Leo rondava o antigo escritório de seu pai. Lugarzinho bagunçado era aquele, e nesse momento servia apenas como depósito. Um grande depósito. Dillas tinha pedido o cômodo depois de ter cansado do espaço de seu quarto. Depois que Sua Majestade Anarshah morreu Dillas abandonou o dormitório, e o ambiente caiu esquecimento.
Geralmente são os filhos mais novos os mais mimados e agradados. Mas não naquele castelo, não naquela família real.
Leo nem ao menos era visto como um nobre, muito menos como o adulado da familia. Ele era o bastardo, a desonra do rei, o garoto indesejado. Bom, pelo menos pelo povo. Logo no início, Rei Morshon reconheceu Leo como o seu filho legitimo, mas rainha Anarshah não aceitou o menino como alguém “da família”. E não era só por causa da traição, na verdade é comum o rei ter filhos fora de seu matrimônio. Mas a mulher que ele escolheu… a desgraçada da outra amante, que fisgou o coração do rei por completo... era demais. Ele preferiu a ela, a maldita bruxa!
Em outras palavras: madame Nora.
Leo era feliz quando sua mãe ainda podia caminhar livremente pelos corredores do palácio, com sua doce personalidade. Totalmente oposta de Anarshah. Nora era a única que não olhava para Leo com desapreço, além de seu pai, é claro.
Sua mãe o protegia da repulsão que as pessoas costumavam demonstrar com relação a ele.
Com ela, tudo era mais fácil.
Ainda se lembrava da noite em que a mulher caiu para cima de Manetta Scol, após este, chamar o menino de “Imundície indesejada”. Os olhos verdes de Nora se tornaram selvagens de raiva. Como os de um camelo perturbado. Seu pai teve que puni-la pelo comportamento agressivo com um de seus mais importantes Condes. Madame Nora foi com um largo sorriso no rosto para seu quarto de isolamento.
Seu modo de se recompor era admirável, passava de uma fera espumante para um cordeiro indefeso em um milésimo de segundo. Sendo bom ou ruim, ela era muito boa na arte do cinismo.
Mas aquele dia foi apenas um produto caro na bagagem acumulada da má conduta de Madame Nora. Os rumores de seu temperamento hostil se tornaram uma ameaça a própria índole dos Morshons. Boatos cortantes ridicularizavam a família de Tharnos diretamente. Nora era oficialmente o fardo promiscuo do rei.
E em uma certa manhã, a última gota d'agua fez o copo do império transbordar.
Nove anos. Essa era a exata idade de Leo quando os protestos de sua mãe invadiram as colunas amplas do castelo. O menino não conseguiu sair de seu quarto naquele dia. O tinham trancado. Só conseguiu ouvi-la. Ela ria psicótica, como fazia em sua incredulidade. Ouviu gritarem com ela. E ouviu uma frase distinta, dessa vez próxima e clara. Era a vós de sua mãe, que cantava suavemente em sua mente. Gilem. A canção da Natureza.
Essa foi a ultima vez que escutou sua vóz.
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Do Outro Lado Desse Reino
FantasiPara um mundo funcionar em harmonia precisa existir paz e amor ao próximo, certo? Mas e se fosse o amor a porta aberta para a destruição? Uma jovem "bruxa" será obrigada a enfrentar uns novos forasteiros que ameaçam os portadores de magia. A popula...