" um anjo verdadeiro..."

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Apolo

O caminho do Club para casa é um burrão, entrei no modo automático, entro no escritório e vou direto ao whisky, derramo a bebida como se a falta dela fosse fatal, sinto dois pares de olhos fixos em mim, pego na bebida e nem me preocupo em colocar a tampa na garrafa, vai ficar vazia rápido.

Caminho para detrás da secretária, deixo o meu olhar atravessar a janela, a minha cabeça está preenchida com todos os possíveis cenários e em todos eles, ela é a protagonista. Estou raivoso, eu falhei, falhei com a família, porque acreditei, porque ela me fez acreditar.
Ao longo dos anos meu coração estava endurecido para esconder qualquer emoção, como se nunca tivesse existido uma em meu corpo. Eu já estava condicionado para as batalhas. Fui ensinado como disparar uma arma quando tinha cinco anos, treinei
como lutar e matar com minhas próprias mãos antes mesmo de entrar no ensino médio. Mas apesar de tudo isso, bastou um olhar nela. Eu beijei-a, porra. Eu não beijo. Eu uso e pago. Nada de afectuoso.
Eu estou muito chateado. Meu pulso está batendo em minhas têmporas. Eu queria destruir cada pedaço de merda do mobiliário em pequenos pedaços.
Balanço a cabeça, na tentativa de me obrigar a me acalmar.
O estranho silêncio não ajudava muito. Senti meus nervos atacando mais uma vez, aumentando as inúmeras
perguntas para quais eu sabia que ainda não obteria respostas.

- Alguém me vai explicar como é que esta noite vai acabar assim ? - a minha mãe foi a primeira, troca um olhar de mim para Alfonso.

- as coisas estavam realmente calmas mãe, quando saí nem parecia uma sexta-feira no clube, e-

- espera!
Isso é outra coisa, porque é que tu saíste? Quando eu digo que suspeito de alguma coisa, vocês acreditam, ponto, não ando a brincar aos detetives só por que é divertido, e agora ? Quantas baixas? - a pergunta vem direta para mim.

- três dos nossos homens, acho que todo o pessoal do staf, e alguns clientes que foram apanhados no meio da confusão.- digo, sinto a bile a subir na garganta, estas baixas são culpa minha.

- porra, mas quem?- Alfonso pergunta mais para ele do que para nós.

- primeiro temos que perceber o objectivo- sei que a cabeça da minha mãe já está a trabalhar a todo o vapor, mantém a sua postura impecável enquanto verbaliza as suas conclusões - roubo ocasional não foi, se não, não saiam a matar os nossos, o objectivo também não era matar-nos se não aqui em casa fazia mais sentido, se bem que com toda a segurança, mas ficava mais difícil, foi para provocar, só estão a agitar as águas- pensa.

- a agitar as águas? Não deviam agitar águas que pertencem a tubarões. - Alfonso levanta-se e caminha pelo espaço- Mas há mais que não faz sentido, o Roger quando ligou diz que alguém que vocês interrogaram disse que era "para ela", ela quem?

Fechando os olhos, inclino para trás e tomo minha segunda dose de whisky. As palavras de Alfonso afundam em mim, deixo sair um sorriso que se transforma em algo sem emoção, pego no copo agora vazio e o jogo contra a parede, os dois me olham como se tivesse enlouquecido, talvez tenha, nunca antes perdi o controle.

- Eu sou o culpado, fui eu quem se deixou levar pelo inimigo- pego na garrafa, copo não é mais necessário, fito a minha mãe.

- sabe mãe , em algum momento da noite acreditei que podia ser verdade, que a história da tal existir, eu pensei que a tinha encontrado. -Baixo o olhar para igualar ao tom de voz, admitir em voz alta só faz a revolta ser mais tempestiva.

- epa o whisky está a ter caminho direto para a tua cabeça brother, não estás a fazer sentido.- Ignoro o meu irmão.

- Quando a vi, porra se não era a visão de um anjo verdadeiro, agora não estou mais certo disso.- não tenho mais porquê esconder, eu falhei agora tenho que resolver.

- Apolo, meu filho, normalmente opto por não dar grande importância as baboseiras do teu irmão, mas tenho que concordar, não estas a fazer sentido, quando a viste? Quem ? Quando?- olha-me com expectativa. Solto o ar preso nos pulmões.

- Vi ela entrar no clube, enquanto jantavamos, toda a porra da minha concentração foi directa para ela, segui cada movimento dela, ela comeu, ela bebeu, ela sorriu, eu vi cada porra de segundo dela lá dentro, e eu não vi um pingo da maldade, só inocência, tão doce. -não aguardo resposta, isto não é um diálogo de dois lados, é como se estivesse a viver dentro da minha memória, pego o lugar em frente há mesa e recostome na cadeira, derrotado.

- eu não podia ficar longe, dei um jeito de afastar Alfonso, e na primeira oportonidade eu estava ao redor dela, apartir daí foi só cavar mais e mais o buraco onde estou metido, ela tinha-me na palma da mão e eu não sei como!- deixo o olhar perdido sobre a mesa, mas um pequeno movimento da minha mãe chama a minha atenção, tem o olhar perplexo, olha para mim como se lhe tivesse dito que tinha arranjado um jeito de acabar com a fome no mundo.

- estas a sofrer meu querido- diz como se nem mesmo ela acreditasse - eu acho que nunca te vi falar assim, essa menina tem que ser a tal, o quê que deu errado?

- errado mãe?
Nada!!
Bateu tudo demasiado certo, por isso eu devia ter desconfiado, ela veio comigo, confiou demasiado fácil, deixou que a tocasse, que a sentisse, que me viciasse, TUDO DEMASIADO FÁCIL- passo as mãos no cabelo um gesto nervoso e descontrolado como o meu tom de voz alto e desnivelado.

- porra mas será que é a mim que o whisky está a bater?!!
o que descreves só me parece bom, aliás é bom saber que o meu irmão mais velho afinal também gosta de um bom rabo de saia- silênciou logo que lhe meto os olhos em cima, levanta as mãos em sinal de rendição e retoma o seu lugar na cadeira- ok ok , no que que a moça tem culpa afinal ?

- Levei-a para a sala segura, ignorei por completo as indicações que tinha, estava distraído, quando a merda explodiu, estavamos lá dentro.- cerro as mãos em punhos diante a memória- elouqueci quando pensei que alguma coisa lhe podia acontecer, antes de sair de lá eu pedi que não saisse dali, que me esperasse. - Quanto mais tempo eu fico aqui, sem ela, mais dói; sinto-me como se eu estivesse morrendo.
O que diabos eu fiz?

- Ela não estava lá meu filho?

- Não mãe, ela não estava lá- falo com amargura.

-E todos aqui sabemos que naquela sala ninguém a conseguia ir buscar, só as nossas digitais abrem o lugar, ou o código de emergência que também só nós sabemos, logo ela saiu, fez o que tinha a fazer e saiu.- recordo a minha busca patética para a encontrar, na esperança de ter saído para encontrar a ruiva, nada, nem ela nem a ruiva foram vistas, tenho a minha equipa atras das duas naturalmente e nada ate então.

- merda,- percebo que Alfonso não está mais na cadeira á minha frente, anda ao redor da sala, inquieto.

- eu entrei lá, quando saí com a garota do bar- para no meio da fala e procura o meu olhar,- eu usei o código, a maldita diz que tinha frio, que não podia sair sem um agasalho, mas tinha perdido o dela e,... merda merda merda, a gaja enganou-me.

- mas vocês perderam o juízo?
Desde quando se deixam enganar assim? Apolo ainda entendo, ainda tenho as minhas dúvidas de que a menina tenha alguma culpa, devias confiar mais no teu primeiro instinto não é à toa que te tenho há frente dos negócios da família.-as palavras da minha mãe plantam a dúvida.- agora tu Alfonso, essa história cheira a caso logo de cara.

- porra, sei lá as meninas são todas cheias de frescura hoje em dia, mas faz sentido agora, ela nem deixou que a beijasse, foi-se, já nem quis o agasalho, merda, porra.

A pequena onda de alívio corre através de mim com o possibilidade de não ser a minha pequena a culpada. Mas outro pensamento corre mais urgente, se não foi assim então onde estás tu meu anjo?
Uma coisa eu posso ter a certeza.
Não paro até encontrar Samantha. Eu não me importo se eu tivesse que procurar em todo o mundo, se eu tivesse que remover cada pedra, se eu tivesse que arrancar informações de cada pessoa do caralho na terra. Eu vou encontrar-te, resta saber se para cumprir com a minha palavra ou para vingar a família.

Eu vou, prometo!Onde histórias criam vida. Descubra agora