Faziam dois dias. A neve branca caindo no meu rosto era gelada e o vento frio fazia meus cabelos longos e castanhos voarem. Minhas pernas estavam dormentes e eu estava morrendo de medo. Os moradores da pequena cidade próxima a montanha de Tzaaz me receberam muito bem, eles me deram agasalhos, comida e água, e falaram para eu ter cuidado com os lobos. Todos os meus mantimentos já tinham acabado e eu tinha dúvidas se os Níger eram mesmo reais.
Me instalei em uma caverna para descansar. O local cheirava a carne podre e tinha alguns ossos por ali, mas não me importei. Pelo menos não nevava lá dentro e o chão estava limpo.
Escutei um barulho vindo de fora da caverna e me apressei para me esconder atrás das grandes rochas. Me assustei quando vi um trol enorme entrando e segurando algum animal em suas mãos.
A criatura humanoide tinha os braços longos e musculosos, seus dedos com pontas de garras. A grande boca do trol estava cheia de dentes irregulares que agora mastigavam a pele daquele pobre animal que ele carregava. A característica mais distintiva é o seu terceiro olho no centro da testa. Sua pele é coberta por um casaco marrom, grosso e peludo.
"Coragem, Ruby", pensei. Não sei porque, mas aquela criatura era mais amedrontadora do que um dragão. Tentei me movimentar sem fazer barulho algum, mas falhei. O grande animal virou a sua cabeça para onde eu estava e começou a farejar, ainda com a sua refeição em mãos, até as grandes rochas, onde eu me escondia. Procurou pelo o que tinha feito o barulho, mas felizmente não encontrou. Voltei a me arrastar até a saída da caverna e quando percebi que a sequência de rochas tinha acabado, me levantei cautelosamente e corri. Corri o mais rápido que pude, sem olhar para trás. Meu coração estava acelerado e todos o meu corpo arrepiado, provavelmente nunca esqueceria aquela criatura.
Caminhando durante mais alguns minutos, finalmente cheguei até o castelo dos Níger. Dominique não estava brincando quando disse que ficava praticamente no topo da montanha. Andando através da longa escadaria de pedra coberta de neve, dei de cara com os portões de ferro. Todas as paredes tinham um tom tomado por um cinza escuro e as janelas eram enormes. Bati na grande porta à minha frente e ela se abriu sozinha.
Tomei a liberdade de entrar. Tudo ao meu redor era rústico, mas luxuoso. Todas as coisas do chão ao teto eram feitas de pedra, o ambiente era bem escuro, não daria para enxergar nada se não fosse pelos lustres e as velas. Estátuas de deuses e animais ocupavam todo o espaço. No centro do castelo tinha uma grande sala vazia, nela três homens negros vestidos com túnicas cinzas estavam de pé.
- Com licença. Vocês são os Níger? - perguntei, enquanto me aproximava. Em vez de me responderem, eles se curvaram. - Pelos deuses, vocês não precisam fazer isso. - reclamei.
- Os outros não falam. Suas vozes são poderosas demais para você suportar. - escutei uma voz grossa vindo por trás de mim e me virei. O homem com a pele negra, também vestia uma túnica e fez a mesma reverência que os outros três tinham feito.
- Humm... para que vocês estão fazendo isso? - perguntei confusa.
- Então... o Dragonato aparece neste momento ao fim de uma era. - ele disse e riu em seguida. - Muito prazer, somos os Níger. - ele se curvou e eu revirei os olhos. - Esses são Dagolis, Dezenyr e Apolo, meus irmãos. - ele apontava para cada um e quando o nome era dito eles se curvaram respectivamente
- Me chamo Ruby. Ruby Woods. - me apresentei.
- Ruby Woods. - pelo visto ele era o único que podia falar. - Agora veja se você realmente tem o dom. Mostre-nos, Dragonato. Vamos ouvir a sua voz.
- Me desculpa. - eu cocei a nuca e fiz uma careta. - Eu não sei como fazer isso.
- Sinta e faça. - concordei com a cabeça, dei alguns passos para trás e fechei os olhos. - Tente se lembrar dos melhores momentos da sua vida. - Bem, não foram muitos. Lembrei de Aspen e também de Hank e Victor, foram pessoas extremamente importantes para a minha jornada. Me recordei do momento em que aprendi a usar minha espada, de quando acertei minha primeira flecha, e, principalmente, quando matei um dragão. - Lembre-se dos momentos que sentiu mais raiva ou medo. - No Túmulo das Cataratas Fúnebres, a cada passo dado minha respiração ficava mais fraca. E com certeza quando a minha cabeça estava prestes a ser separada do meu corpo, se não fosse por aquele dragão. - Agora transforme toda essa mistura de sentimentos em uma coisa só e liberte com a sua voz. - respirei fundo e fingi que nada ao meu redor existia, que tudo aquilo não passava de um sonho, e que quando eu libertasse a minha voz, acordaria.

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REBURN
Fantasia• LIVRO UM DA DUOLOGIA ARGONIANA • "E quando a verdade finalmente amanhece, amanhece em fogo. Mas há um que eles temem. Na língua deles, ele é o Dragonato, nascido do sangue do dragão." Confundida com um Stoermer, uma guerreira é levada em direção à...