ISABELLA

31 | A VERDADE QUE ELES NÃO QUEREM QUE VOCÊ SAIBA

𝐴𝑋𝐿

Ao meu redor, era tudo aerófano. As paredes do corredor eram tão brancas ao ponto de permitir ver meu reflexo toda vez em que passava por elas. A cama, os lençóis, o banheiro eram mais brancos que as nuvens no céu - que observá-las tem sido meu único passatempo - incluindo todos os funcionários, que vestiam um uniforme branco. Até mesmo meu terapeuta, mais conhecido como o inferno em forma de gente que eu era obrigado a consultá-lo até três vezes por semana, usava um jaleco branco aberto até a metade, deixando aparecer sua gravata que mudava a estampa toda vez que eu o via.

Depois da minha overdose, o médico sugeriu que eu me internasse em uma clínica de reabilitação. No começo, eu neguei de todas as formas, eu não sou homem de passar minha vida dentro de um quarto sendo analisado por desconhecidos, pensei comigo mesmo. Mas então, a imagem de Erin dominou todos os pensamentos pessimistas, obrigando-me a dar uma oportunidade para essa nova experiência. Que certamente nunca se repetirá, não até eu estar no comando das minhas próprias decisões.

Mas tudo na vida tem um ponto final - é o que eu acredito, pelo menos -, o meu tempo aqui já havia se esgotado. Até na mesa já não havia espaço sobrando para que eu pudesse contar os dias que passavam.

Grande parte desta minha decisão, com certeza foi influenciada pelas papinhas servidas aqui que eles chamam de comida e pelos remédios que eu sequer sei pronunciar o nome. Argh! Consigo sentir um gosto ácido subindo pela minha garganta só de imaginar passar mais um dia enjaulado nessa merda.

Sem muitas opções, me vi mais uma vez desamparado pelas ruas de Los Angeles, procurando por uma alma benevolente que pudesse me fazer companhia ou apenas uma carteira de cigarros para relaxar minha mente transtornada, perdida em meio a tantas concepções. E na minha total sinceridade, a segunda opção me parece mais agradável. Uma carteira cigarros ganha pontos por não respirar e nem falar, a última coisa que eu desejaria agora é ouvir a voz de alguém. 

Senti olhares alheios passarem por mim, mas eu estava muito ocupado deixando-me guiar por meus olhos alienados que fitavam cada particularidade de todo e qualquer bar ou clube em que eu passava. Eu sabia o que estava buscando, mas minha obsessão não era suficiente para eu admitir em voz alta.

Existe um ditado famoso em que diz "quem procura acha", e hoje, eu pude comprová-lo. Lá estava eu, com os olhos vidrados em um pôster do Guns N' Roses, anunciando os shows que estavam por vir durante o resto da semana.

Era inegável que eu estava puto, mas nada no mundo poderia verbalizar minha frustração. Compor era meu porto seguro. Sentir a sensação de todos admirarem a sua arte, a emoção toda vez em que eu subia em um palco, ouvir a plateia cantando contigo e o melhor sensação do mundo, quando o show acabava e todos se olhavam com ternura, recordando de seu sonho de criança se tornando realidade.

Me encostei na parede abrindo um sorriso fraco, por mais dolorido que seja, eu não posso deixar de lembrar o quanto tudo aquilo era incrível. Infelizmente aquela sensação não durou muito tempo,  esmaguei em minha mão o pôster a fechando com força, perfurando o papel com as minhas unhas tentando reduzir a dor no peito que fazia minha garganta secar.

Eles arrancaram isso de mim, sem nenhum pudor, aproveitaram o momento certo, o momento que eu estava debilitado, assim eu não teria como opor-me. Filhos da puta!

O resto da parede estava cercado de outros posters iguais aos que eu acabara de amassar e, sem pensar duas vezes, arranquei um por um deixando a parede completamente vazia. Admirava todos aqueles pedaços de papéis voando pelas ruas de Los Angeles, parando debaixo dos pés que passavam por lá. Eu não poderia os deixar fazer isso sem mim.