Boneca de pano.

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Harry voltou duas horas depois e parou na porta apreciando Edgar dormindo, neste estado ele parecia inocente e dócil, quase como um anjo indefeso, seria impossível crer que alguém tão jovem tenha feito tanto estrago por onde passou, ele mesmo parado ali chegava a cogitar como isso realmente foi possível, mas infelizmente foi.

Caminhou lentamente e passou os dedos nos cabelos mal tratados, parou olhando mais de perto, o rosto parecia levemente diferente, mais doce, de pele mais amendoada e de cílios muito mais longos do que se lembrava, neste momento um par de olhos que pareciam jóias preciosas se abriram subitamente, certamente nunca antes foram tão azuis, como isso era possível?

-O jantar está pronto, conseguiu descansar?

Edgar suspirou, o sonho ainda vívido na mente e a única pessoa para quem poderia perguntar estava na sua frente com cara de poucos amigos apesar da frase amigável.

-E-eu conheci uma garotinha? Uma garotinha com uma boneca de pano nos braços?

Harry o ajudou a se sentar e puxou a cadeira de rodas para perto pensando sobre esse assunto absurdo.

-Você nunca gostou de crianças e as chamava de coisinhas remelentas e estúpidas, imagino que nunca conheceu nenhuma, muito menos uma com boneca de pano. Aliás tenho certeza disso, porque pergunta?

Edgar suspirou, deveria contar os sonhos que vinha tendo desde de que acordou no hospital? Podiam ser uma pista? Ou seria ridicularizado de novo?

-Foi só um sonho, nada demais...

Harry o colocou na cadeira  e o empurrou ao banheiro sem maiores comentários o deixando sozinho por alguns momentos, pelo menos era capaz de dar-lhe alguma privacidade, no hospital o Dr.Liam o ajudou a se adaptar a nova condição e conseguia se mobilizar usando a cadeira para usar o banheiro, era difícil e cansativo, mas pelo menos tinha privacidade.

Depois de lavar as mãos conseguiu rodar a cadeira para fora e lá estava Harry o aguardando com seus olhos de safiras e seu semblante sempre carregado, rancor transparecendo em cada fibra do corpo bonito e forte, em outra ocasião o evitaria com todas as forças de seu ser, mas neste estado tudo que podia fazer era se deixar levar, não tinha mais nada a fazer.

O jantar foi tudo, menos agradável, as comidas eram todas estranhas ao seu paladar, ele não conhecia os talheres e era observado pelos empregados que os serviam com olhos de águia e má vontade genuínas.

-Não está do seu agrado? Perguntou Harry enquanto pegava uma tigela com scargot a fricassê que deu náuseas em Edgar.

-Eu não estou com fome e não reconheço esta comidas, será que posso voltar ao quarto?

Harry parou e o observou atentamente, no passado se a mesa não tivesse uma grande variedade de frutos do mar, comidas francesas ou algumas iguarias exóticas certamente seu marido ficaria irado, o prato de Fricassê de Scargot era seu favorito entre todos, como ele podia agora ter essa reação estranha sobre a comida? 

Um pouco irritado Harry mandou trazer uma sopa quente de legumes e torradas, afinal o menino não podia ficar sem comer nada, como se recuperaria?

-Edgar...Se estiver fingindo...Eu juro que vai se arrepender. Disse com uma voz fria.

-Eu gostaria de lembrar, ninguém mais do que eu gostaria de lembrar! Mas não dá! Nada aqui me é familiar, essas coisinhas aí no prato me dão nos nervos e eu odeio o cheiro disso e nem quero saber o que tem naquela tigela e não sei o que fazer sobre isso!! Gritou finalmente, o dia carregado de frases ofensivas e tudo que passou cobrou seu preço, ele estava esgotado, cansado e assustado e não precisava de comida ruim para completar tudo.

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