Capítulo I - Ataque à Vila

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     Na'ar era uma vila modesta perto de Aqbah, a poucas horas desta e dois dias a oeste das dunas, fora da maioria das rotas entre as cidades do império de Quarth. As casas em sua maioria tinham grandes janelas, e devido à boa distância entre elas a brisa deslizava agradável aliviando o calor tão comum dos dias ensolarados. Mercadores vinham quase toda quinzena, pois seus temperos, tapetes, roupas e cortinas eram bem vindos, fosse pelos bons preços, fosse pela variedade de cores, em especial as peças claras. Pelas espaçosas ruas passavam também viajantes em seus camelos trazendo notícias de partes longínquas do império, por vezes não tão acolhedoras.

A única taverna começava a receber clientes, um caçador ávido por uma caneca de cerveja, alguns jovens incautos mais uma vez tentando a sorte apostando as poucas moedas que lhe sobravam, homens conversavam ao redor duma mesa regados a chá de hortelã e de anis, depois de mais um dia de trabalho exaustivo nas minas. Os dois viajantes, no canto direito do salão, ganhavam cada vez mais atenção com a história contada, um falava com o entusiasmo de um trovador e o outro ritmava com os acordes do seu bandolim.

Somente duas mulheres no salão, uma servindo clientes solitários no balcão, e a outra no canto esquerdo, ao redor duma mesa com dois rapazes que a ouviam animados contar mais uma história dos Cinco Sentinelas, ignorando os trovadores. A mulher na casa dos trinta tinha um rosto magro e olhos castanhos, contava empolgada sua história fitando ora um ora o outro rapaz, a luz do sol vespertino dourava seus cabelos, louros como flor de cambuí, pousados sobre o ombro direito descendo pela túnica cor de salmão.

Enquanto contava-lhes a história, as lembranças pulsavam ainda mais vivas, como se vividas poucas horas atrás. Aquele era um dia tranqüilo como este, havia algumas pessoas diferentes, mas a taverna era a mesma, e até a mesa à sua frente era a mesma. Era como naquele dia...

A taverna tinha poucas cadeiras preenchidas e Seleva sentia a cada gole a macia espuma da cerveja quando um arrepio percorreu todo seu corpo encerrando sua alegria. Ela sabia no mesmo instante, que era mais que um simples arrepio, era uma presença. Lá fora um vento sinistro soprou bruscamente, asas cinzentas bateram no céu trazendo pânico às ruas. Pessoas correram em busca de abrigo, alguns caindo por cima uns dos outros, cavalos relincharam assustados. Um vulto escuro passou novamente pelos céus, e com ele um urro que parecia saído das profundezas do Abismo.

Seleva saiu da taverna pisando fundo e lá fora viu a criatura descendo num rasante rumo à vila. As asas eram de couro, semelhante a dos morcegos, beirando os vinte metros, suas quatro patas terminavam em garras, grandes como adagas, que podiam dilacerar qualquer homem adulto. Escamas cinzentas como fumaça revestiam seu tronco e todo o corpo. A longa cauda serpenteava no céu durante o vôo enquanto o pescoço comprido sustentava sua cabeça reptiliana. Seu focinho era robusto e uma linha de espinhos ia da cauda até a cabeça, onde havia dois pares de chifres, um com as pontas curvadas para baixo e outro, curvado pra cima. Um brilho âmbar se via nos seus olhos de íris fendidas.

Ainda perto da taverna Seleva apontou sua mão na direção do dragão cuja boca se abria expondo os dentes pontiagudos. Gritos de terror encheram as ruas da vila quando a fera expeliu de sua bocarra o vapor cinzento, denso e úmido como o mais mortal dos venenos. Mas algo impediu que caísse sobre as pessoas, desviando-o até dissipar no ar. A criatura cruzou os céus da vila, e enquanto se afastava fez uma manobra de curva disposta a uma nova investida. O dragão soube, no momento em que algo detivera seu sopro mortífero, que tinha encontrado o que procurava.

O som de galopes se fez ouvir quando cinco indivíduos passaram em direção ao dragão, montados em quatro pôneis e um cavalo, iam no sentido contrário às pessoas, como se nadassem contra a maré de caos e pânico. Todos com armas e armadura, exceto Nívea cujos cabelos castanhos esvoaçavam, sua pele alva contrastava com as vestes escuras como a capa sobre ombros e era a única à cavalo. Ao seu lado, vinha Penína, com uma armadura semelhante a couro, mas feita de escamas rubras próprias pro seu tamanho, tão grande quanto uma criança humana. Do outro lado de Nívea vinha Makut, pouco mais alto que Penína, de corpo atlético, feições másculas e corte militar. Nas pontas vinham Tar-Rúl e Thorud, o primeiro, um anão calvo cujas placas da loriga deixava poucas partes expostas, suas duas espadas pendiam nas laterais do corpo e seu arco apoiado por cima do ombro, já o segundo, era um anão mais corpulento, de barba e cabelo castanhos, segurava a correia do cavalo com uma mão e com a destra brandia seu machado.

Guerras Draconicas - Canção da AreiaOnde histórias criam vida. Descubra agora