2- Jorge

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- O que há de errado com nossa irmã? - pergunto a Estella depois de Valen sair.
Teté da de ombros.
- Não me pergunte.
Estella põe sua tigela na pia e me segue até lá fora quando ouço a buzina de um carro. Meu melhor amigo, Miguel, está em frente a nossa garagem, sentado orgulhosamente em seu Honda Civic, muito velho, com mais de trezentos mil quilômetros rodados.
Ele põe a cabeça para fora do carro e grita para minha irmã:
- Ei Estella! Quer uma carona?
- Não obrigada, Miguel - Ela diz empurrando o óculos para cima do nariz. - Quero pegar o ônibus.
Quando entro no carro, ele me olha, descrente.
- Deixa eu ver se eu entendi direito. Sua irmã caloura quer ir de ônibus?
- Isso.
- Ela é muito excêntrica, Jorge.
- Você quer dizer esquisita?
Miguel me olha de canto de olho. Ele tenta salpicar nossas conversas com palavras mais rebuscadas. Basicamente soa como uma mistura de um estudioso da Ivy League com um menino da floresta. Tiro sarro dele, porque, enquanto ele é um dicionário ambulante, eu procuro usar palavras simples na maioria das vezes.
- Vamos apenas dizer que Estella provavelmente considera andar de ônibus uma experiência social típica do ensino médio e fará uma redação sobre isso para a aula de sociologia. - Digo a ele.
O motor de Miguel da dois pipocos antes de ele sair de ré da minha entrada.
- Como disse, sua irmã é muito excêntrica.
- E a sua irmã? Ela anda por aí como se fosse uma celebridade de Hollywood desde que Aron arrumou aquele bico de modelo para ela.
- Não nego que a minha irmã é excêntrica - Ele diz divertido. - Falando em excêntrica, Chiara Parravicini saiu da sua casa com a Valentina. Achei que tinha errado de casa. Porque ela estava lá?
- Não sei o que Chiara está tramando.
Miguel ri.
- Ela quer ser sua namorada de novo. É o que está tramando.
A ideia me arrepia.
- Não vai rolar.
- No mês que vem é a festa de início de temporada. Talvez ela esteja procurando um par e você seja o cara. Se não tiver outra garota pra convidar, você pode aquiescer e ir com ela. Você com certeza não vai querer chegar sozinho.
Inferno. A festa é a última coisa em que estou pensando.
- Vamos mudar de assunto, cara. Não quero falar sobre a ela nem sobre a festa. Ou em aquiescer, seja lá o que isso signifique. Fala de maneira que gente normal possa entender.
- Não quer aumentar o seu vocabulário, Jorge?
- Não.
Ele da de ombros.
- Certo. Então vamos falar da briga em que se meteu noite passada. Você está bem? Ouvi dizer que foi violenta.
- É. O cara enfiou o braço na Luna.
Olho os nós da mão arrebentados. Eu tinha ouvido dizer que o namorado da Luna fazia boxe e coisa e tal, mas não fazia ideia de que ele a usava como saco de pancadas até noite passada, quando a vi apanhando na praia. Ela tentou disfarçar dizendo que foi a primeira vez que ela a agrediu.
Eu não dou a mínima se foi a primeira ou a quinquagésima vez. O cara tem que entender que você não bate em uma garota sem ter que enfrentar as consequências.
- Eu teria ajudado se soubesse.
Miguel bem se preparando para ser o orador da turma, e ele nunca se mete em confusão. Ele se preocupa tanto com duas notas quanto com sua reputação, e por isso eu não quis envolvê-lo numa briga que podia acabar com a chegada da polícia.
- Dei meu jeito.
Sempre dou um jeito. Miguel usa suas palavras. Eu uso meus punhos.
Diferentemente dele, não me importo com minhas notas, porque, independentemente de estudar ou não, sempre vou mal nas provas e nos testes. Ser um zé-ninguém na escola é minha sina.
O celular de Miguel toca três vezes.
- É uma mensagem da Danna. Lê aí pra mim. - Pede porque se recusa a digitar e dirigir ao mesmo tempo. Ele não tira os olhos da estrada e suas mãos sempre estão no volante. - O que ela quer? - pergunta.
- Ela quer que você termine com ela para que eu possa namora-lá.
Miguel ri.
- Ok, Jorge, o dia em que minha namorada quiser sair com você, é o dia em que você entra pra lista de pessoas de bem.
Isso foi um comentário verdadeiro, mas deprimente.
- Bem, isso nunca vai acontecer.
- Exatamente. - Ele gesticula na direção do celular - Então, o que ela diz?
- Ela mandou um "oi".
- Manda um "oi" de volta.
Eu reviro os olhos.
- Vocês são insuportáveis.
- Ah é? Se você arranjasse uma namorada, o que estaria escrevendo para ela?
- Ninguém arranja uma namorada, idiota. Mas se eu tivesse uma, certamente escreveria bem mais do que um "oi". Ainda mais se eu tivesse um vocabulário como o seu. Provavelmente diria algo a respeito de como pensei nela a noite toda e de como não posso parar de pensar nela.
- Eu mando mensagens apimentadas para minhas outras garotas - diz ele, brincando. - Será que ganho créditos por isso?
- É isso aí.
Todo mundo sabe que Miguel e sua namorada, Danna Paola, são inseparáveis e muito provavelmente se casarão algum dia. Ele não a trairia.
A verdade é que ele não faz a menor ideia de que sou apaixonado por Danna há anos.
Mas eles estão namorando, então, sob o nosso tácito código de honra de amigos verdadeiros, ela está eternamente fora do meu alcance.
Mesmo que eu não consiga tirá-la da cabeça.

His girl- jordannaOnde histórias criam vida. Descubra agora