Samantha
Sinto o nó dos seus dedos percorrer o meu rosto , procuro ávidamente o seu toque, tento abrir os olhos mas fui tomada pela falta de energia. Eu sabia que era ele no entanto, sinto o cheiro, o toque, é sem dúvida ele.
Desfrutaria enquanto pudesse.- eu sabia que vinhas buscar-me- digo-lhe.
"- podem passar mil anos e ainda vou estar ligado a ti, vou cuidar de ti, pede o que quiseres, é teu, vou te proteger sempre, eu vou prometo."
Sinto de repente uma enorme pena seguida de uma vontade inútil de chorar, porque percebo que isto não é o presente, é uma memória resgatada pelo meu subconsciente, é uma fuga da miserável realidade. Dou por mim a desejar viver na inconsciência, onde posso revivelo uma e outra vez.
Não tenho essa sorte no entanto, um verdadeiro choque térmico têm-me consciente rapidamente.
A água gelada jogada no meu corpo debilitado são como facas afiadas a penetrarem a pele, a ausência de roupa faz o impacto do gelo mais agressivo e deixa leves queimaduras por onde passa.
As pessoas quando imaginam o inferno, vêem o fogo, labaredas enormes, eu não, sei que é gelo, sinto o quanto pode queimar.
Recupero o foco e olho o causador das queimaduras de hoje, drácula, foi o nome que lhe dei pelos dentes diferentes.- hora do banho doninha- diz sarcástico. Eu não respondo, nunca respondo, não vale a pena.
- hoje até pode ser que eu te esfregue.- passa a mão no meu peito nu, os mamilos estão rijos pelo frio infringido.
- ui que safada, mal te toquei e já estás assim.- olho-o com nojo.
Todos os dias é assim, vêem, insultam, exploram o meu corpo através de toques abusivos, e vão embora. Ouve um dia que o "sombra" foi mais longe, nesse dia temi que fosse para além do toque, mas não, ele tocou-se e obrigou-me a assistir até que o líquido se espalhase por minhas pernas. Repugnante, mas ainda assim um alívio por não me ter tocado.
A nudez para mim já não é um problema, as palavras sujas também já não afetam, agora só o terror da chegada do dia que abusem do meu corpo para além do toque me aterroriza.
-pena que hoje não temos tempo para brincar.- parece realmente aborrecido.
- fodase cheira mesmo mal aqui.- sombra aparece por detrás de drácula, dei-lhe esse nome porque ele é silencioso, nunca consigo perceber quando está chegando assim como agora.
- a senhora já chegou, quer vê-la. Temos que a levar lá acima, isto não é sítio para ela vir- é interrompido pela mesma.
- isto não é sítio nem para um cão- parece chateada, mas depressa solta um sorriso doente, - vá mas para uma cadela serve.- faz finalmente contacto visual comigo e todo o humor desaparece do rosto.
- mas que merda é esta seus imbecis?
Para que ela seja uma arma contra os Romero tem que estar viva seus anormais. DESAMARREM-NA- ordena enfurecida.Sérgio que estáva atrás dela caminha agora na minha direção com a sua habitual faca e com um movimento hostil corta as cordas que me prendem. Preparo-me para a familiar dor nos músculos causada pela posição duradoura.
- levanta!- ela exige.
Eu tento, juro que tento.
Irritar qualquer um deles é a última coisa que quero, mas não consigo, há dias que não tenho essa força, por vezes um deles arrasta o meu corpo até ao balde para não fazer uma sujeira pelas pernas abaixo, é como se o meu corpo estivesse a entrar em modo vegetativo.- eu não acredito nesta merda, não fazem nada direito, vocês queriam o quê?
Matá-la antes da hora?- a pergunta não me surpreende, não sou ingênua a esse ponto, ninguém faria tanto mal a alguém para depois soltar e deixar ir. E eu tenho que ser sincera, a morte seria bem vinda a esta altura.- Mónica, eu já te tinha dito, a cadela não come, e o que come passados minutos vomita, nós até a temos alimentado bem, mas já te disse, ela está doente já há semanas.- alimentado bem, pão, água, as vezes alguma massa e arroz daquele pré cozinhado com algum molho do que seria o acompanhamento.
Mônica, ainda não sabia o seu nome, e pelo olhar que ela fez acho que Sérgio não devia ter dito.- eu preciso desta cadela viva.
Façam alguma coisa, obriguem-na a comer, não sei.- dá indicação para que me levantem.Sinto as mãos de cada um nos meus braços, com um puxão erguem o meu corpo, sinto a minha pele machucada despegar da cadeira, a ardência causada pelas feridas nas minhas nadegas é quase insuportável. Solto um gemido sofrido.
- eu só trabalho com imbecis mesmo, para que a mantém presa a uma cadeira?
Mal se mete em pé seus anormais, nem fugir conseguiria.Pondero o que diz, e acabo por concordar mentalmente, mesmo que me abrissem as portas agora, eu não seria capaz de dar três passos sozinha. Aproxima-se de mim, os traços continuam a parecer-me familiares, penso com mais afinco mas a cabeça não quer colaborar, não faço ideia de onde a semelhança surgiu. Uma coisa é certa, ela assim como da última vez está forçosamente enfeitada, como se quisesse provar ao mundo que pode tudo, mas ao contrário da elegância natural de Apolo por exemplo que grita poder como uma segunda pele, ela, a linguagem, não sei é... antinatutal?
- há algumas semanas eu estava me lixando se batias as botas, acontece que agora que tive a confirmação que o teu principezinho anda a procura de uma donzela desaparecida e eu sei bem que és tu, as coisas mudam de figura.
Vais ser tu quem vai atraílo até mim.
ÉS a minha arma contra ele- sinto os pelos do meu corpo ganharem vida, ela fala de Apolo não tenho dúvida em relação a isso, mas como poderia eu prejudicalo?
E a ideia só me deixa mais e mais desconfortável. Eu só quero que tudo termine. Ele nem deve mais se lembrar de mim, por mais que magoe a ideia de não ser ninguém para ele, também me conforta ao mesmo tempo, eu já não sou uma pessoa completa para ninguém. As palavras envenenadas da mulher trazem-me para a realidade.- vais comer, vais comer tudo o que te derem cadela.
E aí de ti que penses sequer em vomitar, eu mando tapar a tua boca e boa sorte se o fizeres, não deve ser agradável morrer sufocada no próprio vômito.- a ameaça é nítida. Ela desvia o olhar para a cadeira que tem sido o meu trono durante dias. Sinto a interrogação no seu rosto, talvez pelas manchas de sangue seco, acabo por confirmar que sim quando se posiciona na lateral do meu corpo e vê as fridas nas minhas coxas.- há quanto tempo ela está aqui?- pergunta para ninguém em particular, é Sérgio que responde.
- faz amanhã dez semanas.
- dois meses e duas semanas. Eu não acredito.- parece realmente chocada, até eu estou, não tinha relamente noção do tempo até agora, olha para mim e começa a rir sem parar, se existia dúvida para mim de que era louca, morreu totalmente agora.
- terei eu assim tanta sorte?! Hahahaha
Ela parece outra de um momento para o outro, fica impaciente, inquieta, entusiasmada, com aquele olhar doente que tanto a marca.
- Quero os aposentos da donzela com algumas melhorias, .- começa a sair, antes de atravessar a porta virasse e fixa os olhos no meu corpo despido.
- A cadela é a minha galinha dos ovos de ouro, tem que ser.- o quê ???!!!
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Eu vou, prometo!
RomanceAlgumas horas de uma única noite foram o bastante para traçar um destino, ele prometeu, agora é lei. Doce, pacata e inocente, tudo o que o destino não a permite continuar a ser, por ela nem mesmo continuaria, podia acabar, doi, doi tanto, mas, ele...