maven Calore. Cenas de seu corpo feitas durante o entardecer passam na tela, doentias. Tentando comprovar que o corpo que se encontra em uma pira no centro do salão é o de Maven, exceto que não é. O plano era deixar o corpo exposto enquanto Cal liberava sua chamas sobre ele, expurgando seu mal deste mundo. Agora um tecido vermelho cobre seu corpo, suficiente para mostrar que o falecido tem aproximadamente a mesma estatura de Maven, mas esconder sua aparência. 

Não consigo prestar atenção em nada. Apenas um pensamento me recorre o dia inteiro. Preciso sair daqui. Cal faz seu discurso, juntamente com alguns poucos membros de Casas leais a coroa. Tudo ocorre bem, até que Cal se levanta e libera seu poder sobre a pira, destruindo o reinado do rei tirano e também as evidências do desaparecimento de seu corpo. A cerimônia termina. 

Depois do que parecem horas e horas de elogios de membros da corte sobre como a cerimônia foi bem sucedida e sobre o quanto este reinado será diferente, me aproximo de Cal.

- Podemos conversar? - pergunto.

- Claro - ele se levanta e me guia para a biblioteca. 

Não vejo mais sinais de Pedra Silenciosa em nenhum lugar em Whitefire, mas o fantasma de sua presença ainda me assombra. Alguns guardas nos seguem, mas ficam do lado de fora do cômodo. Cal fecha as portas e se senta em frente à escrivaninha, indicando-me um assento. Respiro fundo, me sento e o encaro. Ele parece estar esperando.

- Queria dizer que não vou ficar no castelo - começo. Cal parece surpreso.

- E a corte?

- Não tenho interesse, também - dou de ombros.

- Mas por que, Mare?

- Depois de tudo que passei aqui, Cal, apenas não me parece certo - sou sincera em cada palavra. - Sei o que quero para mim depois de todo esse terror e sei que não quero ter de viver no meio de políticas e maquinações - faço uma pausa. - Lutei para libertar meu povo. Lutei para viver. Agora quero viver sendo livre.

Cal pondera.

- Você não teria isso ao meu lado - é aí que ele percebe. - Você não está deixando Whitefire. Está me deixando.

Olho para o chão, pensando por um momento. Quando volto meu olhar para Cal, ele lê a resposta em meus olhos.

- Você lutou pelos vermelhos, lutou por Norta, mas desistiu de mim - ele faz uma pausa. - De nós.

- Você desistiu de mim muito tempo atrás, Cal. Queríamos duas coisas diferentes - o encaro. - Eu queria a nós e você queria a coroa. Agora você tem a coroa e quer a nós, mas eu quero a minha vida. Eu escolho a mim.

Meias verdades. Tudo que passamos juntos abriram e fecharam feridas em meu coração e Cal realmente tinha escolhido a coroa ao invés de mim, mas eu não escolhi a mim mesma. Eu escolhi amar Maven. 

- Depois de tudo o que houve, é isso que te fará feliz? - ele indaga.

- Sim.

Após longos minutos, ele percebe que não vou mudar de ideia.

- Espero que entenda que é extremamente complicada a sua ausência na corte. Gostaria de fazer uma proposta a você - ele me encara, tentando esconder a dor em seus olhos.

- Estou ouvindo - apoio as mãos sobre a mesa.

- Não posso forçá-la a ficar na corte, mas sua presença será extremamente valiosa. Posso ser rei por enquanto, mas sou prateado, Mare. Os vermelhos nunca confiarão totalmente em mim e você é vista como a salvadora deles - ele respira fundo. - Por isso, peço que não deixe a corte totalmente. Você tem total direito de ir e vir como bem quiser e eu não vou pedir que fique por mim. Muito menos vou forçar um relacionamento com você. Apenas mandarei avisá-la quando houverem encontros importantes. A tratarei como amiga e conselheira, até que consigamos fortalecer o reino e prover condições para que seja estabelecida uma democracia em Norta. 

Ele para, parecendo exausto. É seu último pedido. Penso por alguns minutos. É uma oportunidade de manter a normalidade, não parecer que fugi, como a culpada de um crime faria. Manter a normalidade. Kilorn é esperto demais para o próprio bem.

- Eu aceito - me levanto e estendo a mão para ele. - Ainda estou me decidindo sobre minha residência, mas o avisarei. 

Ele se levanta e aperta minha mão.

Aceitei uma vida de mentiras a partir do momento que aceitei um emprego neste maldito castelo.

Mas a partir do momento que sair por aquelas portas a vida que me aguarda lá fora valerá a pena.

Rainha Prateada | Fanfic de Rainha VermelhaOnde histórias criam vida. Descubra agora