[VENCEDOR DO PRÊMIO WATTYS 2021 na categoria YOUNG ADULT]
Tem poucas coisas que Eva Aquário não odeia no mundo, e elas são: biscoitos sabor limão, matemática e garotas. De resto, ela faz questão de deixar claro o quanto não suporta.
Eva não suporta...
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EXISTE UMA VARIEDADE absurda de bolos de casamento. Tradicionais, simples, rústicos. Com laços, com pérolas, com babados. De brigadeiro com morango, doce de leite ou de nozes. É claro que eu não dou a mínima para isso mas confesso que sair de casa com o único intuito de provar alguns sabores até que é uma programação interessante. O bolo de limão com cobertura de chantily já ganhou o meu coração.
— Eu acho que deve escolher um bolo de no mínimo cinco andares, Gina. Vão ser muitos convidados, pelo menos da parte do papai.
O problema de todo esse programa é a companhia.
Quando mamãe me convidou para uma tarde de degustação de bolos de casamento, é claro que eu precisei aceitar porque, além de comer bolos de graça, eu estaria acompanhada da melhor pessoa existente na face da terra. Eu só não contava que Cassandra sairia mais cedo da faculdade e que buscaríamos Lola na aula de piano. Pra o meu desespero, os meus planos de passar uma tarde ao lado da minha mãe se tornou um passeio com as Garotas Vinhedo.
Inferno.
— Eu estava pensando em algo mais simples, não tão grande. Uns três andares, talvez? — mamãe diz, folheando um catálogo de bolos enquanto Lola e eu nos revezamos para terminar a cobertura de baunilha que sobrou em um dos pratos. — Tales e eu concordamos em um casamento menor, só gente bem próxima.
Cassandra dá uma risadinha.
— Gina, querida, eu conheço o meu pai. Com certeza ele vai chamar todo mundo da empresa, e somando com os amigos e parentes, vocês vão ter mais de quinhentos convidados, com certeza.
O problema da minha meia-irmã é esse: ela não parece ser o tipo de garota que beija outras garotas. Não estou querendo julgar ou apontar estereótipos ou coisa parecida. Não estou dizendo que ela não deveria beijar garotas e que estou invalidando a sua bissexualidade ou o que seja. É só que, para mim, ela parece hétero pra caramba, e isso me incomoda e me deixa com raiva. Não dela, quero dizer, mas de mim mesma. O meu radar não ter funcionado com Cassandra me faz questionar se ele não está com sérios defeitos.
— Bem, a lista de convidados tá pra ser feita nas próximas semanas — mamãe avisa, sorrindo para a enteada. — Espero que seu pai e eu entremos em um consenso.
O casamento está marcado para o final do ano, mas aparentemente todos os detalhes precisam ser decididos agora, antes mesmo de abril começar. O local já está reservado — um dos chalés da família Vinhedo, fora da cidade —, a decoração já foi escolhida, o buffet praticamente todo definido. Porém as coisas mais difíceis estão tendo que ser decididas só agora. O tipo do bolo é, se já não deu para perceber, uma delas.
— Qual bolo você gostou mais, Lola? — minha mãe pergunta, largando o catálogo sobre a mesa em que estamos e levando todo o seu foco para a menininha a meu lado, seu rosto todo lambuzado de glacê.
— Gostei daquele com cobertura de frutas vermelhas, mamãe Gina.
Reviro os olhos. Odeio quando ela chama a minha mãe de abre aspas mamãe fecha aspas. Mas nem é só isso. Que criança de quatro anos sabe o que são frutas vermelhas? Eu com quatro anos amava bolos de chocolate, e acho que esse era possivelmente o único sabor de bolo que eu conhecia na época. Não gosto de realidades onde crianças de quatro anos preferem bolos com cobertura de frutas vermelhas e não bolos de chocolate. Ou de limão, porque, sinceramente, ele ganha de lavada.