Reticências

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Otária, eu me sentia uma otária. Minha mente armou subsídios para esconder minha infelicidade com relação as reações de Bianca. Eu cedi. Meu corpo inteiro era prova do quanto eu cedi a ela. Mas sou humana. Apenas humana. E nada poderia fazer a não ser lamentar. Não se pode voltar atrás quando se faz algo.

Abri a porta do apartamento e deixei minhas chaves na mesinha habitual, virei-me para a sala e dei de cara com Rafaella em pequenos trajes sentada no sofá lendo um livro. Ela descansou o livro no colo e me encarou com um pequeno sorriso.

- Desculpe, mas quem é a senhorita? Essa casa não te pertence mais.

- É, acho que não, vou passa-la para o seu nome. – disse entrando na brincadeira. O sorriso de Rafa não era de julgamento.

Sentei-me no sofá no lado oposto a ela. Minhas mãos sobre os olhos.

- O que você tem? Pode desabafar comigo.

- Eu sei, só estou com vergonha. Vergonha de tudo que fiz ontem a noite. – senti o sofá afundar, era Rafa se aproximando. Ela pegou delicadamente uma das mãos que estavam em meus olhos e tomou com a sua, entrelaçando. Nossas mãos unidas repousaram sobre sua coxa desnuda. Eu senti paz, com ela eu não sentia vergonha de ser quem era. Eu me sentia em casa.

- Bia? – ela questionou.

- Devo contar? – perguntei para ter certeza se ela queria ouvir meu desabafo sobre minha ex.

- Não em detalhes, por favor.- eu ri do comentário, se fosse Marcus pediria o contrário, em detalhes. – deixa os detalhes para meu namorado safado.

Noite de sábado 21:11

Adrentei o condomínio de casas enormes, estava dentro do carro. Tomando coragem. Já era a terceira vez que abria a porta do carro e não saia. Era um lugar seguro. Minhas mãos seguravam o volante e a qualquer momento eu daria partida naquele carro. Respirei fundo, fechando os olhos.

- Vamos lá, Gizelly. É só a Bianca. Você consegue.

Fiz meu movimento, fechei a porta do carro me dirigi a sua casa. A frente era laranja e a arquitetura moderna. Bem a cara da Bianca. Mesmo do lado de fora dava para ouvir o barulho do funk tocando e algumas luzes piscando.

As sociais de Bianca não eram quaisquer sociais. Ri para mim mesma. Meio mundo de mulheres foi o que eu encontrei. Ok, eu exagerei, mas a casa tinha uma quantidade boa de pessoas dentro, no máximo 20 pessoas, mais mulheres do que homens.

Atraí olhares quando cheguei, porém não me importei. Só queria encontrar Bianca e terminar logo com isso. Fui até a cozinha na expectativa de vê-la, mas não encontrei-a.

- Oi. – uma moça de cabelos pretos escorridos e  sorridente parou na minha frente. – Você está perdida, eu posso te ajudar?

- Eu sou Gizelly. A Bianca me chamou.

- Aaaah, a famosa Gizelly. – ela estendeu a mão pra mim, tinha um sotaque baiano forte, era bonito assim como ela. – eu sou Mari.

- Prazer, Mari. Por que sou famosa? – questionei.

- Você é a ex dela. Bianca gosta muito de você. Apesar de não parecer, ela tem muito carinho por você.

Surpreendi-me com o comentário de Mari. Bianca ter algum tipo de afeição por mim era algo surpreendente. A forma que ela me tratou a seis anos atrás não era de quem possuía carinho uma pela outra.

- Não parece. – eu dei de ombros. Mari me ofereceu uma cerveja e eu prontamente aceitei. Ela me explicou de onde conhecia Bianca e como se tornaram amigas. Ela fazia trabalhos de modelo em Nova Iorque e acabou conhecendo a carioca. Ainda me forneceu informações sobre a antiga relação dela com a DJ pela qual me largou.

- Espero que esteja falando bem de mim, Mariana. – o sotaque carioca era inconfundível, virei-me para ver Bianca sorrindo. Parecia surpresa com minha presença ali em sua casa.

- Você já faz o trabalho todo de espalhar boatos ruins sobre você. – eu argumentei defendendo Mari. A empresária aproximou-se de nós duas. Ela vestia uma camiseta justa, calça moletom rosa, assim como seu chapéu. Bianca sempre teve estilo próprio.

- Você veio. Estou muito feliz em te ver. -  Bianca me lançou um sorriso genuíno.

- Oi Bianca. Casa bonita. – eu disse e bebi um gole da cerveja que Mari me ofereceu.

- Estava preparando o terreno pra você, amiga. – Mari disse e depois voltou-se para mim. – se ela morder, você grita, ok? – Bianca deu um tapa no ombro da amiga, que logo deu uma carreira e se afastou de nós duas.
Ela suspirou e continuou me encarando.

- O que foi? Nunca me viu? – questionei desconfortável com seus olhares sobre mim.

Ela apenas riu e balançou a cabeça. Pegou-me pela mão e me apresentou todos os cômodos da casa. Fui apresentada a todas suas amigas e conhecidas. E fiquei impressionada com a quantidade de sapatão por metro quadrado que Bianca conseguia juntar. Depois disso, ela me levou ao seu escritório.

Era um lugar voltado para a Boca Rosa Beauty, seu material de trabalho estava espalhado pelos cômodos. Havia um canto voltado para seus vídeos, com tripé e luz apropriada, ela sentou no sofá confortável e me convidou a sentar também.

- Então, queria me desculpar pela minha chegada dramática. Não queria te impor minha presença. Só estava ansiosa para te ver. – ela respirou fundo e continuou. – eu pensei muito em você durante esses anos e no quanto fui injusta com você.

Senti que suas palavras eram sinceras. E senti meu coração se acalmar.

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