Estávamos todos de preto, a única cor que era adequado usar nesse momento angustiante. Sempre achei preto poético, mas hoje ele está mais triste do que nunca. Lágrimas escorrem da maioria das bochechas, por mais que não seja 100% visível por causa das máscaras -igualmente pretas- que as cobrem um pouco. Agora me questiono, se as pessoas choram pela garota desfalecida e em um pote a alguns quarteirões daqui, ou por saber que o caixão está vazio e as cinzas não podem ser espalhadas. Alguns olhares encaram o reverendo falando sobre a garota que ele não conhecia, mas parecia doer nele também. Outros encaravam o caixão, mas a maioria olhava pro chão. Talvez impactados demais pra sentir alguma coisa além de dor, muita dor.
-Que Abby descanse em paz!- O pastor fala e todos repetem em uníssono.
Thomas que estava ao meu lado segura minha mão, a apertando com leveza. Apesar deu o ter usado durante um tempo pra que Abby ficasse viva, oque infelizmente não aconteceu, é passado. Ele não precisaria saber, foi uma necessidade do momento, do desespero de perde-lá. Uma parte de mim se culpa por ter me aproximado de primeira somente pra tirar informações, a outra faria de novo, faria melhor. Mas Cecília Campbell tem sentimentos, profundos e incompreendidos, que foram despertados pelo garoto a minha direita. Eu ainda estou extremamente chocada pra sentir algo além de ódio e dor, ódio por mim, e dor por todos.
-Vai andar um pouco filha.- Meu pai diz colocando a mão em meu ombro, enquanto minha mãe também chorava ao seu lado. Abby foi minha primeira melhor amiga, e apesar de termos nos afastado com o passar dos anos nossa conexão sempre foi a mesma quando nos reencontravamos.
Assinto com a cabeça ao pedido dele e começo a andar com Thomas ao meu lado. Ele veio a pedido da família de Abby, acho que se sentiram levemente culpados por terem me pedido algo indesejável, mas assim como eu eles sabem se tivesse mesmo um caminho que acabasse com Abby viva todos percorreriamos ele. Andei alguns passos, longe da minha famílias e da multidão. Parei perto de uma árvore mais distante, olhei pra Thomas buscando conforto. O mesmo assentiu com a cabeça sem eu ter dito nada, e o abracei com uma certa hesitação, aninhando minha cabeça em seu peito.
Deixei as lágrimas despencaram enquanto sentia o movimento de suas mãos subindo e descendo numa tentativa de me acalmar. Queria sentir sua pele naquele instante, mas não era possível, não agora pelo menos. Depois de certo tempo afastei-me dele, ele beijou o topo de minha cabeça com a maior sutileza o possível, mas nosso momento foi interrompido por um empurrão que me fez cair no chão.-Você!- A garota loira e de rosto inchado aponta pra mim- Você deixou isso acontecer.- Ashley diz de forma imperativa, a havia visto antes mas decidi não falar ainda com ela. Parecia tão mal quanto eu, ela a amava de um jeito que eu não poderia.
-Do que você tá falando?- Pergunto me fazendo de tonta e levantando do chão.
-Se você tivesse sido mais direta teria conseguido ter mais informações, e Abby estaria viva!- Ela fala visivelmente irritada apontando o dedo pra mim.
-Do que ela está falando Cecília?- Thomas pergunta totalmente perdido.
-Bom, acho melhor vocês conversarem.- Ashley diz se afastando- Espero que você viva com o peso de ter deixado ela morrer.- Ela fala saindo com passos pesados.
-Oque ela quis dizer com você ter deixado Abby morrer?- Ele pergunta me olhando com os olhos semicerrados.
-Eu vou te contar.- Respiro fundo e seguro suas mãos....
-E foi isso...- Digo receosa- Me desculpa pelos motivos é que eu não sentia nada na época, e acredite. Me arrependo por parte.-Sorrio fraco e o sinto acariciar minha mão.
-Ei...- Ele levanta meu rosto que encarava o chão- Não fica assim, tudo bem okay? Ela era sua amiga, e acredite, não somos todos inocentes.- Ele solta um riso abafado- Mas oque você sente agora?
-Bom eu...- Digo meio tímida e hesitante,mas me toco do que ele diz- Oque você quer dizer com nem todos sermos inocentes?- Ele pisca os olhos e sua voz falha, eu afasto minhas mãos da dele e recuo um passo pra trás.
-É complicado...- Ele engole em seco e olha pra mim- Iria ser você, depois da Abby.
-Como?- Pergunto tentando entender se era mesmo oque eu estava pensando.
-Seus registros médicos falam que você tem uma imunidade alta, você seria perfeita pra testes. Mas não mais, encontrei alguém pra ir por você.- Ele evidentemente intimidado com meu olhar furioso
-Então eu iria ser infectada?- Pergunto incrédula- Você sabia que Abby estava morrendo?
-Então, eu...- Ele é interrompido por minha mão estalando em sua bochecha.
-Se você me procurar, eu juro pela minha amiga morta que eu arruino sua vida!- Exclamo com os olhos ardendo, não queria mais chorar, não na frente dele. Saio a passos pesados e coração apertado, sem saber oque dizer ou sentir.
-Espera!- Ele fala me alcançando e entrando na minha frente- Porque está tão irritada? Você me usou e eu não fiquei tão bravo.- Ele está tentando justificar? Não posso acreditar.
-Seu argumento não justifica em saber que minha amiga estava morrendo, que eu era a próxima da lista e ainda sim mais alguém vai morrer.- O empurro tirando-o da minha frente.
-Ceci vem cá por favor...- Ele diz com a voz chorosa quando eu voltei a andar- Eu te amo.- Ele diz e eu paro, entro em choque.Penso em virar, olha-lo uma última vez. Mas não posso, não devo. Não conseguia entender como ele agiu com tanta naturalidade ao contar que sabia que minha amiga iria morrer e talvez ia ser a próxima, e mais uma vez eu me odiei, por confiar em quem não devia, por me envolver com quem não podia, fazer coisas que não correspondiam as regras impostas.
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Um Amor Contido
Romance{17/17) HISTÓRIA TERMINADA •♡•No ano 2075, 55 anos depois da pandemia global do covid-19 também conhecido como Coronavírus a população se estabilizou. Existem regras de vestimenta e cuidado, pois agora o vírus e mais forte e se espalha mais rápido p...