Capítulo 8- Os Dançarinos Mascarados

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Hastur ficou acordado a noite toda, à espreita. Ele sempre se sentia melhor depois de um bom espreitamento. Isso fazia as coisas acontecerem. Ele e Duque Ligur eram espreitadores especializados. Eles podiam superar qualquer um em espreitamento.

Agora Hastur caminhava propositalmente através de portões de ferro cujas dobradiças gritavam com vozes roubadas de almas torturadas. Do outro lado dos portões estavam gravadas as palavras ― não porque Dante estava certo, mas porque o diabo é bem versado em poesia e gostou do som. Toda empresa precisa de um lema.

[Nota da autora: houve várias sugestões antes desta, é claro. Beelzebub se voluntariou: "Nós faremos o inferno da sua vida", e o falecido Ligur havia oferecido: "Mais de 35 bilhões contemplados". Dagon sugeriu: "Faça o seu pior", ao qual Crowley não pôde deixar de acrescentar: "E nós faremos o nosso melhor."]

Nenhuma das expansões do Inferno ao longo dos séculos envolveu expandir a área do escritório, ou mesmo a obtenção de um segundo bebedouro de água. Isso teria sido algo bom.

John Milton havia chamado poeticamente a capital do Inferno de Pandemônio. Seus moradores a chamavam de trabalho. O escritório era um andar aparentemente interminável. E os cubículos sombrios estavam apinhados com lâmpadas compridas e baixas, todas do tipo fluorescente e indutoras de dor de cabeça. Todas já tinham queimado séculos atrás ou tremeluziam, ameaçando fazê-lo.

Algo sempre vazava. O chão sempre estava pegajoso. E ninguém sabia o que era aquele cheiro na geladeira, mesmo depois de dois mil anos. Havia proibições eternas em cartazes, memes de gatos e perfuradores de três furos ajustados para o sistema métrico.

Somente membros do Conselho Sombrio tinham o luxo de escritórios particulares, a menos que se contasse como paredes as intermináveis ​​caixas de papelada na área de trabalho de Dagon. Hastur curvou-se em torno de uma pilha inclinada de DOAs (ou seja, formulários de Damned-on-Arrival [Condenado à Chegada, trocadilho com "Dead on Arrival, quando alguém chega morto a um hospital]).

"Dia, Fergus", ele murmurou. "Eu preciso ter uma palavra com o Senhor dos Arquivos. Ele está?

A entidade Fergus, que atualmente gerenciava os arquivos, parecia um tumor doentio do tamanho de uma bola de basquete. Estava na mesa, reabastecendo vários folhetos úteis com títulos como: "Então, você pensou que estava indo para o céu?" e "Bem, você está ferrado".

"Como eu poderia saber?" perguntou. "Vocês duques fazem o que querem."

Hastur pegou uma prancheta da estaca. A prancheta era uma coisa em ruínas, cheia de umidade mas suficientemente resistente para continuar por ali. Dagon mantinha algumas delas à mão. Elas agregavam à entropia geral da estética do Inferno.

Hastur disse: "Seria um prazer arrancar suas asas", mas era mais um reflexo do que uma ameaça. Sempre haveria tempo para isso mais tarde.

"Espere até que eu termine com a tabela de despesas, meu senhor", disse Fergus, despreocupado. "Ou lorde Samael vai me matar de novo."

Hastur virou algumas páginas descoloridas da prancheta mofada. "Você tem sorte de eu estar com pressa", disse, e saiu com um itinerário para o dia.

No Nível Cinco, Hastur parou para observar os andares do poço de larvas de cima de uma passarela. Ele riscou no cronograma como Normal.

Até então, ele ouvia numerosos pares de passos seguindo-o. Esperava que eles fossem embora, mas no final não teve tanta sorte.

Uma voz alegre disse: "Dia ruim, Sua Desgraça."

Hastur levantou muito lentamente os olhos negros de carvão para ver quem ousava ser alegre em sua presença.

Legion estava sorrindo ― todos os dez mil dele (embora Hastur contasse apenas vinte na maioria das vezes antes de desistir). Nenhum Duque gostava de demônios coletivos, mas o inferno sem hordas era como o céu sem hostes. Legion em particular era um sujeito empolgado, estando na maioria dos dias figurativa e literalmente fora de si.

Good Omens (Belas Maldições) - Segunda TemporadaOnde histórias criam vida. Descubra agora