I. Metida a durona.

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Pisou na embreagem passando para a quinta macha com facilidade. A sirene apitando no capô abria a passagem que desejava mas o carro cinza a sua frente parecia acelerar ainda mais. Pisou fundo encostando na traseira do veículo. Puxou o freio de mão girando o volante ao fazer a curva fechada desembocando em uma rua estreita continuando com a perseguição, as paredes dos prédios antigos parecendo cada vez mais próximas. Percebeu que a rua era fechada quando viu o portão de grades que logo foi arrebentado pelo carro da frente. Saíram no meio da avenida engarrafada, buzinas soavam loucamente, o transito completamente paralisado. Gizelly saiu do veículo e correu por entre os carros, a detetive puxou a chave da ignição saindo do automóvel.

A seguiu até a entrada de mais um beco onde sabia não ter saída, correu pra mais perto mas notou uma pistola ser direcionada para si. Se escondeu atrás de um tonel de lixo enquanto os tiros ecoavam pelo beco estreito. O muro alto estava próximo e Gizelly encurralada.

– Larga a arma. - Manoela gritou de trás do tonel segurando o próprio revólver. - Sabe que não tem saída.

– E quem vai me impedir de sair? - A voz sarcástica da agente ecoou de volta. - Você, cosplay de Dora Aventureira?

– Se for necessário, querida. - Sussurrou saindo parcialmente do esconderijo disparando dois tiros seguidos em direção a voz.

Tornou a se esconder quando os disparos foram retribuídos.

– Qual é Gavassi. Sabe que não vamos sair dessa brincadeirinha de gato e rato. - O grito chegou aos seus ouvidos enquanto analisava a munição.

Havia um outro tonel de lixo mais a frente e provavelmente era ali que a outra mulher se refugiava.

– A única coisa que eu sei é que vou acabar com sua raça. - Rosnou raivosa saindo de trás do escudo.

Apertou o gatilho a cada passo que dava tirando qualquer possibilidade de Gizelly responder e conseguindo se esconder atrás do próximo. Escutou os disparos mais próximos e xingamentos baixos vindo do outro lado do material de lata. Sorriu presunçosa
ao analisar a altura do armazenamento de lixo.

– O que foi, detetive? Desistiu? - A risada debochada da Bicalho acompanhou a voz.

[...]

Observou Rafaella sorver o café expresso mais uma vez antes de repousar o copo descartável sobre a mesa. Permanecia de pé encostada na porta de sua sala, as mãos escondidas nos bolsos da calça estalavam os dedos em meio à ansiedade e nervosismo. A Juíza ainda não lhe dirigia o olhar, os verdes vagavam pela sala do departamento parecendo perdidos. O tom alaranjado do lado de fora da janela avisava que o dia estava amanhecendo. Um gemido baixo saiu de Rafaella que abaixou os olhos para o tampo de madeira, os dedos ágeis limpando rapidamente uma lágrima teimosa que tinha escapado.

Bianca prendeu a respiração, não era pra ser assim, ela não deveria estar em meio a tudo aquilo, estava tudo errado. O ar pesado saiu da boca entre-aberta enquanto andava em direção a mulher sentada em sua poltrona. Se encostou na beirada do tampo da mesa conseguindo ganhar a atenção da Kalimann.

– Eu estou bem. - A voz grossa de Rafaella avisou baixa enquanto terminava de limpar o rosto.

Bianca a considerou por alguns segundos. Rafaella passou as mãos pelo cabelo o jogando totalmente para trás, o lado esquerdo do rosto bonito ainda revelava o tapa forte que tinha recebido. O casaco azul marinho do departamento cobria a roupa casual que tinha escolhido no domingo de manhã, a regata branca e a calça jeans tinham a aparência surrada. Bianca sentiu o sangue ferver ao pensar nas inúmeras possibilidades.

– Eles... - A Capitã engoliu em seco, o ar ficando abafado. - Eles fizeram algo com você? - Sussurrou temendo em ouvir a resposta.

– Ninguém tocou em mim. - Confidenciou desviando para o copo sobre a mesa.

– Seu rosto.

– Ele me deu um tapa ou dois... - Pausou fechando os olhos tentando se livrar da lembrança. Escutou Bianca inalar profundamente. - Eu estou bem. - Reafirmou parecendo querer se convencer.

– Não está não. - Sussurrou em um riso nervoso enquanto brincava com as próprias unhas.

Rafaella levantou a cabeça olhando para o sorriso gasto no rosto de Bianca, a aparência tristonha tomando conta do semblante bonito. A luta interna se tornando cada vez mais externa.

– Você foi sequestrada, houve aquele incidente mais cedo... - Cruzou os braços fitando o chão.

– Eu matei um homem, mas vou ficar bem. - A mais velha sussurrou rouca desviando os olhos para o copo sobre a mesa novamente.

– Vai. - Fungou levantando o rosto em direção ao teto tentando respirar melhor.

O som fez a Kalimann franzi o cenho em direção a morena novamente, os olhos castanhos pareciam inundados por lágrimas.

– O que quer dizer?

– Que talvez... - Pausou massageando uma das têmporas com os dedos. Rafaella conhecia aquele ato: Tinha que fazer algo que não queria. - Talvez você devesse voltar para o Texas, ir pra casa de seus pais. - Fechou os olhos engolindo em seco. - Eu não quero que você fique se sentindo culpada por aquele cretino, o que aconteceu no estaleiro foi em legítima defesa e não é necessário você ficar por aqui. Ainda não sabemos onde Bicalho foi parar. O melhor seria você sair da cidade por algum tempo.

– Fugir? - Perguntou seca. - Você quer que eu fuja pra casa dos meus pais? - Rangeu os dentes levemente irritada.

– Rafaella. - Puxou o ar com dificuldade, flashes aparecendo diante de seus olhos. - Tente entender, eu não posso colocar você em perigo novamente. Não sabemos qual a ligação entre Gizelly e Felipe. Não sabemos se ela sabe o que aconteceu dentro daquele lugar e não sabemos se vai querer se vingar.

– Eu não acredito que está com medo dela. - Bufou negando com a cabeça. - Só falta você querer se afastar de mim.

– Talvez seja o melhor pra você. - Cerrou os punhos arrancando forças para continuar à falar deixando a Juíza boquiaberta. - Meu trabalho inclui riscos e eu não quero arriscar você. Isso tudo é minha culpa. - Soltou fechando bem os olhos. - Não devia ter envolvido
você nisso.

– Para com isso. Você não tem culpa de nada.

– Tenho sim. - Abriu os olhos focando na Kalimann. - Ele foi atrás de você porque queria me atingir, Rafaella.

– Você me salvou. - A sombra de um sorriso apareceu no canto dos lábios da juíza ao soltar a frase. - Estou segura com você.

– Não diga isso. Nós tivemos sorte. Todos os dias eu saio de casa sem medo de enfrentar qualquer coisa, mas agora? Agora eu só penso que não posso me dar ao luxo de permitir que você fique no meio disso tudo. - Gesticulou enquanto a voz subia gradativamente. - Você não imagina o estado no qual eu fiquei quando descobri que estava no poder deles. Eu não sabia onde ou como estava, a única coisa que conseguia pensar era que por mais que eu fizesse tudo o que me pedissem eles iriam te matar. - A voz oscilou na última palavra. - Eu fui muito descuidada. - Disse baixo, o cenho franzido enquanto olhava perdida para o chão. - Se eu não fosse tão metida a durona e tão atrevida não precisaríamos ter passado por tudo isso. Você não precisaria ter feito aquilo.

Rafaella se levantou após a explosão soltando um suspiro compreensivo. Se colocou entre as pernas da Andrade acariciando o queixo da mulher com o polegar.

– Se você não fosse tão metida a durona e tão atrevida eu não te amaria tanto.

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Rabias, vocês estão vivas depois do dia de hoje?

A Bia mandando um beijo especialmente pra Rafa e explicando o nosso fandom, morri mas ressuscitei para postar pra vocês.

FESTA NA TORRE 🗼

The Middle | Versão RabiaOnde histórias criam vida. Descubra agora