The Middle | Versão Rabia

I. Agente Bicalho.

Bateu a porta do carro segurando o copo de café na mão livre. Sentia os ombros pesados, a ansiedade batendo forte com a náusea. Balançou a cabeça ajeitando o óculos de sol no rosto, tomou um gole da cafeína quente tentando recuperar a postura fria. Subiu os degraus da delegacia ainda brincando com a pequena bola de basquete que carregava no chaveiro. Os pés a guiaram até o local de trabalho, só queria desmoronar em sua poltrona e colocar em pratica o que estivera pensando ao longo da semana, mas aparentemente isso não era possível. Parou abruptamente na soleira da porta, retirou os
óculos revelando os olhos duros estudando o interior da sala.

– O que está acontecendo aqui? - A voz forte e rouca soou chamando a atenção dos cinco.

Gavassi se virou prontamente para a porta com os braços cruzados, a expressão facial surpresa pedia desculpas. Rodrigues não lhe dirigiu o olhar mas pode perceber como estava tenso pelo maxilar rigido. Dois homens de terno e gravata presenciavam a cena parecendo indiferentes e distantes. Bianca olhou mais incisiva em direção a mulher que analisava alguma pasta sobre sua mesa, SUA mesa.

– E você deve ser a Capitã. - A voz debochada saiu da boca larga.

Bianca observou a mulher se levantar e dar a volta na mesa para que ficassem frente a frente. Os cachos castanhos batiam na cintura e fios dourados aguçavam o brilho. Os olhos tão escuros quanto os da Capitã lhe encaravam sem receio. O rosto redondo tinha uma aparência corada e saudável. A calça preta marcava bem o corpo, a camisa azul clara era coberta pela jaqueta de couro que fazia par com as botas de salto a deixando ainda mais alta. A sombra de um sorriso tomou o canto dos lábios coberto por gloss notando a personalidade forte e defensiva da Capitã mas mesmo assim estendeu a mão para a cumprimentar.

– Agente Bicalho. - Se apresentou sem desviar os olhos azuis dos castanhos. - Gizelly Bicalho. - Deu de ombros.

Bianca cerrou os dentes lançando um olhar para a mão estendida. Tinha duas opções: Ou se apresentava devidamente para realizar uma conversa civilizada, ou expulsava todos daquela sala a gritos e balas. Por mais que a segunda alternativa fosse tentadora, apertou
a mão estendida com um pouco mais de força.

– Capitã Andrade. - Respondeu seca. Pela visão periférica pôde perceber a Gavassi suspirar aliviada. - Agora podem me dizer o que está acontecendo aqui?

A pergunta veio grossa desviando para chegar a poltrona almejada. Repousou o copo de café sobre a mesa onde pode reconhecer os papeis que Gizelly estudava. Olhou para cima buscando a resposta que não veio para sua pergunta. Rodrigues e Gavassi se entreolhavam temerosos, a Agente bufou impaciente revirando os olhos.

– Tenente? - Bianca tentou mais uma vez fuzilando Rodrigues com o olhar.

Manoela coçou a nuca se desencostando no armário de ferro para encarar a morena raivosa.

– Os mandaram para nos ajudar até o desfecho do caso. - A voz firme e grossa do homem entrava em contradição com a aparência insegura.

– Oh... - Fingiu espanto cruzando as mãos sobre o tampo da mesa. - Verdade? - Desviou para a Agente no meio da sala.

– Nos mandaram para cá antes que virasse um problema federal. - Bicalho deu de ombros.

Uma risada fraca saiu da garganta da Capitã que umedeceu os lábios descansando as costas na poltrona.

– Nos deixem a sós. - Disse aos outros. - Preciso conversar com a Agente Bicalho.

– Bi... - Gavassi rogou.

– Manoela, vá. - Mandou com a expressão dura.
As duas esperaram que cada um passasse pela porta. O Tenente foi o último a fechando atrás de si.

– Bom. - A dona dos olhos café começou se sentando na cadeira vaga. - Você precisa me contar seus métodos por aqui porque desde que cheguei eles estão com essa
expressão de pavor.

– O que você quer? - Bianca cortou irritada.

– Você os coloca ajoelhados no milho? - Ignorou a pergunta da Capitã.

– Por favor, eu estou com um péssimo humor então dê graças a Deus que ainda não te joguei pela janela.

– Óh, mas são três andares. É muito perigoso. - Caçoou apoiando o queixo na mão direita.

Bianca estalou o pescoço procurando respirar, mas o ar dentro da sala parecia cada vez mais escasso.

– Por que vocês estão aqui? Eu disse que não queria o FBI envolvido e não preciso de alguém como você tentando mandar em mim. Não sou muito fã de receber ordens.

– Eu estou adorando esse circo tanto quanto você, então porque não damos as mãos e encerramos logo esse filme? - Gizelly respondeu monótona. - Eu poderia muito bem estar na califórnia pegando umas ondas ao som de Olha a Onda e olha para onde me mandaram. - Indicou a sala fechada.

– Você não consegue falar sério por um segundo? Como querem que eu respeite alguém como você? - Elevou a voz se irritando ainda mais com o sarcasmo barato.

– Me desculpe, mas parece que você não respeitaria ninguém. - Deu de ombros mais uma vez. A indiferença estava deixando a Andrade maluca. - E eu não estou aqui para mandar em você. Estou aqui para trabalharmos juntas.

– Trabalharmos juntas? - Gargalhou falsamente. - Sério, eu não preciso do FBI. Meu departamento já é o suficiente então podem arrumar as malas e sumir daqui.

– É suficiente? Pois não parece. - Cerrou os olhos venenosa. - E se não fosse a incompetência de vocês, eu e os outros não estaríamos envolvidos nisso.

O fogo se alastrou pelo corpo de Bianca a fazendo tremer levemente. Cerrou bem os punhos se controlando para não avançar na mulher a frente, mas o sorriso cínico estampado naquele rosto não estava ajudando em nada. Os dentes estavam bem firmes um contra o outro enquanto o nariz puxava o oxigênio com dificuldade. Viu Gizelly se levantar confiante e se dirigir a porta.

– Pode ficar tranquila... - Lançou os olhos para a morena ainda sentada. - Vou terminar o serviço e ir embora mais rápido do que imagina. - Sorriu mais uma vez antes de sair.

Escutou a porta se fechar antes de desferir um soco no tampo de madeira. Quem aquela mulher pensava que era? Passou as mãos pelo cabelo com as palavras de Gizelly ainda ecoando em sua mente. Se levantou mal humorada saindo da sala e batendo com força a porta atrás de si. Parou para olhar as expressões assustadas de alguns que permaneciam ali, ignorou todos rumando para a saída.