Coragem

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— Insônia logo hoje? O que fiz para merecer tamanho disparate?

Antes mesmo do sol nascer, sentou em frente à janela aguardando que os primeiros raios surgissem — se é que de fato apareceriam, afinal os invernos se caracterizam pela inconstância e a dificuldade em realizar as previsões.

Bebendo um café bastante forte, ela se prepara para tentar a primeira oportunidade que havia caído sobre ela de uma forma muito satisfatória. Assim que o sol acanhado começa a aparecer naquele horizonte coberto pela umidade, ela escolhe o vestido mais bonito, o casaco grosso de lã na cor azul e as botas em preto. Estava pronta para ir até a residência dos Bauffremont-Courtena, enquanto é brindada pelo sol das oito e trinta da manhã.

ABRA A PORTA.

DEIXE-ME ENTRAR.

Na última noite havia dormido apenas três horas, tempo excessivamente abaixo do necessário, mas precisava completar as apresentações à Câmara e pensar numa solução para a última reunião que tivera na cidade vizinha. Apesar de todo o cansaço, o sono havia desaparecido com o café preparado por Gavin, que talentosamente moi os grãos do tipo especial florado e logo cedo já apronta o bule, assim que vê que o patrão está com um leve mal humor.

Concentrado em uma nova crítica ao sistema opressor, Francis redige habilmente na grande companheira das noites em claro: a máquina de escrever. Sentando na confortável poltrona feita sob medida, ele passa boa parte do tempo criando novas normas de inserção do povo nas decisões da Escócia. A concentração necessária é, algumas vezes, interrompida por Rosalie, que chega até o ambiente correndo e muitas vezes acaba esbarrando nele, antes de abraça-lo fortemente.

— Senhor, peço licença.

— Gavin, pode entrar! — Chamou, com um sorriso comedido nos lábios.

— A moça chegou. Posso pedir que entre? — Perguntou, ainda da porta do escritório, enquanto esfrega uma mão na outra.

— Ah, sim, claro. Justine me informou sobre ela. Catherine, não? — Questionou, enquanto passa os olhos sobre aquele texto incompleto e que demandará pelo menos mais duas horas de trabalho e outros apontamentos consistentes.

— Sim senhor.

— Traga-a até aqui, estarei esperando. — Retornando ao corredor, Gavin para por um instante, ajusta os óculos e resolve voltar e ir até mais perto do patrão para informar do que o incomoda.

— Senhor?

— Sim? — Olhando para ele, percebe que quer falar de algo que o aflige. Ele não sabe do que se trata, mas o velho amigo carrega um jeito diferente ao manifestar preocupação com a família que escolheu. Francis sabe que aquelas mãos arranhadas pelas roseiras que Gavin tanto ama ficam, quase sempre, involuntárias e se movem em um vai e vem sobre os bolsos das calças.

— Posso manifestar minha preocupação? — Ele solicita, um tanto sem jeito.

— Claro, por favor Gavin.

— O senhor tem conhecimento de informações sobre a moça? — Questiona, visivelmente ansioso.

— Não se preocupe, meu amigo. Acredito que estamos no caminho correto. Conhecemos Justine e sabemos que ela não traria alguém que não fosse extremamente confiável.

— É que eu me preocupo com a menina e... — A inquietação era genuína, afinal havia participado da vida deles desde muito cedo e sempre foi muito zeloso nos cuidados com Rosalie, que tratava como uma neta.

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