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Meu pai estala um beijo em minha bochecha, pegando a mala do chão em seguida e acenando para mim enquanto percorre o pequeno caminho da entrada de nossa casa até o meio fio, onde um táxi o aguarda. Ele me lança um último beijo, quando o carro dá partida em direção ao aeroporto Internacional de São Francisco. Era o início das férias de verão do meu primeiro ano, e eu realmente desejava que ele não tivesse que viajar tanto a trabalho e pudesse ficar comigo pelo menos um pouco. De qualquer forma, sempre foi assim, Gavin Collins sempre passou semanas viajando, durante toda minha infância e adolescência e eu já deveria estar acostumada. Não me entenda mal, apesar de tudo, meu pai nunca foi ausente, mesmo de longe, ele sempre foi meu porto seguro. Suspirando, eu giro sob os calcanhares, retornando para dentro de casa. Na sala, encontro minha mãe vendo assistindo um programa de televisão que falava sobre moda. Típico. Ou ela está vendo alguma dessas merdas, ou está pendurada no telefone com uma das suas amigas discutindo sobre o episódio que acabou de passar. Ela desvia o olhar para mim por apenas uma fração de tempo.

- Você deveria pentear esse cabelo - Seu rosto assume uma expressão de desgosto, e ela faz questão de deixar seu descontentamento bem evidente.

- Eu acabei de acordar, pode me dar um desconto? - Meu tom sai um pouco mais rude do que era aceitável, eu sabia que era iria me retaliar em seguida, mas eu estava cansada da sua implicância.

- Se você não pode mantê-los arrumados, então deveria simplesmente alisá-los.

E lá estava. Se a relação que eu tinha com o meu pai beirava a ideal, com a minha mãe a história já era completamente o oposto. Ela não suportava a ideia de que eu amava meus cabelos cacheados e sentia orgulho deles. Ela não suportava o fato de que eu era a cópia completa de meu pai e de sua família. Talvez, eu desconfio, seja pelo fato de que ela nunca realmente o amou, foi apenas a melhor oportunidade que ela encontrou de deixar a casa dos meus avós. Desde pequena, Michelle tenta me convencer a alisá-los. Se você me perguntar, eu até mesmo acho que ela tenha se arrependido de casar com meu pai e passar para sua filha as raízes mixegenadas dele.

Minha mãe, se é que ela pode receber esse título, sonha com o dia em que eu serei como as meninas dos programas que ela venera. Cabelos lisos, megahair, extensões de cílios, toneladas de maquiagem, vestidos tubinhos e saltos altos. O único empecilho aqui é que essa não sou eu. Nem de longe, afinal eu estava muito bem com as minhas calças moletom e meu cabelo que espetava para todos os cantos ao acordar.

- Eu gosto dele assim e felizmente, não há nada que você possa fazer sobre isso a não ser aceitar. Agora se você me dá licença eu vou - Não consigo terminar a frase, pois ela me corta na mesma hora.

- Estou farta dessa sua atitude, Eloise! - Seu rosto se vira para mim, e esses são os poucos instantes em que ela se importa comigo: quando está me corrigindo, ou gritando.

Eu fecho os olhos ao ouvir ela mencionar meu nome do meio. A maioria das pessoas não sabem sobre ele, principalmente porque eu o odeio. Não sei qual a relação desse país com os nomes compostos, mas eu vou dar minha opinião: é ridículo. Claramente, minha mãe não se importa, e me chama assim em qualquer ocasião em que eu a tirasse do sério, apenas porque ela sabe que isso vai me irritar.

- Que atitude? - Eu retruco, mantendo minha atitude desafiadora.

- Você está constantemente de mau humor! Talvez você devesse arrumar um namorado! - Há um pequeno sorriso sarcástico que brota em seus lábios. Ela sabe que atingiu um nervo.

Pressiono meus lábios para segurar um palavrão dentro da boca. Sem olhar para ela novamente, subo as escadas como um furacão, batendo a porta do meu quarto com toda a força que consigo, para ter certeza que ela escute lá embaixo.

Innocent OneOnde histórias criam vida. Descubra agora