Inicia-se o último ano em Redmond

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- Novamente, aqui estamos nós, bronzeadas de sol pela vida ao ar livre e com o vigor de uma atleta pronto para correr uma maratona! - exclamou Phil, sentando-se sobre uma maleta com um suspiro de satisfação. - Não é ótimo voltar a ver nossa velha e amada Casa da Patty... e a titia... e os gatos? Rusty perdeu outro pedaço da orelha, não é mesmo?

- Ainda que não tivesse orelha nenhuma, ele seria o melhor gato do mundo - declarou a leal Anne, sentada sobre a tampa de seu baú, enquanto Rusty se acomodava em seu colo numa agitada recepção de boas-vindas.

- A senhora não está contente de nos ter de volta, titia? - perguntou Phil, curiosa.

- Estou sim, mas quero que vocês arrumem suas coisas logo - resmungou tia Jamesina, enquanto olhava aquela infinidade de baús e maletas ao redor das quatro moças risonhas e tagarelas. - Conversem mais tarde - ordenou ela. - Primeiro a obrigação e depois a diversão, este era o meu lema na juventude.

- Ah, titia, nossa geração mudou esse lema! Nosso lema é: primeiro divirta-se bastante e depois trabalhe feito um desgraçado. Daremos conta muito melhor das nossas tarefas depois de uns bons momentos de brincadeira.

- Se a senhorita pretende se casar com um pastor, é melhor que pare de usar expressões como "feito um desgraçado" - advertiu tia Jamesina, pegando Joseph e seu tricô, e conformando-se diante do inevitável com a graça encantadora que a fazia ser a rainha das cuidadoras.

- Por quê? Ora essa! Por que esperam que a esposa do pastor só fale um vocabulário intencionalmente formal e puritano? Eu não farei assim. Inclusive, todos na Rua Patterson, onde vou morar, usam um linguajar popular... Quero dizer, linguagem metafórica... E se eu falar muito diferente deles, vão me considerar insuportavelmente orgulhosa e pedante.

- Já comunicou as novidades à sua família? - perguntou Priscilla, que estava alimentando a Gata-Sarah com o que restava em sua cesta.

Phil assentiu.

- E como eles receberam a notícia?

- Mamãe, como eu já esperava, fez o maior estardalhaço! Mas eu me mantive firme como uma rocha, justo eu, Philippa Gordon, que nunca antes havia sido capaz de me decidir por nada! Mas meu pai, não. Ele ficou mais calmo. O pai dele também era pastor, e por isso ele tem no coração um lugar especial reservado aos clérigos. Depois que minha mãe ficou mais calma, levei Jo para Mount Holly e os dois o adoraram. Minha mãe, porém, fez uma série de insinuações terríveis em todas as conversas, sobre os planos que ela tinha para a minha vida. Ah, minhas férias não foram, digamos, um mar de rosas, queridas, mas eu triunfei e conquistei Jo! E nada mais importa.

- Para você - retrucou tia Jamesina, obscuramente.

- Nem para o Jo - retorquiu Phil. - A senhora continua se compadecendo dele. Ora, por quê? Acho que é muito sortudo por se casar comigo. Em mim, ele conseguiu três grandes qualidades numa só mulher: inteligente, linda e com o coração de ouro!

- O bom é que ao menos nós compreendemos seus discursos , Phil - disse tia Jamesina, pacientemente. - Espero que não fale assim na frente de estranhos. O que pensariam de você?

- Ah, eu não me importo nem um pouco com o que pensariam! Não quero me ver como os outros veem. Tenho certeza de que seria terrivelmente desconfortável na maioria das vezes. Tampouco acredito que Burns tenha sido sincero naquela oração.

- Ouso dizer que, se tivéssemos coragem o bastante de olhar para dentro de nosso coração, não pediríamos por coisas que não desejamos de verdade - reconheceu tia Jamesina, candidamente. - Acredito que esse tipo de oração não passe nem do teto de casa, quanto mais que chegue aos céus. Eu costumava pedir a Deus para que eu fosse capaz de perdoar uma certa pessoa, mas agora compreendo que eu não queria perdoá-la de verdade. Quando finalmente quis, eu a perdoei sem ter que orar pedindo por isso.

Anne da IlhaOnde histórias criam vida. Descubra agora