Tristefeliz

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     Era quinta-feira. Todo mundo na sala tava meio ansioso porque naquele dia a gente teria aula do professor Marcelo, a última. Aninha não acreditava que ele fosse aparecer. Segundo ela, Marcelo não deu aula pras outras turmas nos outros dias da semana. Aninha sabia de tudo o que acontecia na escola. Não era à toa que foi chamada pelo professor Ernesto pra escrever no jornal da Gaspar Miranda. Se, por acaso, você quisesse saber algo sobre alguém da escola, você deveria buscar informação com a Ana, a maior fofoqueira que já conheci.

     — Não é fofoca, Bruno. É apuração jornalística!

     — Ele foi demitido? — Sussurrei.

     — O Marcelo?! — Aninha revirou os olhos — Óbvio! Você acha que a diretora Sílvia deixaria ele continuar dando aula aqui?

     — Ué. A Sílvia gostava bastante dele — Rô deitou a cabeça sobre os braços apoiados na carteira. A próxima aula seria de português. Ele já se preparava pra dormir.

     — Duvido que ela colocaria em risco a imagem da escola só por causa da amizade com ele. Vocês sabem como essa escola é. Eles fazem de tudo pra não perder aluno. Ter um professor como o Marcelo trabalhando aqui é pedir pra ir à falência!

     Aninha falou aquilo alto demais. A sala toda ouviu. Inclusive o Pedro. Certeza que ele ouviu.

     — Porra, Ana.

     — Que foi, Bruno? — Ela aumentou ainda mais o tom de voz — Não é verdade? Todo mundo sabe que o professor Marcelo é um predador.

     Vi o Pedro se remexer na cadeira. Vai dar merda, pensei. Dito e feito. O Pedro se virou pra trás, encarando a Ana.

     — O Marcelo não é nenhum predador. Mas você é muito linguaruda — O Pedro tava puto.

     Ana abriu a boca pra rebater, mas recuou. Provavelmente não queria discutir com o Pedro, que visivelmente tava mal.

     — Quer dizer, então, que o seu marido é o professor Marcelo, Pedro?! — Alguém zombou no fundão — Olha aí. A mulher defendendo o seu macho.

     Era o Jean.

     — Você quer apanhar de novo, Jean? — Eu disse — Fala aí pra todo mundo sobre o soco que o Pedro te deu no estômago. Doeu muito?

     Jean tentou dizer algo, mas as vaias da turma abafaram sua voz. A gritaria só terminou quando o professor Ernesto entrou na sala. A cara fechada. A voz monótona pedindo pra gente colocar em cima das carteiras os cadernos com as atividades de casa respondidas.

     No intervalo, eu não encontrava o Pedro em lugar nenhum. Foi quando tive a ideia de procurá-lo no lugar mais remoto da escola. A biblioteca desativada. A porta tava fechada, mas tinha espaço suficiente na janela pra alguém atravessar.

     — Como cê sabia que eu tava aqui? — Pedro tava sentado entre as estantes de livros.

     — Moleza. Pensei no lugar mais clichê pra um cara nerd se esconder — Me sentei ao seu lado.

     — Sou tão previsível assim? — Pedro tirou os fones do ouvido.

     — Às vezes sim. Às vezes não.

     — Me sinto mais ou menos elogiado.

     — Você acha ruim ser previsível?

     — Não deveria achar?

Tá tudo bem, PedroOnde histórias criam vida. Descubra agora