Crônicas Ardentes - Rainha Flamejante

Allend

Já fazia uma semana desde que Adam completara seus dezessete anos, mas algo o deixou realmente muito furioso.

- Já sou grande o suficiente para ao menos saber dos problemas. - Resmungava o garoto consigo mesmo. - Mesmo assim eles ainda me tratam como um pirralho!

A indignação de Adam se dava ao fato de que todo o vilarejo parecia muito preocupado naqueles dias, mas sempre que Adam perguntava o motivo, eles faziam uma cara de espanto e lhe cortavam ou mudavam de assunto rapidamente.

Naquela última semana Adam se focou tanto em explorar a floresta que nem sequer chegou a ir aos portões de Helheim. Mesmo o velho Luiz dizendo que era perigoso adentrar a floresta, Adam ia, cauteloso, porém, sem medo.

O velho Tony, que supostamente lhe ensinaria um pouco sobre combate, aparentemente havia pegado uma doença mágica e por isso não poderia ajudar-lo por enquanto.

Ele andava pela floresta segurando sua adaga, para não se esquecer do caminho que havia percorrido ele fazia pequenos cortes nas árvores pelas quais passava.

Enquanto caminhava, Adam ouviu o canto de uma ave, de primeira ele imaginou ser um alma-de-gato, um pássaro de penas vermelhas que era comum naquela região, porém, não era fácil de encontrar um durante o inverno.

Ao olhar no topo das árvores ele reconheceu a penugem do pássaro que assentava-se sobre os galhos secos de uma imensa árvore. Era um japim, um pássaro de penas pretas e amarelas que tinha o hábito de imitar o canto de outros pássaros e algumas vezes até mesmo pequenas frases ou palavras.

Adam olha o pássaro por um momento, ver um japim era sinal de boa sorte. Por sempre estar imitando outros pássaros era raro ouvir seu canto original, alguns até mesmo diziam que a melodia da pequena ave, quando não estava a imitar outros pássaros ou pessoas, trazia sorte e curava qualquer um que a escutasse.

- Socorro! Socorro! - Gritou a ave antes de abrir as asas e voar para longe.

Subindo rapidamente por sua espinha um calafrio trouxe um arrepio a Adam. A brisa suave balançava seus cabelos enquanto seus olhos arregalaram e o medo e a ansiedade começavam a consumir seu peito. Ele sabia que aquele pássaro naquele momento, ao invés de sorte, transformou-se em um péssimo sinal.

Adam e os outros órfãos, quando menores, brincavam com diversos japins que apareciam perto do lago de vez em quando, eles gritavam seus nomes e riam enquanto esses pássaros repetiam. No entanto, eesses pássaros não costumam repetir o canto por mais de um ou dois minutos, costumam dizer que esses pássaros tem memória curta.

O pedido de socorro repetido pela ave era um sinal de perigo claro, alguém nas redondezas havia se dado mal, provavelmente um caçador do vilarejo vizinho. No entanto, a floresta em que Adam estava era muito próxima aos Pântanos do Sul, poderiam haver bradadores ou corpos-secos por aquelas bandas e ele não queria encontrar com nenhum desses dois.

Bradadores e corpos secos são muito semelhantes mesmo sendo muito diferentes, os dois monstros, na verdade, se completam.

Adam sabia que os corpo-secos antes de se tornarem criaturas eram homens ou mulheres muito cruéis, tão cruéis que a própria terra rejeitou seu corpo enquanto Valhala e Helheim rejeitaram sua alma.

O corpo rejeitado pela terra tornava-se um corpo-seco, uma muito perigosa criatura com feições já pútridas. Por inveja daqueles que possuem uma alma, essa criatura ataca qualquer ser vivente que vê por seu caminho.

Já a alma abandonada torna-se um bradador, um ser fantasmagórico com marcas profundas e negras por baixo de seus olhos marcando as lágrimas que caem cada vez que essa criatura dá seu poderoso grito melancólico. Seus cabelos quase sempre negros e seu corpo como um véu os caracterizavam, já suas mãos pretas e enormes eram usadas para atacar as pessoas. As histórias dizem que essa criatura nefasta arranca à força a alma dos homens, transformando-os em cascas vazias e sem vida. Esse monstro está sempre em busca de um novo corpo para habitar, mesmo não podendo habitar outro se não aquele que em vida foi seu.